Capítulo 9 - Lágrimas

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Narrado por Gabriel


Ir embora dormir não era uma opção, pois precisa entrar na casa de Anna e contar a ela que sua mãe havia sido assassinada.

Não podia entrar e contar como se fosse normal e rotineiro que Lúcia havia sido encontrada sem vida dentro de um rio. Precisa ser o mais informal possível e tentar dizer da maneira mais simples, pois se falasse como policial, talvez a machucasse ainda mais. Ela sabia que eu tive um caso com sua mãe, por isso, deveria ser informal e não profissional, não naquele momento.

Tirei a jaqueta da polícia, desajeitei a camisa branca, tirei a barra de dentro da calça e desfiz o penteado. Parecia menos policial agora, observei meu rosto no retrovisor para ter certeza.

Desci do carro e atravessei a rua. Andei pelo gramado bem-cuidado e segui em direção da varanda. Meu coração parecia que ia explodir de ansiedade e desespero. Na verdade ir como policial e contar aquelas coisas como uma pessoa comum, me deixava nervoso e com vontade de voltar para o carro e partir para longe.

Apertei a campainha e logo Anna atendeu. Havia chegado o momento de contar a ela.

Fiquei estático de frente a ela.

- Gabriel, encontrou a minha mãe? - ela perguntou olhando por trás de meus ombros à procura da mãe.

- Encontrei sim - deixei escapar, com o máximo de esforço. - Anna, precisamos conversar, posso entrar?

Ela deu espaço, ansiosa e com a testa franzida em desespero.

- Aconteceu alguma coisa?! - perguntou atônita.

Assenti, meneando a cabeça.

Anna engoliu em seco e gritou histérica:

- E vai ficar aí quieto, em silêncio, me olhando com essa cara?! Eu preciso saber onde minha mãe está e você só está me assustando.

O espírito rebelde e adolescente dela aflorou. Os olhos dela voltaram a revelar a raiva que sentia por mim.

Engoli em seco dessa vez e disse:

- Ela foi encontrada próxima à rodovia principal...

Abaixei a cabeça e continuei, firme:

- Sem vida.

Após minha enunciação, tudo se silenciou, até mesmo o som da tv no andar de cima.

Depressa olhei para a escada e alguém a descia, voltando o som de vida na casa.

- O que você disse?! - uma voz saiu da escada, era Eric.

O jovem estava de pijama e descia rápido, junto do controle da tv em uma das mãos.

- A mãe de vocês foi encontrada morta dentro de um rio... - repeti o mais rápido possível, tentando mensurar minhas palavras.

As lágrimas de Anna caíram antes mesmo de Eric se aproximar de nós. Ele sentou do lado da irmã e a abraçou. Ele não chorou, apenas passou a mão nos cabelos da irmã, tentando acalmá-la.

- Como você sabe que é ela? - perguntou o adolescente, incisivo.

- O carro estava com as portas abertas e o corpo dela foi encontrado alguns metros dele. Eu vi sua mãe, aliás o corpo dela, e Meredith, a Agente Forense pode confirmar isso a vocês. - disse, deixando de lado o meu lado informal ineficiente e começando a agir como policial. Teria que deixar minhas emoções guardadas por um para lá.

- A partir de agora vocês ficarão protegidos pela polícia da cidade e nós faremos rodízio para que vocês fiquem seguros até descobrirmos o que aconteceu com a mãe de vocês. Não deixarei que nada aconteça com vocês dois.

- Você deveria ter cuidado de minha mãe, assim que a conheceu, ao invés de aparecer agora e dizer isso para nós. Se você a tivesse protegido, talvez ela estivesse aqui e não morta! - gritou Anna afastando-se do irmão e correndo em direção das escadas para o andar de cima.

Eric fitou a cena e depois fitou em minha direção.

- O que ela quis dizer com isso? - perguntou ele, com o cenho franzido.

Pigarreei e disse:

- Tivemos um caso há um tempo, sua mãe e a mim...

Eric arqueou uma das sobrancelhas e deu de ombros.

- Que se dane, ela está morta agora... - disse ele e se levantou do sofá, saindo da sala e me deixando sozinho.

Fiquei ali cabisbaixo e não o vi voltar.

- Quero você fora daqui agora mesmo!

Saí da casa, em silêncio, seguindo para a viatura com os olhos salpicados de lágrimas.

Mesmo não amando Lúcia, eu gostava dela. E agora os filhos dela estavam sozinhos, sem ninguém para protegê-los.

Antes de ir para casa, esperei a viatura prometida chegar. Assim que ela estacionou segui em direção de casa, arrasado.

Seria um dia longo.

Desaparecida na penumbraOnde histórias criam vida. Descubra agora