Cheguei em casa de quase onze e meia da noite, o vestido continuava molhado pelo banho de praia, o cabelo não estava nem de longe em seu melhor dia. A luz da sala estava apagada, torcia para que todos já estivessem dormindo. Entrei pela porta de trás, como de costume, fui o mais rápido que consegui para meu quarto, feliz por ninguém ter me flagrado -mas como era minha vida e dificilmente as coisas davam certo para mim descobri segundos depois que tinha comemorado cedo demais - então a luz do meu abajur acendeu de repente me dando um baita susto e sentado em minha poltrona, com uma cara nada feliz, de braços cruzados estava Caíque.
- Caíque! Que susto! Que novidade é essa de ficar por aí no escuro? Por aí não, em meu quarto! Já tá bem tarde, não devia tá dormindo?
- Estava esperando você. E você está certa, está bem tarde, muito tarde para uma mocinha como você está andando sozinha por aí.
- Oi? Caíque, eu não sou uma criança, tenho dezesseis anos! Próxima semana vou fazer dezessete, não precisa se preocupar.
Ele levantou-se bruscamente e me lançou um olhar bastante severo.
- Poderia ter vinte, trinta, sessenta anos! Vou sempre me preocupar com você. - então ele franziu a testa olhando para meu vestido, só agora ele havia reparado o quão encharcado estava meu vestido - Minha nossa, onde é que você estava?
- Eu...
- E não diga na reunião, sei que não tinha nenhuma. - disse ele me interrompendo - Liguei para Denise e ela não fazia ideia de nenhuma reunião.
Suspirei. Denise era minha amiga, ela sabia que Caíque e Camille eram meus irmãos, a única a quem eu havia confiado e contado. E também fazia parte do grupo de soletramento. Eu devia ter ligado para ela e pedido para me ajudar, mas sai tão desestabilizada que não pensei em nada disso.
- Ok, eu vou contar. Mas só depois que tomar um banho. Talvez seja melhor conversarmos amanhã...
- Nada de amanhã. Vou está esperando você bem aqui. - disse ele determinado sentando em minha cama.
Revirei os olhos.
- Tudo bem.
Quando voltei do banho, com meu pijama favorito e o cabelo penteado sentei-me ao lado do meu irmão.
- Sou todos ouvidos. - disse ele.
- Certo, eu menti. Não tinha reunião, eu só queria uma rota de fuga.
- Rota de fuga? Por quê?
- Você sabe como me sinto quando a família está junta. Caíque, você sabe como as coisas sempre terminam...Eu queria que a noite fosse boa para você. Só para variar.
- Ah, Kate. - ele me abraçou compreendendo - Sinto muito mesmo. Odeio isso.
- Eu também odeio.
Ele se afastou para me encarar.
- Você terá outras chances de conhecer melhor a Tati.
Esse era outro problema, mas não mencionaria para Caíque.
- É, claro. Falando nela, como foi o jantar?
- Ótimo. - respondeu ele - Mas não pense que vai escapar, onde estava? Porque chegou toda encharcada?
- Vou resumir. - falei e resumiria mesmo, não ia contar sobre Diego - Fiquei andando por aí, comprei chocolate, acabei na praia, resolvi dá um mergulho e depois voltei para casa.
- Sabe o quanto se arriscou? - lá estava a expressão carrancuda de novo.
- Eu estou bem, Caíque.
- Ainda bem. Só não faça mais isso, se demorasse mais cinco minutos eu ia atrás de você.
- Você é um perfeito irmão mais velho, sabia? - disse eu lhe dando um beijo na bochecha, ele sorriu livrando-se da carranca.
- Ok - disse ele levantando da cama - Você está cansada e eu estou morrendo de sono, vou dormir, boa noite, Kate. Te amo.
- Boa noite, Caíque. Também te amo.
Ele foi embora.
E enfim respirei aliviada.○○○
Segunda-feira, era o dia que tinha treinamento do time de futebol e das líderes de torcida. A escola ficava em uma agitação terrível, eu costumava passar o intervalo inteiro na biblioteca. Hoje não era diferente, assim que o sino tocou para o intervalo peguei minhas coisas e fui para meu armário guardá-las. O corredor estava super barulhento, eu avistei Diego a poucos metros acompanhado do meu irmão, e de outros rapazes do grupo dele.
Diego olhou para mim, e por uma fração de segundos nossos olhos se encontraram, mas aí desviei os olhos e continuei andando até meu armário que ficava um pouco depois de onde eles estavam. Passei rapidamente por eles fazendo o possível para não olhar para eles. Abri meu armário, guardei minha bolsa e peguei um romance que estava lendo na última semana para aula de literatura. Fechei meu armário e subi para o primeiro andar onde ficava a biblioteca, mas antes resolvi ir ao banheiro - que também ficava no mesmo andar - entrei e percebi tarde demais que Tati e suas amigas estavam lá, retocando a maquiagem, todas vestidas com o fardamento das líderes de torcida, vermelho e azul.
- Ora, ora, se não é a esquisita da escola. - disse Tati - Garotas, saiam, preciso falar com o patinho feio a sós.
Me encolhi quando passaram por mim, todas esbarraram em mim. Então ficamos apenas eu e Tati.
- O que contou ao seu irmão? - questionou ela.
- Nada. - respondi - Se eu tivesse contado tenha certeza que ele não estaria com você.
Ela me fulminou com os olhos.
- E porquê não contou? Acha que vai me chantagear?
- Não contei porquê meu irmão está muito bem, porque apesar de ser bem cruel comigo e com todos que acha inferior a você ele está feliz namorando você. E não, Tatiane, não vou te chantagear, porquê eu não sou igual a você.
Ela se aproximou de mim.
- Escute bem Katherina, se pensar em contar ao seu irmão em como te trato, eu conto para toda escola que é irmã dele, a vida social do Caíque vai desmoronar, e tenho certeza que não quer isso né? Eu também não. Gosto do seu irmão, ele é um gato e o mais popular dos garoto depois do Diego. Então continue assim, esquisita, de bico fechado. Patinho feio. Por favor não se olhe no espelho, pode rachar e eu odiaria ficar sem espelho no banheiro. Agora sai da minha frente, quatro olhos.
Ela me empurrou e eu cai no chão sentindo as lágrimas arderem, de raiva e humilhação. Odiava me sentir tão impotente a Tatiane.
Ela saiu do banheiro rindo.
Tinha conseguido estragar meu dia, devia está satisfeita.
Levantei, ajeitei meu óculos, peguei meu livro que tinha caído ao meu lado e sai.
Não tinha ninguém naquele corredor, queria que continuasse assim até que eu chegasse a biblioteca. Mas como já mencionei - a sorte não andava ao meu lado - mal dei três passos e Caíque apareceu. E não precisei abrir a boca para que ele percebesse que algo tinha acontecido. Anos me defendendo e meu irmão sabia exatamente quando alguém me magoava, quando alguém me machucava.
- Quem foi? - perguntou ele com um olhar furioso.
- Quem foi o quê? - perguntei fingindo não saber sobre o que ele falava.
- Quem te chateou?
- Ninguém.
- Eu te conheço, Kate.
- Não aqui. Na escola somos estranhos, lembra? Eu tô bem, sério.
Ele não acreditou, mas mesmo assim me deixou ir para biblioteca sem me questionar mais.
Cheguei na mesa que costumo me sentar e me deparei com Diego sentado lá.
- Sério? Na minha mesa? - falei jogando o livro na mesa e recebendo um olhar fuzilante da bibliotecária.
- Sua mesa? - questionou ele rindo - Não vi seu nome escrito nela, pode me mostrar o registro que ela é sua?
Levantei para trocar de mesa, mas ele segurou minha mão e falou rapidamente:
- Ei, espera, eu estava esperando você.
- Por quê? Para quê?
- Só para confirmar se vai me ajudar em álgebra hoje, na minha casa.
- Eu disse que ia, então eu vou. Era só isso?
- Que mau-humor.
- Estou tendo um péssimo dia, Diego.
- Eu reparei.
- Te vejo em sua casa.
- Ok, entendi a deixa.
Ele levantou começou a caminhar em direção à porta, mas então girou nos calcanhares em minha direção e me soltou um beijo.
E eu rosnei para ele.
Diego saiu rindo, recebi outro olhar fuzilante da bibliotecária e fiquei com medo de perguntar se o dia ainda podia ficar pior.
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Uma Chance para Recomeçar
RomanceA felicidade nunca caminhou lado a lado com Katherina Thomson, ela podia dizer que sua infelicidade começou quando foi abandonada pela mãe. A sorte também não parecia simpatizar muito com ela, era criada pelo pai e uma madrasta que a odiava. O mundo...