Vontade de voltar

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Filós nada tranquilamente, parece não se importar com meu peso sobre o seu, observo o máximo que consigo, mas confesso que passei boa parte do caminho preocupada em não cair, vejo algo inacreditável quando retorno minha atenção para o percurso percorrido pelo pequeno golfinho, é uma cidade, ele está me levando para uma cidade,  uma sociedade inteira em baixo d'água, como se tivesse sido submergida pela água e dado espaço para o desenvolvimento de todas as espécies possíveis. Ou talvez o mar abraçou aquilo que não o pertencia e fez com que fizesse parte dele.

- Uau _ Deixo escapar demonstrando minha admiração.

Conforme adentramos a cidade, vão se aproximando sereias e tritões gradativamente, todos estão curiosos, analisam cada parte minha milimetricamente, em seus olhares possui uma mistura de interesse e estranhamento, estão me rodeando por um bom tempo, seus movimentos me deixam tonta.

- É ela mesmo? _ Pergunta alguém no meio da aglomeração.

- Eu, o quê? _ Pergunto esperando uma resposta, mas a única coisa que me retribuem são olhares interrogativos e me sinto uma invasora.

O silêncio permanece por longos minutos e tenho vontade de nadar para longe, se pudesse, é claro, a situação está desconfortável, para minha sorte uma sereia de pele escura e cauda acinzentada quebra o silêncio constrangedor.  

- Você é a filha de Poseidon?_ Soa simpática mas percebo o seu desconforto.

- Sou sim._ Poderia dar uma resposta mais elaborada, porém não sei se é seguro falar e nem se deveria ter sido sincera.

- Vem, eu vou te mostrar tudo aqui, você vai amar, aqui é o melhor lugar que vai conhecer em toda sua vida._ Respiro aliviada ao ver sua empolgação.

Meses depois...

- Filós, oooh Filós, onde você se meteu pequeno?_ Grito em busca do golfinho que não vejo a mais de vinte minutos.

Estávamos nadando um pouco além da área segura, costumamos fazer isso para explorar mais o mar e para ver se os demais estão em segurança. A água se movimenta, vejo  meu companheiro passar por trás de mim em alta velocidade.  Ele se tornou um excelente amigo, mas não consigo acompanhar o seu ritmo incansável de brincadeiras e energia. 

- Filós, não podemos brincar agora meu pequeno, temos que ir para o  encontro dos seres do mar. _ Detesto negar atenção a ele, mas temos compromisso.

Ele se aproxima todo tristonho e se aconchega em minha cauda...

- Não fique assim, você se esqueceu que sinto tudo o que sente? E te ver assim me parte o coração, pois os seus sentimentos é uma das únicas coisas que eu sinto. _ Sou honesta com ele, pois sua amizade é importante para mim. Faço carinho nele e depois abraço-o.

- Quem chegar por último vai dormir nas pedras, VAMOS! _ Nado em disparada, com o objetivo de chegar primeiro no local onde ocorrerá o encontro. Ele se anima e vem rapidamente.

Minutos mais tarde...

- Você está atrasada Merlia! _ Fala Jade arrumando o cabelo, ela é minha amiga, porém ás vezes age como se fosse minha mãe.

- Me desculpa, tive um pequeno probleminha com o Filós. _ Digo dando um sorriso para tentar amenizar a bronca que ela certamente vai me dar.

- Você perdeu a parte de cuidados e a vitalização das algas._ Não acredito que perdi o mais importante.

- Ah sério? Essa é uma das partes mais importante e legal _ Fico chateada por ter perdido a etapa que mais gosto. Na próxima não posso perder.

- Chegue no horário da próxima vez que não irá perder nada!_ Diz rabugenta.

- Nossa, alivia aí_ Hoje ela está mais mal humorada do que o normal.

- Vamos, temos que falar com todos!_ Me puxa para a reunião.

Entramos no meio da multidão, falamos com diversas espécies, esclarecemos dúvidas, dançamos e cumprimos as atividades programadas do encontro. Eu amo tanto esse lugar, amo esses encontros, é completamente perfeito. Parece que a punição dos deuses não abrangem os domínios de meu pai.  Me distraio e quando dou conta não estou mais no meio da multidão.

- Aahh, um pouco de espaço. _ Faço um circulo na água e estico meu corpo. Essas reuniões são cansativas.

Olho para cima e algo me invade, acho que é curiosidade ou saudade, não sei ao certo o que é, só sei que sinto uma imensa vontade de ir para superfície, de ver como está a humanidade. Desde quando me transformei em sereia não fui  a superfície e nem toquei  no nome dos deuses ou dos humanos, evito ao máximo falar sobre isso com as outras sereias. Prefiro preservar qualquer sofrimento ou reviver as lembranças que ainda me afetam. 

Travo uma briga interna contra minha razão e minha curiosidade, sem pensar duas vezes nado em direção a superfície e respiro fundo. O ar invade meu nariz indo para meus pulmões e os sinto queimar. 

-Nossa, tinha me esquecido de como era ficar aqui em cima.

Admiro o céu, o sol, as nuvens, toda a paisagem que meus olhos conseguem captar, não tinha percebido o quanto precisava disso até estar aqui, estou me adaptando a minha nova vida, mas não posso negar que tenho vontade de voltar.

- Estou longe da terra firme, quero ir para a praia.

- Estou longe da terra firme, quero ir para a praia

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Obrigada por estar aqui, boa leitura!


Sereia GregaOnde histórias criam vida. Descubra agora