Capítulo IX

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  Minha meta nos últimos dias era evitar Diego a todo custo, eu saia primeiro da sala, não estava indo para biblioteca pois sabia que lá ele poderia aparecer, também sabia que em público ele não falaria comigo, isso também ajudava bastante. Consegui evitar Diego por três longos dias, mas então na sexta-feira, quando eu tinha acabado de me despedir de Denise e estava prestes a ir embora, Diego dobrou no corredor.
  Virei-me o mais rápido que pude e entrei no banheiro feminino que ficava bem em frente onde eu estava. Estava torcendo para que ele não tivesse me visto quando ouvi duas batidas na porta.
  - Eu sei que tá aí. - disse ele - Quero conversar com você, Katherina.
  Fiquei calada, o coração pulava com a adrenalina e outra coisa que eu preferia ignorar.
  - Sério? Não vai responder? Dá para parar de bancar a criança? - ele esperou um minuto inteiro, já achava que ele tinha ido embora quando ele voltou a falar - Tudo bem, então eu vou ficar aqui na porta até você sair, não pode ficar para sempre trancada no banheiro!
  Porque pelo menos uma vez na vida a sorte não andava comigo?
  Eu não podia fugir dele para sempre, ainda precisava dar aulas para ele, o problema é que eu não sabia o que dizer, nem como agir. Três dias pensando, minha mente imaginou várias vezes essa cena e eu não tinha a mínima ideia do que fazer. Só sabia que não podia ficar ali para sempre.
  Respirei fundo e então abri a porta.
  - O que você quer? - perguntei.
  - Eu quero saber porquê está me evitando. - disse ele.
  - Te evitando? Eu não tô te evitando. - resolvi que negar, negar e negar era a melhor solução.
  Ele riu e cruzou os braços.
  - Não? E como se chama o que você está fazendo comigo?
  - Eu não fiz nada. Não sei do que está falando e sobre o que quer conversar? Se é sobre as aulas...
  - Sabe que não é sobre isso que quero falar. - me interrompeu ele - Quero saber porquê saiu daquele jeito da minha casa, eu não entendi nada do que você falou...
  - Eu não quero falar sobre isso.
  - Há um problema então, porque eu quero falar sobre isso.
  - Por que a insistência nesse assunto?
  - Quero saber o que fiz errado.
  - Vai mesmo falar sobre isso?
  - Sim, vou. Você me deixou te beijar e depois...
  Eu tampei a boca dele com minha mão e o lancei um olhar repreendendor.
  - Aqui não é o lugar adequado para falar, as paredes tem ouvidos.
  - Você tem razão. - disse ele - Vamos para algum lugar.
  - Juntos? Sabe que ficaria mal sermos vistos juntos...Então...
  - Me diga um lugar que eu vou te encontrar.
  Eu não me livraria dele tão fácil.
  - Certo.
  Abri minha mochila, arranquei uma folha do bloco de anotações e anotei o endereço da lanchonete que eu considerava meu refúgio. Ao menos lá eu sabia que ninguém nos veria.
  - Tome. - entreguei a ele - Agora preciso ir.
 
  Dez minutos depois que eu tinha chegado na lanchonete vi Diego entrando, ele me avistou, caminhou até mim e sentou-se ao meu lado.
  - Pode começar a se explicar. - disse ele.
  - Porque eu que tenho que me explicar? Foi você que ficou me olhando daquele jeito e me provocando...
  - O que quer dizer com isso?
  - Que foi um impulso de nós dois. O que não entendo é porquê me beijou.
  - Te beijei porquê quis beijar. E você me deu permissão. Lembra?
  - Estava fora de mim.
  - Fora de si?
  - Aquele beijo não devia ter acontecido. Esse é o ponto. Por isso pedi para esquecer, e foi por me dá conta disso que sai correndo da sua casa naquele dia. E não adianta me olhar assim, eu sei que aquele beijo não significou nada para você.
  Ele me encarou.
  - Por que acha isso?
  - Quer mesmo que eu te diga?
  - Sim, eu quero.
  - Você é um mulherengo. Já ficou com as garotas mais lindas da escola, com várias garotas, então me diz porquê eu acharia que comigo seria diferente? Se pelo que eu soube você nunca se prendeu a ninguém.
  Ele ficou calado.
  - Obrigada por não tentar desmentir. - disse eu - Acho que agora tá tudo mais que esclarecido.
  Eu fiz menção de levantar, mas Diego estendeu seu braço e segurou o meu.
  - Espere. - disse ele.
  - O quê?
  - Tenho uma pergunta para você.
  - Então pergunta.
  - Prometa que será honesta.
  - Por que acha que eu ia mentir?
  - Prometa.
  Revirei os olhos mas falei:
  - Tá, eu prometo. Agora pergunta logo.
  - O beijo significou algo para você?
  Aquela com certeza era uma pergunta para qual eu não estava preparada, senti a muralha que criei de alto confiança e calma ameaçar cair. Como é que eu diria a ele que foi mais especial do que achava que seria, que não consegui passar um só dia sem repassar aquele beijo em minha mente - quando eu mesma queria esquecer o beijo - como eu diria que ultimamente ouvir seu nome ou vê-lo fazia meu coração acelerar e sentir um frio na barriga. Eu não diria. Mas prometi honestidade, e levava muito a sério minhas promessas. Então fui sincera:
  - Significou. Foi meu primeiro beijo e eu sonhava com esse momento há anos. Então é claro que significou, mas estou determinada a esquecer. Passar uma borracha e continuar de onde estávamos antes do episódio B.
  - Episódio B?
  - Você sabe o que quis dizer.
  Ele apesar de tentar manter a expressão de seriedade deixava óbvio que prendia uma risada.
  - Vamos fazer do seu jeito, nada sobre o "episódio B", nada daquele momento, já esqueci, viu só? - disse ele.
  - Diego.
  - O quê?
  - Por que queria saber se significou ou não? - perguntei. Sabia que devia ter me contido, mas a curiosidade - como sempre - falou mais alto.
  - O que significou o quê? - agora ele estava sendo sarcástico.
  - Para de palhaçada.
  - Lembrando que o plano de esquecer foi seu. Me desculpe se sou ótimo nisso, mas se quiser pode refrescar minha memória.
  Eu preferia engolir minha curiosidade, pois maior que ela só meu orgulho e eu não daria o gostinho para ele de me ver falar sobre o beijo de novo.
  - Já que é excelente em esquecer, esquece também o que te perguntei.
  - Claro. Como quiser.
  Ficamos nos encarando em silêncio, o fato dele ter escolhido sentar ao meu lado do que a minha frente me deixava nervosa. E ele parecia se divertir com tudo isso.
  - O que vão querer? - disse o garçom acabando com o silêncio. Agora nós dois encaramos o garçom.
  - Quero donuts para viagem. - falei - Dois, um com cobertura de chocolate e o outro...De chocolate também.
  Ele me lançou um sorriso.
  - E eu quero uma porção de batatas fritas. Para viagem.  - disse Diego tirando a atenção do garçom de mim.
  O garçom anotou.
  - Já volto com os pedidos.
  Ele se afastou.
  - Vem muito aqui? - perguntou Diego.
  - Hum? Ah, sim. Venho.
  - Eu não conhecia esse lugar.
  - Não?
  - Não.
  - Acho que é por isso que gosto daqui. - falei.
  - Por que eu não conhecia o lugar?
  - Não, seu tonto. - eu ri - Pelo fato da maior parte das pessoas da escola não frequentarem aqui.
  - Entendo.
  Eu encarei minhas mãos apoiadas na mesa. Depois voltei a encará-lo.
  - Você não entende. - falei - Tenho certeza que nunca foi humilhado e ofendido, que as pessoas não passam e colocam o pé para você tropeçar, nem te xingam, ou te maltratam. Eu sou feia, e as pessoas me julgam por minha aparência, elas nem sequer se dão o trabalho de me conhecer.
  - Sinto muito, Katherina. Você tem razão, eu não sei o que é passar por isso. Mas eu posso imaginar.
  Lhe dei um sorriso em agradecimento.
  O garçom voltou com nossos pedidos. Pagamos a conta e saímos.
  - Tenho que voltar para escola, preciso treinar. - disse Diego.
  - Eu...Tenho umas coisas para fazer também. Então...Se quiser amanhã posso passar em sua casa e te dar aula.
  - Claro que quero.
  - Então até amanhã.
  - Até.
  Ele me lançou um sorriso, virou-se e começou a caminhar, fiquei observando ele se afastar, assim que ele virou a esquina eu comecei a trilhar meu caminho.
 

 
 
 
 
 
  
 
 
 

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