Carine

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POV WILL

Nico me levou ao cômodo que me apontara como o escritório de Carine. Parou do lado de fora da porta por um instante.

— Entrem — convidou Carine lá de dentro.

Nico abriu a porta de um cômodo de pé-direito alto com janelas longas que ocupavam toda a altura das paredes. Havia estantes até o teto em todos os lados, com mais livros do que eu já vira fora de uma biblioteca.

Carine estava sentada atrás de uma enorme mesa, colocando um marcador nas páginas de um livro que segurava. A sala era como sempre imaginei que seria um gabinete de reitor de universidade, só que Carine parecia jovem demais para o papel.

Saber tudo pelo que ela passou, depois de ter assistido na minha imaginação, mesmo tendo noção de que minha imaginação não era suficiente e que tudo devia ter sido bem pior do que visualizei, acabou me fazendo olhar para ela de um jeito diferente.

— O que posso fazer por vocês? — perguntou ela com um sorriso, levantando-se.

— Eu queria mostrar a Will um pouco da nossa história — disse Nico. —Bom, da sua história, na verdade.

— Não queríamos incomodá-la — falei, me desculpando.

— De forma alguma — disse ela para mim. E, para Nico: — Por onde vai começar.

— Pelo cocheiro — respondeu Nico. Ele me girou para ficarmos de frente para a porta pela qual tínhamos entrado.

Aquela parede era diferente das outras. Em vez de ter uma estante, era abarrotada de dezenas e dezenas de quadros emoldurados. Eram todos de tamanhos e estilos diferentes, alguns monocromáticos e opacos, outros de cores vibrantes. Procurei alguma lógica, alguma coisa que todos tivessem em comum, mas não consegui encontrar ligação.

Nico me puxou para o canto esquerdo, colocou as mãos nos meus braços e me posicionou diante de um dos quadros. Meu coração reagiu da forma que sempre reagia quando ele tocava em mim, mesmo do jeito mais casual. Era mais constrangedor sabendo que Carine também era capaz de ouvir.

O quadro que ele queria que eu visse era uma pequena tela quadrada em uma moldura de madeira simples; não se destacava entre as peças maiores e mais brilhantes. Pintada em tons de sépia, retratava uma pequena cidade cheia de telhados escarpados. Um rio largo enchia o fundo, atravessado por uma ponte coberta de estruturas que pareciam pequenas catedrais.

— Londres nos anos 1650 — disse Nico. 

— A Londres da minha juventude — acrescentou Carine, a pouca distância de nós. Eu levei um pequeno susto; não havia ouvido sua aproximação. Nico segurou minha mão e apertou de leve.

— Você pode contar a história? — pediu Nico.

 Eu me virei para ver a reação de Carine. Ela encontrou meu olhar e sorriu.

— Eu contaria, mas estou um pouco atrasada. O hospital ligou esta manhã. O Dr. Snow tirou o dia de licença. Mas Will não vai perder nada. — Ela sorriu para Nico agora. — Você conhece as histórias tão bem quanto eu.

Era uma estranha associação a ser assimilada, a rotina de uma médica de cidade pequena no meio de uma discussão do começo de sua vida na Londres do século XVII. Também era inquietante perceber que ela só devia estar falando em voz alta para que eu pudesse ouvir. Com outro sorriso caloroso, Carine saiu da sala. Olhei a pequena tela da cidade natal dela por um longo momento.

— O que aconteceu depois? — perguntei, de novo. — Quando ela percebeu o que havia lhe ocorrido?

Ele me fez andar meio passo, com os olhos em uma paisagem maior. Foi toda pintada em cores de outono e mostrava uma campina vazia em uma floresta sombria, com o pico de uma montanha negra à distância.

More than I imagined -Solangelo -twilightOnde histórias criam vida. Descubra agora