TWENTY | SURPRISE

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Carter estava certo. Na manhã seguinte, todos foram obrigados a voltarem às suas atividades. O que Carter não sabia era que Wakanda havia separado uma atividade exclusiva para mim.

Por isso, fiquei confusa quando um homem, que tinha mais músculos do que ossos, me arrastou para o lado oposto à casa de Olga. Fiquei ainda mais confusa quando me deparei com a própria chefe me aguardando na arena que eu quase havia morrido no dia anterior. A diferença é que não havia uma multidão e, no lugar dos inúmeros guardas com escudos, haviam alguns objetos de treino.

— Mandou me chamar, Alteza? — debochei, sentindo meu braço doer pela força que o homem fazia.

ju silẹ — falou para o homem que me largou no mesmo segundo e se retirou.

"Solte-a"

— Então...— eu quis dar início à conversa, numa tentativa de entender o que diabos eu estava fazendo ali com ela.

— Você fará parte da guarda da aldeia — revelou, sem cerimônias.

— Eu o quê? — pisquei freneticamente tentando entender.

— Apesar da sua falta de respeito, ontem eu notei que você não se deixa abalar fácil durante uma luta — ela começou a dizer enquanto andava ao meu redor com as mãos atrás do corpo — então concluí que, se você soubesse lutar, poderia ter acabado com o morto em menos tempo do que precisou — ela me avaliou de baixo a cima — por isso, irei usar sua determinação e a sua força de vontade ao meu favor — ela parou em minha frente — irei lhe ensinar a lutar.

— Você me ensinará a lutar? — quis confirmar.

— Além de desrespeitosa, é surda? — me calei e ela me deu as costas — preciso que veja algo antes de começarmos — com isso, ela começou a caminhar. Presumi que deveria segui-la e assim o fiz.

Andamos cerca de dois metros apenas, até que paramos ao lado de duas pequenas elevações planas de madeiras que estavam amarradas por cordas e, que percebi, tamparem um enorme buraco no chão.

Wakanda fez um sinal com a mão e os aldeões, que estavam nos acompanhando, puxaram as cordas que sequencialmente puxaram as madeiras que serviam como tampas, revelando o que havia dentro do buraco. Me assustei ao ver um cadáver de um homem em meio há centenas de cobras, provavelmente de grande maioria venenosas.

— O que aconteceu com ele? — perguntei assustada.

— Ele me traiu — ela disse atrás de mim e eu engoli em seco — tente qualquer coisa contra a minha aldeia ou a mim e você, e seus amigos, terão o mesmo fim que esse traidor teve — rosnou entredentes bem perto do meu ouvido.

— Isso é uma ameaça? — eu me virei para encara-la. Odiava que alguém me intimidasse desse jeito.

— Um aviso. E, se você for inteligente como penso que é, vai escuta-lo. — ela levantou levemente o queixo, demonstrando sua superioridade — vamos treinar — me deu as costas e começou a voltar para a arena.

— agora? — perguntei preocupada enquanto tentava a seguir no mesmo ritmo, minha perna estava machucada e eu mal conseguia me equilibrar com ela.

— Por que não? — ela tirou a capa que ficava presa em seu traje de couro e pegou uma espada.

— Porque eu estou machucada? — minha afirmação soou como uma pergunta óbvia.

— Em uma guerra, seus inimigos não se importam com os seus ferimentos — ela retrucou, fazendo um gesto com a cabeça para um aldeão que me entregou uma espada. Eu nem conseguia segurar a lâmina direito por ser tão pesada. — lembre-se de algo, a dor está na sua cabeça. Sua mente é mais forte que o seu corpo, então quando você não foca nisso, você não sente. — me instruiu e eu assenti, tentando pensar em outra coisa além dos meus arranhões — agora, defenda-se — disse e me golpeou com a espada, precisei raciocinar tão rápido em uma defesa para que a sua lâmina não me acertasse que o meu único instinto foi levantar a minha espada para parar a sua. Nem tive tempo de comemorar por ter dado certo que ela já me golpeou novamente.

(...)

Wakanda cumpriu sua palavra e me treinou arduamente por sete dias, quando decidiu por si mesma que eu já estava pronta para ficar na guarda da aldeia. Ela estava certa sobre eu estar pronta, eu já sabia manusear armas brancas e melhorei bastante minhas técnicas na luta corporal. Com todo o tempo que passamos juntas, nossa relação consequentemente melhorou também. Não era como se fôssemos melhores amigas, mas ela tinha certeza que todos nós havíamos entendido os nossos lugares ali dentro. Ela sabia que nunca mais interferiríamos em qualquer cerimônia maluca, porque tínhamos consciência de que passaríamos fome novamente. E ela estava certa. De novo.

Com tudo entrando nos eixos novamente, quase havíamos esquecido o porquê de estarmos ali. Quase.

Fui lembrada que estava na aldeia como uma escrava e não como uma integrante quando, em uma das rondas noturnas - que eu fazia ao redor da aldeia para me certificar de que não havia nenhuma falha nos muros de madeiras -, alguém me puxou entre os arbustos e tampou a minha boca antes que eu pudesse gritar. Sem nem pensar duas vezes, eu proferi alguns golpes, como cabeçadas e cotoveladas, para me soltar do indivíduo que me segurava. Quando eu me virei para acertar o rosto da pessoa que havia me sequestrado dentro da própria aldeia, tive uma surpresa.

— Aiken? — murmurei assustada.

— Surpresa!

Ninka Baker e Os RecrutasOnde histórias criam vida. Descubra agora