Capítulo 31

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Olho o relógio e suspiro aliviada por constatar que ainda tenho um tempinho para voltar ao restaurante. Como sempre, o movimento durante o almoço foi mais ameno, e os preparativos para o jantar, só começam por volta das dezessete horas.

Estaciono no shopping próximo ao restaurante e aproveito para dar uma volta. É incrível como isso agora é algo tão comum. Sair sem precisar dar satisfação dos meus passos para ninguém.

Estou concentrada olhando uma vitrine, quando ouço um pigarro às minhas costas. Viro-me e dou de cara com o Ricardo, com os braços cheios de sacolas.

Confusa, o encaro e vejo seu sorriso torto se abrir.

— Não é o que você está pensando — ele diz de chofre. — São da minha irmã. — E indica a moça loira com um bebê no colo no interior da loja.

Sorrio para ele e ele sorri de volta. E ficamos assim. Por alguns segundos, nos olhando nos olhos e o sorriso vai morrendo lentamente quando nossos corpos reagem tão naturalmente a presença um do outro. Sinto algo estranho acontecer dentro de mim, uma emoção e uma excitação que não sei de onde vem. Nossos olhos travam-se um no outro e eu vejo que o que sinto é totalmente recíproco. Então, a verdade surge: estou apaixonada por esse homem.

— Marina... seria muito estranho se eu dissesse que não conseguirei passar nem mais um segundo sem te beijar?

Baixo a cabeça e sorrio.

Ele pigarreia de novo.

— Meu Deus, tem horas que me sinto patético!

— Patético?

Ele assente e emenda:

— De tão apaixonado que estou.

Então, dou um passo em sua direção e ficando na ponta dos pés, encosto minha boca na dele. Era para ser apenas um selinho, mas, então, com a mão livre, ele segura minha nuca e me beija verdadeiramente na frente de todos.

Ainda com as pernas trêmulas, me afasto constrangida. Sei que estou ruborizada, e o Ricardo parece feliz como alguém que acabou de ganhar um presente muito valioso.

— Acho que precisamos nos controlar. Estamos parecendo dois adolescentes apaixonados — falo com um sorriso que se recusa a sair dos meus lábios.

— Não sei você, Marina, mas é exatamente assim que me sinto.

Nunca fui boa de falar de sentimentos. Declarações de amor e gestos de carinhos são algo raro nos meus dias. Por um momento, tento absorver toda a diferença que é esta relação que estou iniciando com a que tive durante praticamente toda a minha vida. Depois que nos casamos, o Pedro nunca, absolutamente nunca, se declarou para mim. Durante o sexo, ele até costumava ser mais carinhoso, mas declarações de amor não eram definitivamente uma constante. Então, ver o Ricardo admitir calmamente que está apaixonado por mim, sem nenhum pudor ou reserva, faz com que algo brote do fundo da minha alma: gratidão à vida por me proporcionar viver isso.

Para disfarçar a emoção, eu resolvo agir por impulso e faço um convite especial:

— Então, tem planos para hoje à noite?

Ele ergue a sobrancelha e sorri.

— Na verdade, tenho.

Tento não demonstrar a decepção que sinto, então sorrio brevemente e desvio os olhos dos dele.

— Não quer saber qual o compromisso?

Dou de ombros.

— Não gosto de parecer curiosa.

O Silêncio da AlmaOnde histórias criam vida. Descubra agora