CIX. Árvore

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Fedra não sabia como conseguira traçar o caminho de volta à Árvore.

Tudo que ela podia sentir era dor e exaustão. Cada pedaço de seu corpo parecia estar sendo constantemente cortado por navalhas, suas pernas estavam fracas, sua magia esgotada e suas asas...

Ela chorava por suas asas, por sua vida, mas as lágrimas salgadas faziam arder ainda mais as feridas em seu rosto. Chorava também por todas as vidas que desapareciam a cada piscar de olhos, pela Floresta que ela chamava de lar que agora queimava incessantemente.

Os sons da batalha podiam ser ouvidos de onde ela estava, em algum lugar ao norte, além de onde os elfos podiam ir sem estender demais o fronte e ficar suscetíveis ao rompimento de sua própria linha.

A única coisa que a Rainha das fadas sabia naquele momento era que tinha que chegar até a Árvore. Somente lá ela poderia sentir um pouco de sua vida retornar ao próprio corpo. Sentia-se como uma casca vazia, uma coisa morta que caminhava somente porque não sabia onde se deitar para morrer.

Hora ela chorava inconsolável enquanto caminhava, hora ria como louca, deixando que sua sanidade fosse levada embora pela dor. Instintivamente, suas pernas iam na direção que ela imaginava ser a certa. Instintivamente, pois sua mente não conseguia funcionar por tempo o suficiente para tomar decisões racionais.

Seus passos pareciam ecoar pela floresta vazia. Todas as criaturas que não estavam lutando, tinham fugido para os lugares mais distantes possíveis, até mesmo os locais mais distantes da batalha pareciam vazios e desolados. A Floresta era apenas uma casca vazia do que um dia fora.

E Fedra não se sentia muito diferente disso. Uma casca que tropeçava pela floresta em busca de algo que lhe lembrasse o que era estar viva.

Ao ver a Árvore, linda e frondosa como sempre, erguendo-se acima de todas as outras estruturas da floresta, Fedra quis levantar voo e sentar-se novamente em seu trono de diamante. Esqueceu-se que não podia mais voar. Ainda que a magia de seu local de nascimento a inundasse, haviam coisas que nem o mais poderoso fogo podia mudar.

A Rainha colapsou à entrada da Árvore, caindo ao chão em frente a uma das fadas que ficara ali para proteger seu lar. Surpresa, a irmã correu para ajudar, mas a consciência de Fedra já se esvaía.

Quando ela finalmente acordou, alguém segurava sua mão. Com os olhos embaçados, ela demorou alguns segundos para identificar Eisa, que tinha um semblante extremamente preocupado. Os olhos vermelhos da capitã deixavam óbvio que ela estivera chorando.

Enquanto acariciava o que restava do cabelo da Rainha, ela percebeu que esta acordara.

— Majestade. — Ela falou, com a voz embargada. — Como está se sentindo?

Fedra tinha dificuldade de falar. Sua garganta estava seca e a dor que sentia pelo corpo a faziam querer voltar a dormir.

— C-como estão as coisas? — Conseguiu perguntar. Eisa a encarou por um momento.

— Missa fez curativos onde as feridas eram mais graves. A magia dela vai ajudar a cicatrizar onde...

—  Eisa. — A capitã sabia que a Rainha não se referia aos próprios ferimentos.

A capitã suspirou, seu rosto se contorcendo numa careta que mostrava decepção e medo.

— Não conseguimos segurá-los. — Ela engoliu em seco antes de prosseguir. — Em pouco tempo estarão aqui.

— Como estão todas?

— Lutando. Sei que falou para ficarmos na Árvore, mas...

— F-fez bem. — Fedra interrompeu, com uma mão erguida. Uma crise te tosse a atingiu antes que conseguisse falar mais. — E o livro?

Eisa não respondeu, apenas apontou para o artefato que descansava aos pés da cama em que a Rainha estava deitada. Não tinham conseguido destruí-lo, então, percebeu. O que teria acontecido?

— Há proteções no livro. — A capitã explicou. — Algumas colocadas por Azar Fura-Coração, outras pelos próprios humanos. De qualquer forma, precisaremos de mais tempo para desvendar como destruir essa porcaria.

— Tempo que não temos. — Fedra suspirou, desejando que pudesse retornar à batalha imediatamente, mas a dor que lhe afligia parecia tornar até mesmo seus pensamentos dolorosos. — Leve todas para a linha de frente, ajude as bruxas como puder. Até mesmo as mais jovens, se estiverem em condições.

— Sim, minha Rainha. — Eisa assentiu, já levantando para cumprir as ordens de Fedra. Era visível a tristeza que sentia por ver a amiga naquela situação, o que feria ainda mais o orgulho desta.

Fedra tentou engolir o próprio ego, ignorar o fato de estar acamada no momento mais crucial de sua existência. Ainda tinha um dever a cumprir, como Rainha e irmã mais velha de todas aquelas fadas. Se tivesse que levantar daquela cama e lutar, mesmo nas condições em que se encontrava, o faria.

Só precisava de mais alguns minutos, convenceu a si mesma. Poderia lutar, apenas precisava reabastecer as próprias energias.

Quando Eisa ia saindo pela porta, no entanto, a Rainha se lembrou de uma última coisa.

— Eisa. — Chamou, fazendo com que a capitã estacasse. — Preciso falar com Lyssa.

A fada assentiu, se abaixando para pegar o livro e partir.

— Deixe ele aqui. É mais seguro. — Fedra podia não estar em condições de manter aquela coisa longe dos elfos, mas a Árvore era definitivamente mais segura do que o campo de batalha.

Com um último olhar triste na direção da Rainha, Eisa partiu para a batalha e a deixou sozinha com a própria dor novamente. Os remédios fornecidos pelas curandeiras ajudavam a amenizar a dor, mas o sofrimento ainda conseguia se fazer presente, principalmente na mente de Fedra, que vez ou outra flertava com a inconsciência como forma de escapar da realidade cruel.

Sozinha, cansada e destruída, ela deixou que sua mente fosse levada ao mundo dos sonhos, onde pesadelos infinitos a aguardavam.

Fura-Coração (COMPLETO - EM REVISÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora