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Santa Cruz é um reino de terras mornas, localizado ao centro do Novo Mundo. Grandes crateras laterais sugavam tudo para a morte, e homens sanguinários lançavam suas presas nos abismos que circulavam as cordilheiras. Um grande rio descia na cachoeira de Thális, ao norte, atravessando todo o reino e morrendo no mar da Divisa.

Ao sul, as terras da Costa eram compostas por escombros e solidão, tornando-as lar de feras, bestas, e cavernas. Do centro para o norte, a prosperidade ganhava proporções, e as terras tornavam-se prósperas. Grandes campos, gado, cavalos e colheitas de todos os tipos. Um belo castelo predominava ao centro, e desenhava bem os seus contornos medievais. Não possuía um comércio tão rico e farto como Porto Belo e Emiliano, porém muitos mercadores perambulavam em busca de barganhas. Casas de pedras, com telhados de palhas, espalhavam-se por toda a região, e era comum a presença de pequenos vilarejos separados por quilômetros de distância. Os cidadãos eram acolhedores, e não tinham apreciação ao império, devido ao passado, mas também não adoravam a Deus como em Thális e Líliam, sentindo apenas uma pequena admiração pela causa.

Radamés conhecia uma entrada secreta para Thális, e precisavam passar por Santa Cruz, e enfim eles chegaram num dos vilarejos nas terras ao centro.

– Onde estamos? – Urias perguntou.

– Este é o vilarejo de Santa Ana. É o primeiro das terras de Santa Cruz. Teremos muitos dias pela frente, e precisaremos descansar.

– Há algum lugar?

Radamés apontou uma casa e dela saiu uma mulher pequena, arisca e nervosa. Ela gritava:

– Seu vagabundo, sem vergonha!

– Potchila! – sorriu Radamés ao vê-la.

Eles assustaram-se.

A mulher de cabelos vermelhos longos e enrolados gritava como louca, segurando uma vassoura em sua mão, pronta a atacá-lo:

– Onde você esteve? Me deixou aqui sozinha! Estava com outras mulheres? Cachorro!

– Meu amore! Sabe que meu coração só bate por ti!

Ela o espancava.

– Nunca te trocaria amore!

– Mentiroso!

– É verdade, minha potranca! Cada dia que passei longe, meu coração chamava por você... – ele a agarrou em seus braços.

– Você é um sem vergonha... – ela foi acalmando-se.

– Minha sem-vergonhice é desejá-la noite e dia.

– Jura? – ela sorriu.

Débora achava tudo muito engraçado e fofo. Urias e Baldur estavam abobados.

– Claro Potchila! Eu te amo!

Ela o agarrou pela roupa e se beijaram loucamente.

– Hum! – pigarreou Urias.

A mulher ficou desajeitada. Não havia reparado a presença deles, e sorriu, olhando-os de cima a baixo.

– Quem são?

– Amigos! E estamos com fome! – respondeu.

– Entrem! – ela os convidou e Radamés a seguia, beliscando sua popa, e ela pulava, disfarçando sua euforia.

Ela colocou sobre a mesa um belo assado, e eles devoraram rapidamente. Depois, Urias e seu grupo se jogaram pelo chão, para descansar a longa caminhada.

Tarde da noite, Urias perdeu o sono, pensando em Rebecca, e seu coração sofria, temendo o pior. Ele saiu e sentou-se em uma pedra para meditar. Débora também estava acordada, e o seguiu.

– Perdeu o sono? – perguntou ela.

– Dormi por quase um dia inteiro.

– Posso? – ela apontou a pedra ao lado.

– Claro...

Ela ajeitou-se e falou:

– Deve ser difícil para você esse momento...

– Meu pai foi um grande homem. Religioso, perseverante, precavido em tudo.

– Deveria ter muito orgulho de você.

– Não era do tipo que falava...

– Sinto muito... – Débora ficou um pouco desajeitada, e continuou: – E quanto a Rebecca?

– Estávamos preparando nosso casamento. Ela estava tão feliz...

Débora aguou-se e comentou.

– Parece que sempre cuidou bem dela.

– Ela é incrível!

– E vejo que realmente a ama.

– Mais do que tudo nessa vida. E farei qualquer coisa para salvá-la.

– É exatamente o que se faz quando ama... – ela embaralhou-se.

– O que disse?

Um forte som de objetos caindo e quebrando soou, vindo de um celeiro de madeira, e chamou a atenção deles. Eles entreolharam-se assustados e correram até o local, pegando suas armas, e num rápido golpe, Urias abriu o portão.

– Desculpe! Eu não sabia... – gaguejou Urias, vendo Radamés e Potchila nus, deitados ao chão, e tudo derrubado ao redor.

– Te devo a vida, não a minha virilidade! – Radamés fechou a porta rapidamente, e Débora caiu em gargalhada, vendo Urias desconcertado.

– Há! Você precisa ver a sua cara agora! – ela debochava.

– E você ri?

– Ai, desculpe! Não dá pra segurar! Há! Há! Há!

– Gosta de rir, é?! – ele começou a fazer cócegas nela.

– Pare com isso! Há! Há! Há! Pare! Há! Há! Há!

Ele a abraçou, e seus olhos juntaram-se por um instante, e rapidamente a soltou, e ela abaixou sua cabeça.

– Melhor entramos! – ele sugeriu.

– Melhor...

Na manhã seguinte, Urias ainda desajeitado aguardava Radamés ao lado de fora e Débora continuava a rir discretamente. Baldur nada entendia.

Radamés segurou Potchila nos braços, e despediu-se:

– Voltarei para ti, amore!

– Estarei esperando! – Ela fechou seu semblante instantaneamente e recordou: – Quer dizer... Se você se atrever a desaparecer de novo... Ah! Radamés! Eu taco fogo em você e corto o seu...

Baldur arregalou os olhos e Débora continuava a rir.

– Em nenhum lugar desse reino eu poderia encontrar uma única flor que tenha o teu cheiro, amore!

– Ai, Radamés... – Ela desmanchou-se.

– Hei! Dom Juan! Precisamos ir! – reclamou Urias.

– Até breve minha Rosa!

Eles retornaram a caminhada, e Radamés curioso perguntou:

– Quem é Dom Juan?

Depois do Mundo ★ Livro 1 [FANTASIA/FIM DO MUNDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora