Capítulo 31

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Quando Vitória abriu os olhos lentamente, eu a observava com um sorriso enorme. Consegui acordar a tempo de fechar as cortinas e cobrir um pouco da intensidade do sol na parede de vidro. Ela amarrado o cabelo antes de dormir, os olhos estavam um pouco inchados pelo tempo em que tínhamos ficado ali. E ela era tão linda quanto à manhã de sol que tinha lá fora.

Vitória tinha me ensinado a gostar do mundo e por isso eu amava ela.

"Bom dia, amor" Eu disse acariciando o rosto macio entre minhas mãos. Vitória sorriu aquele sorriso de congelar o tempo e lhe dei um selinho rápido.

"Bom dia, meu amô" Ela disse de volta. "Me diz que você dormiu dessa vez, Naclara" Ela falou de repente, me fazendo rir.

"Um pouco depois de você, flôzinha" Respondi com a voz infantil que habitava em mim sem eu nem mesmo saber. Pelo menos ela riu de volta, aquecendo meu coração.

"Que bom. Preciso de um banho." Ela me deu um selinho antes de se levantar da cama e sair rebolando completamente nua pelo apartamento. Meu corpo respondeu àquela visão, e logo estávamos as duas debaixo da água morna. Vitória explorava minha boca com a língua ágil, me fazendo morder o lábio inferior dela como resposta.

Minhas mãos percorriam seu corpo e eu podia sentir sua pele se arrepiando ao meu toque, encostei ela no box dando beijos em seu pescoço a fazendo gemer baixo.

"Ana?" Vitória chamou me fazendo subir aos seus lábios novamente. "Ana? Acho que seu celular tá tocando já tem um tempo."

"Deixa tocar."

"Pode ser algo sobre Aninha." As palavras me atingiram em cheio. Dei um beijo em Vitória, me enrolei em uma toalha e corri até o celular, era o novo médico de Aninha que já estava no hospital me esperando.

Fui até o banheiro onde Vitória ainda me esperava.

"Desculpa, o médico da Aninha chegou, precisamos ir." Ela apenas assentiu e sorriu esperançosa, o que me deixou mais apreensiva.

Chegamos ao hospital juntas e acompanhei Vi ate o quarto de Aninha, ela entrou sorrindo e cumprimentamos a todos. Padrasto da Vitória estava ali e olhou sugestivo para nós duas chegando juntas, a minha vontade era revirar os olhos mas me limitei a fazer uma expressão séria.

"Bom dia, Aninha, tenho boas notícias, o médico que vai cuidar de você chegou e já deve estar vindo te ver." Eu mal tinha acabado de falar e vi que dois médicos entraram no quarto.

"Bom dia." Eles falaram em uníssono.

"Bom dia." A família respondeu animada e eu tive a impressão de ver os olhos do mais novo recair sobre Vitória, pior ainda, tive a impressão de que o padrasto dela também teve porque me olhou novamente com a cara sugestiva.

"Bom dia, Dr. William." Falei apertando sua mão.

"Bom dia, Dra. Ana Clara." Ele respondeu me direcionando ao rapaz que estava ao seu lado. "Esse é meu filho, Dr. Jaffar, ele está no estudo clínico junto comigo."

O menino moreno alto sorriu e estendeu a mão para me cumprimentar, o que eu fiz segurando firme e encarando os olhos castanhos que antes encaravam Vitória.

"Quando vão realizar os primeiros exames?" Perguntei séria. Minha vontade era entrelaçar meus dedos aos de Vitória para que o rapaz deixasse de olhar pra ela a cada segundo.

William, que realmente não parecia ter a idade que tinha, começou a falar sobre o procedimento e quais exames queria fazer antes de começar. A voz dele era firme e ele sabia do que estava falando, mesmo estando aliviada de conseguir um bom médico para Ana Beatriz, a presença do rapaz mais novo no quarto tinha me deixado desconfortável.

"Eu gostaria de falar com a família sobre os riscos, aceita nos acompanhar?" O homem mais velho falou mais um vez. Assenti de imediato. Ainda queria acompanhar de perto Aninha e me manter informada de todo o tratamento. Também queria conhecer mais do médico à minha frente e do menino que tinha os olhos em Vitória outra vez.

Sorri para Aninha e acariciei a mãozinha fria sobre a cama antes de acompanhar a padrasto de Vitória, dona Isabel e os dois médicos para fora do quarto, Vi veio ficar do meu lado, sorrindo levemente na minha direção.

"Por que você não acompanha Jaffar até a lanchonete, Vitória? Depois sua mãe passa pra você o que William falar." A voz do padrasto de Vitória estava para entrar na minha lista de sons mais entediantes e irritantes que eu já tinha ouvido.

Ouvi Vitória respirar fundo antes de falar:

"Por que você não vai, Ricardo? Depois minha mãe passa pra você o que o doutor disser." Ela respondeu com a voz carregada de cinismo, e eu precisei me esforçar para não rir da carranca que ele fez. Desviei meus olhos dele para o garoto moreno e ele parecia desconcertado. 

Os trinta minutos que se seguiram foram preenchidos pela voz do oncologista e do filho dele. Jaffar tinha certa leveza na voz que me irritou, na verdade, o que me irritou foi sentir que ele era uma pessoa leve e que Vitória também tinha achado isso apenas pelo olhar que lançava de mim para ele. Eu nem consegui acreditar que já estava com ciumes do residente, que devia ser bons anos mais novo que eu. Suspirei pesadamente quando eles pediram licença para sair e me deixaram ali com a família dela.

"Não pode me tratar assim na frente dos outros, menina." Ricardo resmungou, a cara fechada ainda estava a mesma, e me segurei para não revirar os olhos. Enfiei as mãos no bolso do meu jaleco, sentindo minhas unhas pressionarem as palmas das minhas mãos tamanha raiva.

"Eu não sou nenhum tipo de guia turística de São Paulo, não." Ela respondeu nervosa, se virando pra mim em seguida. "Quer ir comigo e Aninha pra quimio, amor?"

Sorri instantaneamente quando Vitória falou comigo, a voz ficando calma outra vez. Olhei de lado para o padrasto dela, que fazia outra careta, agora de desgosto. Os olhos de Vitória sempre brilhavam pra mim, o que aqueceu minha alma todinha. Mas eu não poderia acompanhar as duas, tinha acabado de voltar para o hospital depois de sumir sem nenhuma explicação e precisava conversar com algumas pessoas antes de ir pra sala de cirurgia. 

"Tenho uma reunião e logo depois uma cirurgia, Vi, mas passo aqui mais tarde pra gente ir pra casa." Ela sorriu, mais surpresa por algo do que por qualquer outra coisa. "Que foi?"

"Nada." Ela se inclinou e me deu um selinho rápido. "Te espero pra gente ir pra casa." O sorriso grande me fez sorrir.

Me virei de costas para ela e Ricardo, que seguia me encarando como se fosse sair algum tipo de raio laser dos olhos dele na minha direção, e segui pelo longo corredor, quando trombando com outro médico quando parei bruscamente no meio do caminho, finalmente entendendo o motivo do sorriso grande de Vitória. Ir pra casa. Sorri com o pensamento de ter uma casa onde Vitória estivesse comigo todos os dias, uma vida onde Vitória iria me acordar todas as manhãs me chamando de amor e fazendo as borboletas no meu estômago se alvoraçarem. 

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