POV WILL
Não dormi bem naquela noite, mesmo depois de conseguir fazer a cabeça parar de trabalhar. Ao fundo o ruído constante da chuva e do vento no telhado não desaparecia. Puxei o velho cobertor sobre cabeça e mais tarde coloquei também o travesseiro. Mas só consegui dormir depois da meia-noite, quando a chuva finalmente se aquietou num chuvisco mais silencioso. Só o que eu conseguia ver pela minha janela de manhã era uma neblina densa, e sentia a claustrofobia rastejando em minha direção. Nunca dava para ver o céu aqui; era como a cela de prisão que imaginei. O café da manhã com Apolo foi silencioso. Ele me desejou boa sorte na escola. Agradeci, sabendo que as esperanças dele eram perda de tempo. A boa sorte geralmente me evitava. Apolo saiu primeiro para a delegacia, que era sua esposa e sua família. Depois que ele partiu, fiquei sentado à velha mesa quadrada de carvalho, em uma das três cadeiras que não combinavam, e observei a pequena cozinha, com as paredes escuras revestidas de madeira, armários de um amarelo vivo e piso de linóleo branco. Nada havia mudado. Minha mãe tinha
pintado os armários dezoito anos antes numa tentativa de colocar algum raio de sol na casa. Acima da pequena lareira na microscópica sala adjacente, havia uma fileira de fotos. Primeiro, uma foto do casamento de Apolo e minha mãe em Las Vegas; depois, uma de nós três no hospital em que nasci, tirada por uma enfermeira prestativa, seguida pela procissão das minhas fotos de escola até aquele ano. Era constrangedor olhar aquilo: os cortes feios de cabelo, os anos de aparelho, a acne que finalmente sumiu. Eu teria de pensar no que poderia fazer para que Apolo as colocasse em outro lugar, pelo menos enquanto eu morasse aqui. Ao observar a casa, era impossível não perceber que Apolo jamais superou a perda da minha mãe. Isso me deixou pouco à vontade. Eu não queria chegar cedo demais na escola, mas não conseguia mais ficar ali. Vesti meu casaco — de plástico grosso e não respirável, como um traje de biossegurança — e saí para a chuva. Ainda estava chuviscando, não o suficiente para me ensopar, enquanto peguei a chave da casa, sempre escondida debaixo do beiral, e tranquei a porta. O chapinhar das minhas novas botas impermeáveis era estranho. Senti falta do habitual esmagar de cascalho enquanto andava. Dentro da picape estava agradável e seco. Ártemis, ou Apolo, obviamente tinha feito uma limpeza, mas os bancos com estofado caramelo ainda cheiravam levemente a tabaco, gasolina e hortelã. Para meu alívio o motor pegou rapidamente, mas era barulhento, rugindo para a vida e depois rodando em um volume alto. Bom, uma picape daquela idade teria suas falhas. O rádio antigo funcionava, um bônus que eu não esperava. Não foi difícil encontrar a escola; como a maioria dos lugares, ficava perto da rodovia. De cara, não pareceu que era uma escola; o que me deu a dica foi a placa, que dizia Forks High School. Era um conjunto de casas iguais, construídas com tijolos marrons. Havia tantas árvores e arbustos que no início não consegui calcular seu tamanho. Onde estava o espírito da instituição?, eu pensei. Onde estavam as cercas de tela, os detectores de metal? Estacionei perto do primeiro prédio, que tinha uma plaquinha acima da porta dizendo SECRETÁRIA. Ninguém mais havia estacionado ali, então eu certamente estava em local proibido, mas decidi me informar lá dentro em vez de ficar dando voltas na chuva feito um idiota. Lá dentro, o ambiente era bem iluminado e mais quente do que eu imaginava. O escritório era pequeno; com uma salinha de espera com cadeiras dobráveis acolchoadas, carpete laranja manchado, recados e prêmios atravancando as paredes, um relógio grande tiquetaqueando alto. Havia plantas por toda parte em vasos grandes de plástico, como se não houvesse verde suficiente do lado de fora. A sala era dividida ao meio por um balcão comprido, abarrotado de cestos de arame cheios de papéis e folhetos de cores vivas colados na frente. Havia três mesas atrás do balcão; um homem baixo e redondo estava sentado atrás de uma mesa. Ele vestia uma camiseta com estampa de animal, o que de imediato fez com que eu chegasse a conclusão que ele só podia ser louco, por se vestir assim com aquele tempo.O homem careca olhou para mim.— Posso ajudá-lo?
— Sou Will Solace — informei-lhe, e vi o reconhecimento imediato nos olhos dele. Eu era esperado, já assunto de fofoca. O filho do chefe de polícia, que tinha uma mãe desequilibrada, finalmente voltava para casa.
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More than I imagined -Solangelo -twilight
RomanceNUNCA PENSEI MUITO em como morreria, embora nos últimos meses tivesse motivos suficientes para isso, mas, mesmo que tivesse pensado, não teria imaginado que seria assim. Olhei fixamente através do grande salão, dentro dos olhos escuros da caçadora...