Capítulo 22

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Ana não tinha dormido ou acordado na mesma cama que eu nenhum dia dessa semana e o corpo pequeno fazia muita falta para minhas boas noites de sono.

Ela também não apareceu no barzinho e eu sabia que faltava apenas um dia para a cirurgia sobre a qual ela falava animada pelo celular. Ana estava eufórica, estava fora do estado de dormência dela e eu gostava muito das poucas vezes que consegui ver aquele sorriso nos lábios dela.

No meio da semana eu tinha saído com Manuela e ela tinha dito algo sobre sábado ser um dia importante pra Ana, pensei que fosse a cirurgia o motivo e falei, mas Manuela riu e negou.

"Tua morena faz aniversário no sábado, Vitória!"  Ela soltou alto e eu sorri. "Você já devia conhecer o lado paranóico da Ana de marcar uma cirurgia no aniversário dela pra se dar um presente."

Ela riu e minha cabeça logo estava cheia de pensamentos sobre uma festa surpresa pra Ninha. Eu sempre fui fã de festas e sempre fui boa em organiza-las.

"O que tu tá pensando aí?" Manuela perguntou desconfiada.

Ela tomou pouco do café que eu tinha comprado no caminho até o hospital enquanto eu já tinha consumido todo meu copo.

"A gente tem que fazer uma festa pra Naclara!"

"Eu tenho certeza que ela vai gostar mais de ter uma festa particular com você"  Ela disse tão sugestiva que foi inevitável revirar os olhos, sentindo meu rosto queimar.

"Mulher, tu é horrível!"  Dei um tapa no braço dela, que fingiu dor e fez uma careta. "Me ajuda a fazer uma surpresa pra Ana, tu me deve isso desde que consegui fazer meu irmão sair de casa no dia que vocês ficaram"

Manu riu alto e tomou o resto do líquido preto antes de me responder:

"Vale lembrar que você não sabia que a gente ia ficar naquele dia."

Discutimos sobre isso até ela ser chamada pra uma consulta e me deixar na porta do hospital. Segui pro quarto da Aninha e fiz com que mamãe fosse pra casa descansar. O novo médico chegava na segunda e eu já tinha pesquisado tudo sobre ele, e inevitavelmente sobre o filho dele. Eles não se pareciam em nada, mas tomara que ele tenha herdado a inteligência do pai, já que vai ajudá-lo no caso da minha irmãzinha.

Aninha estava escrevendo num caderno rosa impaciente, parecia até com raiva.

"Que careta é essa, minha flor?"

Perguntei me aproximando dela.

"Eu tô atrasada nas matérias na escola, Vivi, então pelo menos eu vou escrevendo pra não me esquecer das palavras." Pela voz no tom explicativo eu pude sorrir aliviada.

Era tudo o que eu sentia ultimamente, alívio. Apesar de sentir falta de Ana Clara, sabia que ela estava feliz cuidando do caso dela e feliz porque ela tinha conseguido salvar Aninha, de certa forma.

E meu corpo sentia falta dela, do peso do corpo dela contra o meu, das conversas de manhã e de dormir afogada nela.

Saí do hospital direto pra algumas lojinhas para comprar enfeites, lembrando a cor que Ana gosta tanto, e outras coisas relacionadas com o mundo dentro dela. Depois comprei vinho, cerveja e mais bebida, além de uns doces e comida. Estava ansiosa. Queria comemorar com ela e com as pessoas à nossa volta, assim como queria comemorar apenas com ela.

"Você comprou tudo hoje?" Bárbara perguntou assustada.

"Sim, porque não vou ter tempo amanhã."  Respondi no mesmo tom sussurrado. "Tu vai ne? Ninha te ama demais pra tu num ir." Insisti.

"Claro que eu vou! Eu tô muito feliz que Ana Clara te encontrou perdida por aí"

Sorri com as palavras dela e fiquei sem graça. Ana tinha me encontrado também, do mesmo jeito que encontrei ela. Ela tinha trago alegria e ultrapassou todos os limites que eu conhecia sobre gostar de alguém.

"Tu chama Luana pra ir, e aqui nesse papel tá meu endereço."  Ela assentiu e agradeci, tomando meu caminho de volta pro quarto de Aninha.

A saudade de Ana apertou. Eu já tinha estado no hospital duas vezes hoje, e a saudade dela apertava só de entrar ali. Queria me controlar e entender que ali não era o local ideal para matar qualquer tipo de saudade, mas não podia me privar tanto assim. Mandei mensagem para Manuela e esperei ela responder, o que ela fez, me dizendo onde Ana devia estar.

Eu não tinha percebido o quão grande aquele hospital era até precisar andar dentro dele atrás de um quarto para os médicos, que eu não sabia bem onde era. Andei por vários corredores no segundo andar até me encontrar com a própria Manuela e ela me explicar que Ana Clara só dormia no quarto perto da sala de exames e que esse ficava no terceiro andar.

Abri a porta de madeira tão devagar que me senti num filme de suspense, mas meu coração nem sequer acelerava nesses filmes como acelerou ao ver Ana Clara dormindo tão tranquilament toda vestida de branco, com o cabelo curto cobrindo o lado do rosto que ela não apoiava no braço.

Tentei ser o mais cautelosa possível ao me deitar ao lado dela, depois de descobrir que aquela porta podia ser trancada. Ela respirava calmamente, o rosto parecia tão cansado. Passei meu braço pela cintura dela e diminuí nossa distância, sentindo o perfume doce invadir meu nariz e sorri.

Se era errado a acordar, então ela precisaria me desculpar mais tarde. Porque logo meus lábios e contraram a pele macia da nuca morena e dei vários beijinhos ali, enquanto tirava o cabelo do rosto dela. Ana murmurou alguma coisa que não entendi, se encolhendo para trás e coloando mais nossos corpos. Todos os meus pelos ficaram eriçados, a sensação de toda a energia correndo nas minhas veias estava ali de novo. Sorri e beijei a curva do pescoço dela.

"Vi..."  Ela sussurrou audível dessa vez.

"Oi meu amô"  Respondi alegre.

Ana se virou abruptamente de frente pra mim, os olhinhos arregalados e um sorriso surpreso apareceu junto deles.

"O que...Como você...Vitória?" Ela parecia tão confusa, talvez tinha pensado que era um sonho.

Sorri pra ela e lhe roubei um selinho rápido.

"Eu precisava te ver, não tava me aguentando de saudade." Respondi ainda com o sorriso no rosto. "Mas logo tenho que ir embora, então, se eu fosse você, eu me beijava logo"

A boca de Vitória se chocou contra a minha, o gosto de café se fez presente. Era um beijo faminto, profundo e ardente. As mãos geladas em minha nuca arranhavam bem ali, me fazendo ter que testar todo meu auto controle. Ela colocou uma perna do lado da minha cintura, puxando minha cintura para ela.

Chupei o lábio inferior e o mordi antes de dar vários selinhos nela, o último maid demorado.

''Ninha, aqui não." Sussurrei quase sem voz, tendo dificuldade em me soltar daquele abraço quente e me levantar.

"Você só me tortura, Vitória."

Ela respondeu com a voz manhosa e meu coração se aqueceu.

"Preciso ir trabalhar. Amo tu."

Aquelas palavras saíram tão despercebidas que senti meu rosto corar quando as disse. Meu estômago revirou, não tive coragem de esperar o que Ana ia dizer, mas acho que não disse nada e meu coração doeu no instante em que fechei a porta.

CHAOSOnde histórias criam vida. Descubra agora