Capítulo 29

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"Libertar-se dos grilhões pode deixar

cicatrizes capazes de fazer,

mesmo com o passar do tempo,

a ferida latejar."

Duas semanas depois...

— Vamos, Helena, estamos atrasadas! — chamo ao pé da escada enquanto guardo minha agenda na bolsa.

Ela desce apressada as escadas.

— Calma, mãe, ainda temos tempo.

— Na verdade, teremos sorte se conseguirmos chegar antes do início da partida.

— Não exagera, dona Marina! O jogo só começa às oito.

— Ainda tenho que achar um estacionamento. — Entro no carro, e jogo minha bolsa no banco de trás enquanto a Helena se acomoda no banco do carona. — Ou acha que as vagas estarão lá me esperando prontamente?

Helena coloca o cinto e diz com o sorriso confiante:

— Vai dar tudo certo. O babaca do Júnior vai arrebentar. Relaxa.

Manobro o carro, e saio para a rua tranquila.

— Estou com muito medo que ele não consiga — confesso. — Essa é a sua grande chance.

Sem desgrudar os olhos do celular, ela diz:

— Vamos lá, mãe, um pouco mais de confiança! Vai dar tudo certo!

Pegamos a via expressa e seguimos para o estádio onde o Júnior jogará sua primeira partida profissional. Ainda é difícil acreditar que ele foi escolhido por um olheiro e agora faz parte de um dos times de basquete mais atuantes do Brasil.

Conforme Helena previu, chegamos a tempo e não tive nenhum problema para estacionar. Quando estou saindo do carro, o celular toca. Vejo o nome da Bruna no visor e atendo prontamente:

— Bru, algum problema aí?

Relaxa, mulher! Chega a ser ofensivo a forma como você desacredita nos meus talentos culinários.

Estaco no lugar.

— Bruna, você não sabe cozinhar. Saia já da minha cozinha!

A risada é estrondosa do outro lado. Posso ouvir a gargalhada do Igor e sorrio.

— Você é ridícula, sabia?

Já chegou? — Ouço-a falando com a Cris e sinto um aperto no peito por deixá-las só em pleno sábado, mas nada me faria perder a primeira partida oficial do Júnior.

— Acabamos de chegar. Vou entrar, te ligo daqui a pouco.

Se conseguir falar com ele, diz que a tia Bru mandou um abraço bem apertado!

Sorrio. O amor entre a minha irmã e meus filhos é algo absurdamente forte e recíproco.

— Pode deixar. Falo sim. — Desligo o celular e jogo dentro da bolsa.

Seguimos então para a área destinada às famílias dos jogadores. Não chega bem a ser um camarote, mas é um espaço com uma excelente visibilidade da quadra. Quando estamos prestes a nos acomodar no assento destinado a nós duas, estaco estupefata. O Pedro está tranquilamente acomodado na cadeira ao lado onde seria a minha. Sinto vontade de dar meia volta, mas não posso fazer isso com o meu filho. Então, troco de lugar com a Helena que me olha ressabiada e, pela primeira vez na noite, eu vejo que ela sabia que ele estaria aqui. Ela desvia os olhos dos meus e abraça o pai, que a cumprimenta com um abraço desajeitado.

O Silêncio da AlmaOnde histórias criam vida. Descubra agora