Capítulo V

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  Às cinco e meia da tarde, já começava a escurecer quando ajudei sr.Fillipo a fechar a floricultura, ele deu-me o pagamento do dia e se despediu de mim. Resolvi ir caminhando, empurrando minha bicicleta, para minha casa, queria adiar ao máximo minha chegada. Caíque tinha me mandado uma mensagem dizendo que ia chegar com Tati por volta das oito. Cheguei em casa por volta das seis e quinze, antes de abrir a porta ouvir a risada de Liz e Camille, pareciam animadíssimas...até eu abrir a porta e entrar. O sorriso de Liz sumiu e ela adotou aquela expressão de desprezo por mim, Camille também não se dava o trabalho de demonstrar qualquer simpatia.
  - Não precisam se incomodar, já vou descer. - falei.
  - É impossível não me sentir incomodada com sua presença. - disse Liz com amargura.
  - Estava tudo tão maravilhoso sem você. - comentou Camille - Não me diga que vai jantar com a gente, eu estou amando sua ausência nos jantares. Dá a sensação que não temos um problema na família.
  Engoli a dor que me causava tudo aquilo como se fossem cacos de vidro e falei:
  - Não faço questão, mas Caíque pediu que eu...
  - Caíque tem pena de você. - me interrompeu minha meia-irmã insensível - Mas acredite, ele ficaria melhor se você não estivesse. Todos nós ficaremos.
  As lágrimas ameaçavam descer, mas eu lutei contra elas, desde meus dez anos eu prometi a mim mesma que elas jamais me veriam chorar novamente.
  Dei as costas a elas e desci praticamente correndo para meu quarto. Coloquei minha mochila em cima de minha poltrona. Peguei um vestido, não valia o esforço tentar me arrumar, então tomei um banho, vesti o vestido, fiz um coque no cabelo e calcei meu chinelo.
  Guardei parte do que ganhei do sr.Fillipo em meu pote de economias e coloquei a outra parte na carteira.
  Logo depois ouvi duas batidas na porta do meu quarto. Era Caíque.
  Respirei fundo, subi e abri a porta.
  - Acho que não é uma boa ideia participar desse jantar. - falei.
  - Por quê? Já contei a Tati, ela ficou bastante surpresa, mas entendeu quando expliquei a situação e prometeu segredo. Por que é melhor ficar de fora?
  - Só não quero estragar tudo.
  - Você não vai estragar nada.
  Suspirei.
  - Onde ela está?
  - Na sala, com nosso pai, minha mãe e Camille. Vamos?
  - Não sei não, Caíque.
  Mas meu irmão já me puxava pela mão para sala.
  Lá estava, a família reunida. E Tati, bela, e sorridente. Ela levantou-se ao meu ver.
  - Oi Kate! - cumprimentou-me ela.
  Ela não podia falar sobre como estava surpresa por descobrir sobre meu parentesco com Caíque, Sebastian não podia sonhar que as pessoas não sabiam que eu e meus irmãos eram irmãos.
  - Oi Tati.
  Ela se aproximou mais de mim para...me abraçar?
  Sim. Me abraçar. E eu demorei uns cinco segundos para retribuir, todo mundo percebeu minha hesitação. Me afastei o mais rápido que podia.
  Caíque se aproximou de Tati, eles se sentaram ao lado de Camille no sofá, Sebastian e Liz estavam sentados no outro. Não havia espaço para mim. Como acontecia com frequência me senti uma intrusa. A família deveria ser daquele jeito.
  - Kate?
  - Hum. - só então percebi que Sebastian falava comigo.
  - Perguntei se você está bem. Ficou pálida de repente.
  - Ela é pálida, pai. - comentou Camille.
  Eu não podia fazer isso.
  Ignorei minha meia-irmã e falei:
  - Eu...eu acabei de lembrar que tenho uma reunião com o grupo de soletrando da escola, é importantíssima e não posso faltar - lancei um olhar como um pedido de desculpas ao Caíque - Eu preciso ir, mas é um prazer revê-la, Tati - só que não - Fico muito feliz por você está namorando com meu irmão. - o que eu queria dizer era: Faça ele feliz - Tchau.
  Fui até meu quarto, joguei minha carteira dentro da bolsa de lado. Sebastian estava na cozinha me esperando.
  - O que deu em você? - questionou ele.
  - Estou atrasada, pai.
  - Seu irmão trouxe a namorada dele para conhecer a família, não pode ficar para o jantar? Kate?
  - Eu...Eu preciso mesmo ir. Ficaria se não fosse importante. Espero que o jantar seja ótimo.
  Ele me deu um beijo na bochecha.
  - Tudo bem. Vá.
  E eu fui.
  Andei até o ponto de ônibus, peguei um que ia para o centro da cidade e me sentei em uma cadeira na janela.
  Só então chorei.

○○○
 
  Desci quinze minutos depois em uma praça, tinha uma festa rolando em uma casa em frente. A praça não estava muito movimentada então me sentei em um dos balanços.
  Eu sempre ficava apavorada quando a família estava reunida. Parecia que todo mundo estava prestes a explodir, bastava um comentário de Camille ou Liz para Sebastian ou Caíque rebater, e aí começava uma discussão, o clima pesava e eu me sentia péssima. Eu amava demais meu irmão para acabar com sua noite dessa forma.
  - Katherina?
  Ah, não. Não, não. Diego.
  E eu ainda estava chorando.
  Tirei meus óculos e enxuguei as lentes o mais rápido que consegui.
  - Tá me perseguindo, é? - perguntei com a voz ainda embargada por chorar, enxugando com as costas das mãos as lágrimas que desciam pelas minhas bochechas.
  - Eu hein, é claro que não. A festa de aniversário da amiga que te falei mais cedo é de frente a praça e...Tá chorando?
  Ele que estava há alguns metros de distância de mim rapidamente encurtou para poucos centímetros. Diego se ajoelhou na minha frente e me encarou.
  - Não. - respondi, mesmo estando literalmente na cara que eu estava.
  - Alguém a machucou? Está se sentindo mal? Katherina fale comigo. - pediu ele.
  Eu o encarei mesmo com a vista embaçada pelas lágrimas, ele realmente parecia preocupado...Ou talvez fosse pena.
  Ele enxugou com o polegar uma lágrima que eu nem havia percebido que caira.
  - Volte para festa, tá? - falei - Estou bem.
  - Está louca se acha que vou deixá-la nesse estado aqui. E para mim está mais que claro que você não está bem.
  - Por que está aqui? Você nem se importa comigo! - falei - Então me deixe em paz, saia daqui!
  - Não vou sair.
  - Então saio eu. - falei levantando bruscamente o que o fez cair de bunda no chão.
  Comecei a caminhar pelo meio da praça, mas não andei muito até Diego - que levantou rapidamente do chão - me deter pelo braço.
  - Solte meu braço. - ordenei.
  Ele não soltou.
  - Dá para se acalmar? Por favor.
  - Por que não vai embora?
  - Já disse, não vou deixa-lá aqui.
  Fechei os olhos e respirei fundo. Quando voltei a abrí-los Diego me encarava com aqueles olhos castanhos. E não sei bem porquê eu o abracei, e ele me abraçou. Meu rosto ficava na altura do seu peito e eu ouvi as batidas do seu coração e ficamos assim, em silêncio até eu perceber que:
  EU  ESTAVA ABRAÇADA COM DIEGO.
  Me afastei daquele abraço  quente e acolhedor.
  - Nenhuma palavra sobre isso a ninguém. - falei antes que ele tivesse tempo de comentar alguma coisa.
  - Como se eu... - ele se interrompeu e disse - Tudo bem.Eu não falo.
  - Ótimo.
  - Vai me dizer porquê estava chorando?
  - Só problemas de família. - falei. Resolvi mudar de assunto - Sua amiga lhe perdoou?
  - Sim. Ela amou as orquídeas e os bombons. Acho que essa eu fico te devendo.
  - Não tá me devendo nada. - coloquei os óculos de volta - Pode voltar para festa, eu tô bem, sério.
  - Para onde vai? - ele perguntou e depois me lançou um sorriso torto.
  - Comprar doces para me livrar de uma vez da bad.
  - Posso acompanhá-la?
  - Diego, porquê do dia para noite está tentando se aproximar de mim? Você nem falava comigo.
  - Bem, preciso de você para passar em álgebra e achei, quero dizer eu pensei muito e cheguei a conclusão que seria bacana se tivéssemos um bom...relacionamento, sabe, podíamos ser amigos.
  Estreitei os olhos tentando me decidir se acreditava ou não nele.
  - Você não é o tipo de pessoa que é amigo de gente esquisita. Apenas de populares.
  - Você não é esquisita. É engraçadinha.
  Fiz uma careta.
  - Por favor, me chame de esquisita.
  Ele riu.
  E eu ri.
  E foi aí que percebi que gostaria da companhia dele, apenas naquela noite. Mas jamais admitiria isso para ele.
  - Então, posso ou não?
  - Não sei se seremos amigos, provavelmente não. Somos diferentes demais para isso, mas se quiser vim comigo, pode vim.
  - Pois eu acho que seremos amigos. - disse ele - Posso chamá-la de Kate?
  - Não.
 
 
 
 

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