𝔇𝔬𝔦𝔰

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O grão senhor estava sentado diante da grande mesa oval do salão de jantar, observando as peônias frescas em um jarro de bronze enquanto aguardava a chegada de sua filha. Apesar de estar ressentido e fragilizado pela decisão que tivera de tomar, não poderia deixar de admitir que dessa vez, ela estava com a razão ao seu lado. Suspirando, encarou os lustres de cristal até que seus olhos marejassem, estava tão distraído que sequer notou a presença de Adara, agora sentada do outro lado da mesa, em frente a ele .

" ― Está distraído. "

foi tudo que ela comentou enquanto serviam o seu próprio prato.

―  Perdoe-me os maus modos. Estou pensativo com os eventos recentes.. e me perdoe pelo que tive de fazer.A decisão necessária a ser tomada.. Eu não tinha outra escolha, acredite. Se tivesse, as coisas estariam completamente diferentes agora.

Adara apertou os talheres em suas mãos, o encarando com uma expressão dura em seu rosto, embora a mesma logo se suavizasse e afeto tomasse conta das suas feições.

―.. Eu sei. Se tiver de me casar com um grão senhor rabugento, farei isso. Pelo meu povo e por você.

Alguns segundos de silêncio recaíram pela sala, conforme ambos encaravam os próprios pratos em silêncio. A calma antes da tempestade. - Eu sinto muito. Foi tudo que ele disse. Ambos sabiam que ele jamais superaria sua senhora, pra arrumar uma nova rainha agora, e mesmo se não estivesse tão fragilizado, jamais seria capaz. Hadij sempre tentara proteger sua filha, mas sempre chegaria um momento em que tinha deixar que ela crescesse. E como se pudesse adentrar em seus pensamentos, agora permanecia ao seu lado, de joelhos enquanto segurava a mão do próprio pai com ternura e afeto. - Não sinta. Um dia, serei rainha e grã-senhora, e nem sempre haverá boas escolhas. Apenas a melhor entre duas opções - ambos completaram em uníssono.

Nunca..jamais se curve a algum macho, nem mesmo se este seja seu rei.  ― O sultão agora falava tão baixo, que apenas ouvidos féericos e preparados seriam capaz de bisbilhotar aquela conversa.

Adara agora comia ao seu lado, partindo a refeição antes de completar com um sorriso. Aquele sorriso. O sorriso. Que traria vento, tempestades e o próprio caos encarnado em forma de mulher. Assim como sua parceira fazia. Pelo caldeirão, era exatamente com a ela..

Não se preocupe, pai. Ambos sabemos que a probabilidade de reinos caírem por minha causa e machos irem a guerra por mim é bem mais fácil que eu me curvar diante deles.

Apesar da ameaça explícita, agora encontrava-se aliviado e satisfeito. Adara falava não só como uma guerreira, mas como rainha. E que a mãe tivesse pena de quem fosse ter de se casar com ela, concluiu.

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Após o jantar, despediu-se do pai e estava em seus aposentos, encarando o jardim abaixo enquanto apoiava-se no mármore branco. Hakab estava ao seu lado, deitado aos seus pés confortavelmente, quase dormindo. O único sinal de que ainda não o havia feito, era a longa cauda abanando e enroscando-se nos pés de Adara.

―  Acha que devo ir hoje?

murmurou pensativa, virando-se para observar o tigre. Hakab era muito mais que um mero tigre. Era como se fosse seu guarda-costas, seu companheiro e seu filho. Sua melhor companhia naquele imenso e vazio palácio. Adara virou-se apenas quando viu a jibóia subindo pelo mármore em que estava apoiada pra ver o jardim, a serpente se aproximava sem pressa, deslizando sem soltar um sequer sibilar antes de ir ao chão. E com um clarão de luz, sua dama de companhia sorria agora. Cassandra. Seu pai decidiu lhe arrumar uma quando Adara completara 13 anos, e com um mero descuido, seu pai começou a desconfiar de suas saídas a noite. Então lhe dera Cassandra, e quando Adara estava prestes a ir em cima dela ou dopá-la para fugir a noite, a própria dama abriu as portas e revelou uma passagem secreta, piscando pra ela no escuro da noite e permitindo que saísse. A única coisa que havia dito naquele dia fora " Volte antes do amanhecer, ou levantará suspeitas. Ambas não queremos que seu pai me expulse e traga uma velha rabugenta que irá te prender aqui. Boa sorte, princesa. "
E depois daquele gesto, tornaram-se tão próximas quanto melhores amigas, irmãs. Em alguns momentos, a metamorfa vagava pelo jardim em forma de uma grande jibóia verde-escura, que rastejava pelas dunas de areia afim de ouvir notícias e boatos sobre o reino afora. Sua própria espiã.

𝑨 𝑪𝒐𝒖𝒓𝒕 𝒐𝒇 𝑾𝒊𝒏𝒅 𝒂𝒏𝒅 𝑺𝒂𝒏𝒅Onde histórias criam vida. Descubra agora