XCIII. O Esquema de Lyssa

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Assim que Alick deixou morada das fadas, Lyssa correu atrás de Eisa na direção da sala do trono de Fedra. Do lado de dentro estava Estella, equipada com armadura e uma espada curta, conversando com outras fadas. A ruiva se aproximou assim que viu a irmã mais nova entrar.

— Está tudo bem? — Ela perguntou, se aproximando das duas.

— Não. — Foi a capitã quem respondeu, respirando profundamente em seguida. — Estou tentando me convencer de que Alick Ferro-Brasil está certa, que não podemos pegar nossas armas e retomar o livro.

— Errada ela não está. — Respondeu a ruiva. — Só causaria mais problemas com as bruxas e com os humanos. — Ela fez uma pausa. — Então, vamos só esperar?

— Ao menos até que a Rainha chegue.

— Na verdade... — Lyssa resolveu falar o que estava em sua mente desde que entrara na Árvore.

— O quê? — Ambas falaram ao mesmo tempo, um misto de esperança e desconfiança em seus olhares.

— Nós podemos roubar o livro. Duvido que alguém vá prestar muita atenção nisso em meio à batalha. Podemos aproveitar a confusão. — A mais nova falou apressadamente.

Estella, silenciosamente, apenas encarou a capitã da guarda, que se pôs a pensar pesadamente sobre o assunto, provavelmente sopesando todos os riscos presentes.

— Foram eles que roubaram o livro em primeiro lugar, afinal. — Comentou Lyssa, não aguentando o silêncio opressor que pairava sobre elas.

Eisa assentiu com a cabeça, como se tivesse tomado uma decisão.

— Se Fedra não chegar até a batalha começar, faremos isso. Do contrário, esperaremos para ver o que ela irá decidir.

— E então destruiremos aquela bizarrice? — Estella perguntou.

— Acho melhor não. Se sobrevivermos a essa batalha e as bruxas descobrirem que o livro não existe mais, teremos mais uma guerra nas nossas mãos. Roubaremos o livro e ficaremos com ele até essa bagunça acabar. — Eisa falava em tom decidido, segura de que aquela era a melhor ideia possível.

— Como vamos fazer isso? — Lyssa perguntou.

— Vocês duas não vão fazer nada. — Comentou a capitã. — São as duas fadas mais conhecidas entre as bruxas. Qualquer uma delas que as veja fora de seus lugares na batalha irá suspeitar de algo.

— Está dizendo que devemos simplesmente sentar nossas bundas aqui e esperar? — Estella se revoltou.

— Não, Estella. — Eisa falou e olhou diretamente para Lyssa. — Você deve fazer o que as bruxas mandarem. Vá com a Ferro-Brasil até a linha de frente, lute e, pelos deuses, fique viva. Faça aquilo que elas te recrutaram para fazer. — Ainda que as palavras não agradassem à mais nova, ela assentiu. — Quanto a você, Estella, fará como todas as outras fadas e protegerá a retaguarda. Somos a última linha de defesa, lembre-se.

— Certo. — A ruiva estava visivelmente descontente, mas não podia desafiar a autoridade de Eisa.

A Capitã da Guarda de Fedra não era a mais poderosa das fadas, mas definitivamente sabia se portar como se fosse. Sua presença e aparência imponentes faziam com que qualquer uma respeitasse a posição que a Rainha lhe dera.

Lyssa apenas assentiu e decidiu acatar aquelas ordens, ainda que no fundo torcesse para que Fedra chegasse à Árvore antes que a batalha começasse e ordenasse às fadas que destruíssem o livro.

Como que aproveitando a deixa, Estella pegou uma das mãos de Lyssa para chamar sua atenção.

— Venha, Lyssa. — Ela disse. — Tem alguém que eu quero que você conheça.

A jovem a encarou com dúvida nos olhos, o que fez com que Estella risse, mas a irmã não revelou mais nada. Antes que fosse arrastada na direção das entranhas da Árvore, no entanto, lembrou-se do limite de tempo que Alick lhe dera. Não sabia exatamente quanto tinha se passado, mas tinha certeza de que não tinha tempo para confabular com outras fadas.

— Estella, espere... — Ela começou a dizer, mas foi interrompida por Eisa.

— Meninas, mais uma coisa. — A segunda em comando de Fedra começou a dizer. — Lembrem-se: o maior inimigo aqui são os elfos, não aquele livro. Se tiverem que escolher entre derrotar os elfos e destruir aquela magia, escolham os elfos. Sempre os elfos.

Ambas assentiram, sem saber muito bem como respoder àquele comentário.

— É algo que eu, frequentemente, tenho que lembrar a mim mesma. — Eisa continuou. — Ainda que os homens e as bruxas não possam ver, aquela coisa é má. Inerentemente má. Eu sinto isso, vocês sentem, Fedra também sentiu. — A fada falava seriamente, com um pesar em sua voz que Lyssa nunca vira. — Os elfos não. Eles escolheram o caminho do mau, mas não nasceram assim, não são todos assim.

— Difícil de acreditar. — Estella comentou.

— Por favor, sem piadas. — A Capitã respondeu imediatamente. — Ainda assim, o nosso inimigo imediato é mais importante que o outro que nós sequer entendemos direito. Estou pedindo que ajam contra todos os seus instintos, sim, mas lembrem-se disso. Primeiro os elfos, depois a magia da Fura-Coração.

— Está bem, Eisa. — Concordou Lyssa. Vira o elfo matar Azar num piscar de olhos, percebera a trapaça que aquelas criaturas eram capazes. Não estava disposta a deixar que eles vencessem só porque todo o seu corpo se arrepiava ao pensar naquela magia negra. — Vamos fazer o que tem que ser feito.

Ainda que a jovem tentasse falar com confiança, sabia que suas palavras eram um tanto quanto inseguras. No entanto, falava mais para convencer a si mesma do que a Eisa ou Estella, então não se importava muito com a veemência de sua fala.

— Certo. — Disse Estella por fim. — Lyssa para o campo de batalha e eu para o galho, esperar pelo pior.

Lyssa, que já se virava de costas para deixar a Árvore, ao ouvir aquelas palavras retornou a olhar para as irmãs, surpresa ao ver lágrimas nos olhos de Estella. Nunca vira a irmã chorar. Pensara até que era impossível que ela fizesse tal coisa, mas lá estava aquela gota d'água teimosa traçando um caminho por seu rosto.

— Estella? — Disse, se aproximando.

— Eu só... — A irmã falou, visivelmente irritada e triste. — Seu lugar é aqui, Lyssa. Conosco. Não lá fora lutando ao lado daquelas bruxas. Vamos todas morrer de preocupação aqui.

— Por favor, não façam isso. — Disse Lyssa, ao mesmo tempo chorando e rindo. Percebeu naquele momento que aquela poderia ser a última vez que via suas irmãs e não estava pronta para isso. — Se forem morrer, que morram lutando contra os elfos.

Estella sorriu, mas não parecia em nada aliviada.

— Tente não morrer, está bem alteza? — Suplicou a irmã.

— Farei o possível. — Lyssa respondeu, se jogando com todas as forças num abraço apertado, sentindo o conforto do corpo da irmã pela última vez antes da batalha. — Quando eu voltar, você me apresenta quem quer que seja que queria me apresentar, está bem?

— Certo, irmãzinha. — Estella rompeu o abraço e olhou firme nos olhos de Lyssa, segurando seus ombros com as duas mãos. — Lembre-se: foco e paciência. Não perca essas duas coisas lá fora. Seu poder pode ajudar a mudar essa batalha, mas apenas se você souber como controlá-lo.

— Essa última parte tem sido o problema.

— Se o que ouvi de sua viagem com Azar e Alick, nós duas sabemos que isso não é verdade. — Estella falava tranquilizadora, mas firme. — Ele é parte de você. Saber como usá-lo será tão natural como andar ou voar. Você só precisa de um empurrãozinho.

— Bom, acho que eu não tenho opção. — Lyssa riu, mas as lágrimas que corriam por seu rosto não a deixavam mentir sobre seu estado emocional. — A gente se vê mais tarde.

Estella não disse mais nada. Não parecia ter palavras para dizer. Ela apenas acenou com a cabeça e soltou os ombros da irmã, que se virou e caminhou apressadamente para fora da Árvore. Quando a mais nova estava quase fora do campo de visão, a ruiva gritou:

— Agora seria uma boa hora para aprender a voar!

Lyssa não pôde evitar o sorriso que surgiu em seu rosto.

Fura-Coração (COMPLETO - EM REVISÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora