A primeira coisa que notei em meu pai foi os traços de seu rosto, a expressão cansada, as olheiras, os novos fios brancos no cabelo, a barba por fazer, ele parecia ter envelhecido uns dois anos. Senti um aperto no coração, senti imediatamente a culpa me consumir por ter colocado aquela expressão no rosto dele.
Quando eu abri a porta ele estava com o braço estendido pronto para bater na porta. Imediatamente os olhos dele me encontraram.
- Pai... - tentei falar, mas saiu em um sussurro.
Parecia que fazia anos que eu o tinha visto pela última vez, e não apenas uns dias.
Ele não falou nada, apenas entrou e parou em minha frente.
Primeiro ele colocou uma mecha do meu cabelo atrás da orelha, depois segurou meu rosto com as mãos.
- Papai, sinto muito, eu... - comecei a falar, mas ele fez sinal para que eu parasse.
Ele tocou no curativo em meu rosto. Eu sentia que ele lutava para não desmoronar, parecia que vinha lutando há dias e em seus olhos vi um alívio tomando conta.
- Eu sei porquê fugiu. - disse ele com a voz embargada - Kate, minha filha, eu sinto muito por tudo...Eu fui tão imbecil...Fui cego.
Ouvi Daphine descendo os degraus e vi ela parar no último degrau nos observando com um misto surpresa e curiosidade.
- Pai, do que você está falando? - perguntei confusa.
- Caíque me contou tudo, Diego também. Eu casei com um monstro.- ele me abraçou. Um abraço forte e protetor. - Eu fiquei furioso ao saber tudo que você passou e com tanto medo do que podia ter acontecido com você, meu amor, o desespero tomou conta de mim.
Eu senti os olhos ardendo.
- Eu não suportei mais pai - falei com a voz trêmula - não aguentei... Estava no limite. Eu não podia mais ficar naquela casa, não fui tão forte quanto queria ser, não... - senti as palavras serem engolidas pela emoção.
Ele se afastou para olhar para mim.
- Você é a garota mais forte que conheço. Não merecia ter passado por tudo que passou. - disse ele.
- O que eles te contaram? - perguntei.
- Tudo. Por que nunca me contou, Kate? Eu jamais deixaria Liz machucar você, jamais continuaria com ela se soubesse pelo menos um terço de tudo que ela te fez, meu amor.
- Eu só não queria causar mais problemas.
Ele olhou para Daphine e falou:
- Obrigado por cuidar da minha filha.
- Ela também é minha filha, Sebastian. Faria qualquer coisa por ela. - respondeu Daphine.
- Eu quero que volte. - disse ele.
Comecei a negar com um aceno.
- Não vou voltar para lá. Não vou voltar para aquela casa, pai.
- Não vamos voltar para lá. Eu estou me separando da Liz. Aluguei uma casa, é para lá que nós dois vamos.
- Tá falando sério? Vai se separar mesmo dela? E seus negócios? A família perfeita...
- Você é mais importante que tudo isso. Sempre vai ser.
- Eu te dei a chance de se livrar de mim. Da sua obrigação comigo.
- Mas eu não quero me livrar de você, você não é apenas minha obrigação, eu amo você. Comecei a amar no momento que a encontrei naquela cestinha na minha porta, se você fosse ou não do meu sangue seria minha filha. Eu te amo tanto, Katherina Thomson, e quando cheguei em casa e descobri que você tinha fugido... Senti como se arrancassem um pedaço do meu coração, fiquei desesperado e aflito, passava tantas coisas horríveis em minha cabeça que podiam ter acontecido com você. Foi um inferno. A polícia descobriu que você estava em Deven e eu soube imediatamente que tinha vindo achar sua mãe. Vim o mais rápido que consegui. Eu nunca senti tanto medo... Na verdade nunca senti tanto medo de nunca mais te ver desde...
- Desde que eu fui buscá-la quando ela tinha três anos. - completou Daphine, agora ela estava ao meu lado - Como achou meu endereço tão rápido? Foi até o bar?
- Fui. E implorei para que seu tio me dissesse seu endereço.
- Pai, porquê não me disse que minha mãe já tinha ido me procurar?
- Vamos nos sentar e conversar. - disse minha mãe.
Fizemos isso.
- Kate, eu troquei todas as suas fraldas, te dava mamadeira, te colocava para dormir, eu vi seu primeiro passinho e cuidei de você todas as vezes que ficou doente, eu tive aprender que ser além de pai uma mãe, mas eu sempre soube que nunca ia preencher a falta que você ia ter.Daphine tinha me dito na carta que não podia ficar com você, que tinha um motivo sério, mas não me disse qual. Achei que ela jamais apareceria para te buscar. Então um dia cheguei em casa e descobri que Daphine tinha te levado eu fiquei desesperado, eu fui egoísta, eu sei e me arrependo muito por ter te afastado dela, mas eu tinha medo que ela me tirasse você. Que você quisesse morar com ela, eu não queria ficar longe de você. E depois fiquei com medo de te contar isso porquê eu me envergonho do que fiz e não queria que se decepcionasse comigo, que ficasse com raiva de mim. Você disse naquela mensagem que mandou para Caíque que eu nunca falhei com você, mas eu falhei e muito. Me perdoe, filha. Me perdoe por tudo.
Eu o abracei.
- Eu te perdoo, pai. Mas não minta para mim de novo. Por favor. - pedi.
- Nunca mais vou mentir. Eu prometo a você. - ele me deu um beijo na testa - E peço perdão a você, Daphine. Sinto muito.
- Eu entendi você, Sebastian. E também te perdoo, você estava pensando no que era melhor para Kate. Mas se tem uma pessoa que vai me ouvir essa pessoa será sua esposa.
- Ex-esposa. - corrigiu ele - Relevei muita coisa de Liz, mas as maldades que ela fez com você, Kate, isso passou de todos os limites. E o pior é que Camille é um reflexo da mãe. Espero que ainda haja esperança para ela se tornar uma pessoa melhor.
- Espero que sim. - falei.
Sebastian segurou minhas mãos nas suas.
- Vamos para casa.
Olhei para minha mãe, para minhas mochilas, e para o meu pai.
- Não vou precisar voltar a ver a Liz?
- Não. Ela nunca mais vai chegar perto de você. - disse ele e uma raiva contida surgiu em seus olhos.
Recomeçar era a palavra que vinha em minha mente, custava acreditar que a vida finalmente estava sorrindo para mim. Sentia uma sensação parecida com felicidade. Senti um vazio que levava comigo por anos se preencher.
Eu dei um abraço em Daphine.
- Você é muito melhor do que imaginei e sonhei. Muito melhor. Eu lhe dei um beijo na bochecha.
Ela estava chorando.
Olhei para meu pai que esperava minha resposta.
- Eu...Eu vou voltar. - respondi.
Ele me abraçou de novo.
- Venha sempre me visitar, - disse minha mãe enxugando as lágrimas do rosto - o Ben vai amar ter sua companhia, e ele vai querer te mostrar os brinquedos dele.
- Eu vou voltar. - falei sorrindo - Agora estou completa. Obrigada.
Ela me deu um beijo na testa. Peguei a mão dela e lhe dei um beijo. Depois fui até Sebastian, peguei a mão dele e fiz o mesmo.
- Vamos papai, vamos para casa. Preciso recomeçar.
Sebastian pegou minhas mochilas.
- Tchau Daphine. - disse ele.
- Tchau mãe. - falei - Eu ligo quando chegar.
- Boa viagem para vocês. - disse minha mãe.
Sim, eu iria recomeçar. E não deixaria mais ninguém me diminuir nem dizer quem eu era.

VOCÊ ESTÁ LENDO
Uma Chance para Recomeçar
RomanceA felicidade nunca caminhou lado a lado com Katherina Thomson, ela podia dizer que sua infelicidade começou quando foi abandonada pela mãe. A sorte também não parecia simpatizar muito com ela, era criada pelo pai e uma madrasta que a odiava. O mundo...