CAPÍTULO 27

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Termino de colocar a mesa do café. Vou até o pé da escada e chamo os meninos que já estão atrasados mais uma vez.

— Helena e Júnior se apressem!

Volto para a cozinha e encho minha xícara de café pela segunda vez no dia. Sei que estou com olheiras e que o aspecto cansado e cada linha de expressão do meu rosto denuncia a noite terrível que passei.

Os pesadelos me fizeram encharcar o lençol da cama de suor e lágrimas, e sei que cheguei a gritar algumas vezes. Sorte que os meninos dormem feito uma pedra, e não me ouviram.

Júnior entra na cozinha, com a mochila pendendo no ombro e se aproxima, beijando o topo da minha cabeça.

— Bom dia, mãe.

— Bom dia querido — respondo, evitando olhar diretamente para ele — Quer que te faça algo mais?

Ele ergue a sobrancelha grossa e diz apontando para a mesa que está com comida posta para no mínimo cinco pessoas:

— Algo mais?

Dou de ombros e dou outro gole no café fumegante.

Ele deixa a mochila escorregar para o chão, e se senta. Pega a jarra de suco de laranja e enche seu copo. Então, como se estivesse comentando sobre o tempo, ele segura uma torrada e enquanto passa geleia de morango, a sua preferida, diz sem me olhar nos olhos:

— Vai me contar o que houve?

Dou outro gole e seguro mais firmemente a xícara com as duas mãos.

— Não houve nada. Do que você está falando?

Ele me olha atentamente. E não pela primeira vez, me surpreendo com a maturidade que vejo no seu olhar. Quando foi que meu menino tornou-se um homem? Indago mentalmente.

— Tive pesadelos — conto — e perdi o sono. — completo.

Ele morde a torrada, toma um gole do suco, e só então me olha.

— Ouvi seus gritos, mãezinha.

— Foram pesadelos. Apenas isso. — retruco.

Ele assente e continua comendo em silêncio. Helena entra na cozinha, e vem em minha direção e me beija no rosto desejando um bom dia. Vai até o sofá da sala, e deixa lá sua mochila, mas traz o celular consigo para a mesa.

— Nem pensar mocinha. Nada de usar o celular na mesa.

Ela revira os olhos e volta para guardar o aparelho. Então, senta-se e olha para a mesa, mas ao contrário do Júnior, indaga me olhando:

— O que foi mãe?

— O que foi o quê?

Outra revirada nos olhos, e enquanto enche o copo de suco, ela diz:

— Você só cozinha feito uma louca quando algo a perturba. O que foi? — repete a pergunta.

— Não é da sua conta sua pirralha — responde o Júnior.

Ela nem mesmo pisca. Ignorando-o totalmente, diz:

— Ficou triste porque convidei a vovó Dália para a inauguração?

— Logo vi que tinha um dedo seu nisso. — diz o Júnior com raiva — Porra Helena, você é idiota ou o quê?

Quando ela vai abrir a boca para refutar, eu me intrometo. Já os conheço bem o suficiente que vão discutir por muito tempo se deixar essa conversa se prolongar.

O Silêncio da AlmaOnde histórias criam vida. Descubra agora