Amor Merecedor

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 "Na vida, meu neto, haverá dias de sol e dias de chuva. Não se pode escolher o que enfrentar em cada amanhecer, não está em nossas mãos, não temos esse poder, mas devemos estar preparados e saber como reagir. Nem tudo será trevas e nem tudo será luz. Tempos ruins passam, lute e não desista. Quando você menos esperar, você vai vencer, meu pequeno arqueiro". Em cada momento em que meu chão pareceu sumir de abaixo dos meus pés, aquelas palavras de Granny ressoavam em meu ouvido como se ela as estivesse acabado de dizer.

Aprendi a lidar com dificuldades e problemas de adultos prematuramente, tentei pegar para mim todas as dores de minha mãe e meus irmãos. Não queria ver minha família sofrendo pelo abandono intempestivo do homem que deveria zelar por nós. George se foi sem olhar para trás, sem se importar com os corações partidos e os choros que provocava. Sua ausência acabou transformando-se em peso em meus ombros, como um fardo carregado em silêncio. Crescer e amadurecer com apenas dez anos era necessário. Ava não precisaria se preocupar comigo com meu sofrimento ou bem-estar, eu seria forte por ela.

Porém, haviam instantes onde eu não conseguia mais fingir felicidade ou fortaleza. Eram momentos em que eu me permitia cair, sofrer e chorar, onde eu voltava a me sentir a criança que era e corria para os braços protetores da minha avó. Granny sempre esteve presente para me acolher em seu colo e me acalmar acariciando meus cabelos. Seu apoio às vezes vinha em forma de palavras, às vezes como silêncio e outras vezes também vinha por meio de uma xícara quente de leite e canela.

Foi esse mesmo conforto que quis proporcionar ao meu amor naquela noite na cozinha.

Já haviam se passado três dias desde então. Três dias e três noites desde quando testemunhei a mulher da minha vida chegar ao seu limite e explodir para o meu desespero. Ainda me culpo por não ter imaginado as possíveis consequências da minha brincadeira imatura, eu apenas queria vê-la rir, distrair o meu anjo da complicada situação que nos envolvia. Porém, piorei tudo. Em silêncio, vi Regina chorar, tremer, respirar com dificuldades e se afastar para longe de mim. Um buraco se formou em peito como se meu próprio coração tivesse sido arrancado e despedaçado com a dor dela, eu daria tudo, qualquer coisa que fosse, para que ela não sofresse daquela maneira.

Não me recordo quando tempo durou a crise, minha cronologia perdeu-se em meio a minha aflição por não poder ajuda-la. Podem ter sido minutos, mas pareceram eras. Eternidades de trevas. Presenciei meu amor passando pelos mesmos sintomas que eu já havia passado nos meus dias mais sombrios, e pode parecer uma fala egocêntrica da minha parte, mas testemunhar aquela cena com uma pessoa amada, sabendo da minha impotência em resolver o problema, era cruel demais. Como eu poderia ajudá-la a não sentir aquilo se ela fugiu para longe? Isolou-se em sua própria bolha de sofrimento.

Foi quando parei e percebi. Eu não podia impedir Regina de sentir, não podia tentar controlar seus sentimentos só porque me destruía vê-la daquele jeito. Eu não era o centro da questão, meu amor era. O que não significava que eu a abandonaria para que ela enfrentasse seus demônios sozinha. Amar é estar presente na alegria e na tristeza.

A vida, como Granny sabiamente disse quando eu era criança, não é feita somente de luz como não é feita somente de trevas. Não podemos controlar o que nos afeta, porém temos o poder de controlar como aquilo nos afeta, essa é a verdadeira chave para tudo.

Quando Marian morreu, naquela noite chuvosa, eu não me permiti sentir luto, apenas ódio. Em meu peito, meu coração estava despedaçado, mas minha mente tentou se concentrar em apenas odiar a pessoa que provocou aquela tragédia e me vingar dele, nem que fosse a última coisa que eu fizesse. Daniel deveria pagar por tê-la matado e naquela noite chuvosa, eu me prometi fazer justiça, nem que esta fosse com minhas próprias mãos.

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