03.08.18 - Sexta

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De: zakrod98@gmail.com
Para: isa.sk8.2010@hotmail.com
Assunto: Estou cansado disso tudo... E ainda não acabou


Ah, que semana, amiga...

Aliás, me desculpe. Boa noite, antes de tudo! Estou deixando meus modos de lado, acho.

Minha dor de cabeça está forte hoje... Tenho estado assim esses dias: não durmo bem, e fico com dor de cabeça o dia todo.

Na segunda-feira fomos à delegacia. Os gêmeos ficaram me esperando pela manhã, sentados na minha nova (e minúscula) mesa de jantar. Fizeram questão de ir comigo. Como eles têm a chave (e eu já fale para eles pararem com o hábito de pedir licença pra entrar) nem perguntaram se eu queria a companhia deles, simplesmente disseram "vamos te levar, e ponto final".

Ok, vou parecer um ingrato agora, mas... A verdade é que eu queria ir sozinho. Tenho vergonha de tudo o que passei, por mais que eles fiquem falando toda hora que eu sou a vítima, e não tenho do que me envergonhar. Mas a verdade é que... tudo o que aconteceu.... é degradante.

Quando desci (já vestido e com dentes escovados porque o banheiro fica no andar de cima, junto com meu quarto) eles se levantaram quase como uma espécie de solenidade. O Nicolas estava com a chave do Gol, e tinha uma expressão de dignidade no rosto. Imagino que fosse aquela máscara extra de força e coragem que as pessoas colocam para dar apoio às outras mais fracas.

Ele não disse nada, apenas continuou me olhando (sei que ele estava tentando me ler). Já a Jack, veio para perto de mim e segurou minhas bochechas, perguntando se eu estava pronto. Ela tem feito isso ultimamente (apertar minhas bochechas e puxá-las) no intuito de me arrancar uma risada. Geralmente funciona, mas naquela manhã de segunda, não deu. Eu só fiquei parecendo uma gosma desanimada e bochechuda olhando pra ela.

Quando a porta do carro foi aberta para mim, me enfiei no banco de trás (eles queriam que eu sentasse no passageiro, mas por algum motivo me senti mal ali – é como se o banco da frente fosse exposto demais e, como eu já iria me expor, não queria uma dose extra, sabe?).

A delegacia em que fomos é de Vale do Ocaso, mesmo. A Jaqueline disse que a da nossa cidade é melhor do que a de Eloporto nesse aspecto, pois estamos numa cidade pequena, com menos incidências. Logo, eles dariam mais atenção do que o da metrópole vizinha.

Assim que entramos, perguntaram do que se tratava, e eu falei que fui lá para fazer um "B.O.". Eu devo ter falado tão pra dentro que o policial da recepção não entendeu, e foi a Jack que repetiu no meu lugar. Não sei se está certo isso, mas, eu gostei de poder depender dela naquela hora.

Pena que ela não poderia contar tudo em meu lugar.

O policial pediu para esperarmos um pouco, e não demorou muito até que nos levassem para a sala de um senhor com cara de Papai Noel. Quando eu e a Jack sentamos (pois só tinha duas cadeiras diante da mesa, e com isso o Nick ficou de pé atrás de mim) vi que na placa de identificação dele estava escrito "Delegado Vicente Blanco". Ele começou nos cumprimentando, e já de cara achei ele simpático (tinha um sorriso bondoso e jeito tranquilo de falar).

Assim que ele cruzou os dedos das mãos, perguntou "E então, por que três jovens estão me encarando numa manhã de segunda-feira?". Pelo jeito como falou, ele deve ter imaginado que iríamos relatar algum roubo, ou coisa parecida. Então a Jack olhou pra mim, me incentivando a desembuchar.

Não tinha mais como depender dela. E não foi exatamente fácil dizer, com todas as palavras "Vim denunciar um estupro". Naquela hora, o delegado Vicente perdeu o sorriso e uniu aquelas sobrancelhas grossas de Monteiro Lobato. Ele fez um "Oh" meio chocado, e olhou para a Jaqueline perguntando o que tinha acontecido.

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