CAPÍTULO QUATRO

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Dias atuais

Estou distraída mexendo o bolo de laranja na minha cozinha ampla e arejada. O silêncio é um balsamo para o turbilhão de pensamentos que tomam conta da minha cabeça. Cozinhar é minha terapia.

O Pedro finalmente viajou a trabalho. Não sei se é correto sentir tanto alivio, mesmo sabendo dos riscos que a sua missão o coloca. O exército brasileiro enviou um contingente de homens para atuar no Haiti. O país foi praticamente exterminado devido alguns terremotos. Desde o dia que ele me contou da possibilidade da viagem, que comecei a pedir a Deus para que se isso se concretizasse. Eu sei que isso não está correto, mas simplesmente não consigo evitar a sensação de alivio que sinto ao saber que passarei alguns meses livre. Absolutamente livre.

— Mãe?

Assustada, ergo os olhos para encontrar os olhos da minha filha, Helena. Ela está parada no meio da cozinha, com suas calças jeans rasgada e com a blusa do uniforme da escola. Segura o celular em uma das mãos, e com a outra a alça da mochila pesada. Helena tem treze anos, e tem uma personalidade completamente diferente da do Pedro, meu filho mais velho. Ela simplesmente é uma idealista. Luta por tudo que acredita e não baixa a cabeça ou se cala, até ser ouvida. Apesar da sua personalidade forte, é alguém muito generosa e fiel aos seus sentimentos. Tenho um orgulho absurdo das pessoas que meus filhos estão se tornando, apesar de terem convivido a vida inteira em um lar que não foi exatamente um modelo de calma e tranquilidade, penso com desgosto.

— Oi querida — respondo.

— Você deveria se olhar no espelho quando ele não está por perto. Parece que rejuvenesce uns vinte anos.— um suspiro de pesar — amo o papai, mas você não o ama mais, então porque simplesmente não diz isso a ele e vai viver sua vida?

— Helena! — repreendo com suavidade.

— Desculpa mãe, mas é que não faz nem mesmo quarenta e oito horas que ele partiu e você já está com outra cara.

— Estou preocupada com ele — minto.

— Eu sei que está — ela diz e completa — mas não está com saudade, não é? E não é saudade que se deve sentir?

Sorrio com o discurso maduro da minha pequena guerreira.

— Filha, eu estou sim com saudade do seu pai.

Ela ergue uma sobrancelha e diz:

— Mãe, sou uma adolescente, não uma retardada.

— Helena!

Ela dá de ombros e diz:

— Desculpa mãe, você deve saber o que faz.--- muda o peso de um pé para outro e diz — Queria te pedir para a Mila dormir aqui hoje.

— A Mila? Novamente Helena?

— Mãe, precisamos terminar um trabalho de Geografia.

Ergo uma sobrancelha e ela sorri.

— Ok, não vou mentir para você — diz — Queremos terminar de assistir a nossa série. Por favor, mãe?!! — pede.

— Ok Helena, mas será a última vez esta semana. Não sei como a mãe da Mila não se incomoda dela passar praticamente todas as noites fora de casa.

Ela sorri e diz:

— Quanto exagero, Mãe.

— Exagero? Sei.

O Silêncio da AlmaOnde histórias criam vida. Descubra agora