LXXXVIII. Roubo

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Do lado de fora da Gruta, Lothar encarava a movimentação de meia dúzia de bruxas lá dentro. Elas seguiam com suas atividades sem notar as figuras solitárias que passeavam pela floresta e descansavam sobre as raízes das árvores maiores.

Ele não sabia exatamente o que estava fazendo ali. Sentia-se exausto e desgastado. Queria dormir, mas não conseguia. Mal conseguira parar de pensar naquele experimento dentro da caverna, no confronto que quase eclodira entre fadas e bruxas. Por que as criaturas aladas pareciam ter tanto medo daquela magia?

Tudo que sentira quando em contato com ela foi a inebriante sensação de controlar um poder muito maior do que aquele que o deus de seu povo lhe dera. Ainda que o controle fosse difícil e que acidentes como o que Belthor sofrera pudessem ser ocorrências frequentes, Lothar tinha certeza que, com mais chances e num ambiente mais controlado, poderia dominar aquela coisa rapidamente.

Ele só precisava de uma chance.

No entanto, Miger, o substituto temporário de Belthor — ao menos até que um novo chefe fosse escolhido pelo voto dos chefes menores — não aceitava os pedidos de Lothar para que pressionasse a Matriarca a deixá-los estudar a magia. O acordo das bruxas foi com as fadas somente, não com os homens, argumentara ele, mas os ouvidos do jovem chefe de cabelos loiros estavam fechados às suas súplicas.

Então o ex-escravo seguira sem rumo pela floresta até que fora parar na Gruta, guiado ali pela vontade de seus passos, que refizeram o caminho do acampamento até a morada das bruxas. Sem saber o que fazer, Lothar simplesmente se sentou à sombra de um galho mais baixo e ficou ali, apreciando a grande variedade de criaturas que iam e vinham de todas as direções, cada uma com sua própria tarefa.

Ocorrera-lhe o pensamento de invadir a caverna de alguma forma e pegar o livro para si, a vontade de estudar aquele volume já parecia quase uma necessidade. Sabia que as bruxas o tinham guardado no que se referiram como "aposentos da Matriarca", mas não tinha ideia do que aquilo significava. Podia apenas supor que se tratava do longo corredor cujo acesso se dava no próprio salão da Gruta.

A falta de coragem, no entanto, foi maior do que a sua vontade de ter o livro em mãos. Além de que, precisaria de alguém que pudesse ler aquele dialeto estranho das bruxas. Desde que Asmin Flor-Invernal se tornara Matriarca, suas lições de leitura tinham parado e nem mesmo Biattra tinha demonstrado conhecimento suficiente para ensiná-lo.

Então simplesmente permanecera ali, sentado, como se esperasse por algum milagre. Não foi difícil, portanto, notar uma certa inquietação que começou a tomar conta das bruxas após algumas horas de quietude e tédio.

Sem saber de que se tratava, Lothar apenas observou e passou a se preocupar quando duas sentinelas surgiram dentre as árvores e se dirigiram diretamente até onde a Matriarca — que em algum momento saíra de seus aposentos e se sentara no banco de madeira no salão — as aguardava.

As estranhas falaram por alguns minutos, ignorando a crescente aglomeração de bruxas e outras criaturas que surgiam de todos os cantos para observar. Quando terminaram seu relatório, Asmin encarou algumas das bruxas ao seu redor e fez um sinal positivo com a cabeça.

— Lothar! — Ela chamou, vendo-o se aproximar com preocupação no rosto. — Preciso que faça-me um favor.

— O que está acontecendo? — Foi tudo que ele conseguiu dizer. A bruxa parou de caminhar a alguns metros do humano.

— Eles chegaram. — Era tudo que ele precisava para compreender. Os elfos, como prometido, estavam finalmente prestes a lançar seu ataque. Imediatamente, os pensamentos de Lothar foram novamente ao livro.

— Não acha que podemos usar?

— O livro? — A Matriarca perguntou, ao que ele respondeu positivamente com a cabeça. — Fiz uma promessa às fadas. Não podemos arriscar que isso saia do controle. Agora vá, e traga o novo chefe.

Fura-Coração (COMPLETO - EM REVISÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora