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A aflição de Elimar estava nítida debaixo do manto que o protegia do forte vento, e seus olhos não desgrudavam do horizonte. Ele examinava cada canto que conseguia enxergar, cada cor diferente que reluzisse no completo branco, trazendo a inércia de seu rosto à mórbida paisagem da Antártida. Não se movia, não comia, não falava, apenas de pé sobre o convés, esperançoso de que seu amigo indicasse um sinal a qualquer momento. A angústia conversava com o jovem príncipe, e por horas eles debateram a verdade, ainda que oculta a ambos, mas ele tinha a certeza que a venceria, quando menos esperasse, encerraria aquela conversa.

– Ele está lá há horas! – comentou Dinho, protegendo-se do frio que teimava invadir a cabine.

Islo, Dinho, Felipe, Nick e Elimar foram os que restaram daquela jornada. Os demais haviam sido devorados, e alguns estavam desaparecidos, provavelmente devorados pelas alcateias.

– Ele não desistirá... – comentou Felipe. – Eu o conheço bem.

– Eles nunca desistem... – completou Nick. – Esse pouco tempo que estou com eles, aprendi muito sobre a amizade e companheirismo. Eles são uma família, e são capazes de dar suas vidas um pelo outro.

– Ele parece um bebezão, um meninão, mas no fundo é um grande homem – continuou Felipe. – Arriscou sua pele por mim muitas vezes. Eu sei que eu não queria vim... Mas não foi por causa dele.

– Ele sabe. Não se preocupe! – finalizou Nick.

Elimar continuava a mirar o horizonte, buscando algum sinal de seu amigo e às vezes levantava o casaco, vendo o Alcor enrolado em sua cintura, vendo nele uma esperança.

– Se o Mago não aparecer até o amanhecer, teremos que partir! – comentou Islo, sentando ao canto.

– Não podemos deixá-lo! – Nick o reprovou.

– Não temos alimentos suficiente! – justificou.

– A gente poderia pescar!

– Aqui é a Antártida, menina! Não é Emiliano!

– Mas você disse que vem aqui caçar!

– Não nesta área!

– Então não conhece bem este local?

– Não...

– Então não pode afirmar que não há peixes!

– Ela tem razão – concordou Dinho.

Islo assentiu:

– Está bem! Avise Elimar!

Nick sorriu, e saindo da cabine, encontrou vazio o local onde Elimar estava. Ela o procurou, e retornou apressada.

– Ele sumiu!

– O quê? – Felipe correu até o convés, e não o encontrou.

– Vejam! – Dinho apontou para longe, em solo, e Elimar caminhava já há grande distância, dentro de uma tempestade que se formava.

Nick sorriu e comentou:

– É por isso que ele é o melhor!

Elimar seguiu pela tempestade, e caminhada se tornava cada vez mais densa por causa da altura da neve, e seus pés atolavam, diminuindo sua velocidade. Seguindo ele para um ponto mais ao extremo, um Maraghor o avistou e correu em sua direção, faminto e raivoso. Elimar deu de ombros e continuou a caminhar. O animal se apressava em abocanhá-lo por trás, e Elimar seguia normalmente, olhando para cada canto ou novo caminho, focando em pistas de seu amigo. Maraghor saltou para atacá-lo, e num golpe rápido, a espada transformou-se em escudo nos braços de Elimar e lançou a criatura a metros de distância. Elimar sorriu e o Alcor tomou forma de anel giratório, se movendo conforme os gestos e desejos de seu dono. Elimar moveu a mão e o anel serrou o pescoço da fera tão rápido que ela entendia ter sua cabeça sobre o corpo, até que caiu.

– Agora há equilíbrio – animou-se Elimar.

Mago caminhava pela forte tempestade e dois tripulantes do Rosa do Saron o acompanhavam. Eles revezavam em puxar a caixa com o material bélico e o forte vento os empurrava, atrapalhando a caminhada. Ele apontou para uma pequena brecha entre as rochas brancas de gelo, e falou:

– Eu subirei e puxarei a caixa. Depois subo vocês.

Subindo, teve uma visão mais ampla do que estava por vir e desanimou.

– O que está vendo? – perguntou um deles.

– Maraghors...

Ele puxou a caixa e depois os homens, e sobre a rocha planejaram a melhor rota.

– Vamos passar por aquele vão. Talvez o som da tempestade camufle o nosso ruído... – sugeriu Mago.

Mago e os tripulantes estavam de posse de um fuzil cada, e preparados caso fossem atacados. Eles saltaram da rocha, pegaram o equipamento e seguiram devagar pelos cantos, usando a tempestade como aliada, e suas armas constantemente apontadas aos animais que dormiam. Com louvor eles passaram, e seguiram a trilha, e a tempestade se intensificou ainda mais, impedindo a visão do caminho, até que chegaram num largo cercado de grandes rochas e Mago examinou cuidadosamente o local.

– Acho que houve um deslizamento... O caminho está fechado. Teremos que escalar ou voltar.

– Eu não quero passar pelos Maraghors novamente – comentou um deles.

Mago olhou para o alto, medindo a altura daquela rocha bruta, e compreendeu que seria impossível a escalada com a caixa. Teria que deixá-la para trás se realmente quisesse continuar.

– Um de nós precisa escalar essa parede, e calcular a distância até o Rosa de Saron – ele sugeriu.

– Ficar aqui até aparecer uma fera dessas e nos devorar?

– Podemos voltar! – ele deu outra opção.

– Já tive sorte demais por hoje! – disse o outro.

Os tripulantes discutiam e suas opiniões divergiam e distraídos não perceberam uma alcateia encurralar o grupo. Mago pegou seu fuzil e atirou na cabeça do primeiro, assustando aqueles homens. Eles pegaram suas armas, atirando nos animais.

– Eles estão vindo! – gritou Mago.

– E são muitos!

Eles brotavam em todas as direções: cinco, dez, quinze, e Mago perdeu a conta, assustando-se com um som que vinha de um dos cantos da rocha, provavelmente outro Maraghor escavando para o atacar.

– Vamos morrer! – gritou um.

– Aguentem firmes! – gritou o Mago.

O som em suas costas se intensificava e uma luz estranha brotou entre as rochas, deixando-os intrigados, ao mesmo tempo atiravam nas feras.

Uma veloz lâmina circular passou pela passagem que acabara de se formar entre as rochas desmoronadas e flutuou diante daqueles homens com extrema perfeição, e entre a poeira causada pelo corte, Elimar surgiu glorioso.

– Precisando de uma mãozinha? – sorriu Elimar.

Ele apontou, e o Alcor matou toda a alcateia em segundos, deixando Mago e os tripulantes petrificados com o poder daquela arma.

– Vejo que você foi presenteado – sorriu o Mago.

– Meu maior presente é tê-lo com amigo – ele o abraçou.

Mago ficou curioso e o perguntou:

– Como nos encontrou?

– Segui o som. Aliás, belas armas. Como conseguiu?

Depois do Mundo ★ Livro 1 [FANTASIA/FIM DO MUNDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora