Minutos se passaram e o silêncio estava presente entre nós, porém o modo como ele me olhava me reconfortava.
Olha May, sinceramente eu acho que é falta de amor próprio o que você está fazendo. Ele só te pediu desculpas, você nem sabe pelo que, e já fica aí se derretendo!– meu lado sensato alertou.
Ele permaneceu na cadeira de canto, assistindo TV. Eu deitei sobre as almofadas na cama enquanto esperava o pedido de almoço, mentalmente agradecida por ele ali, ainda que ambos não falássemos nada. Via-me incapaz de coordenar idéias e acontecimentos com sua presença. E todas as vezes que meus olhos encontravam os seus era com certo desconcerto. Não devia, mas estava feliz em vê-lo, o que era uma verdadeira tortura ao meu coração. Até quando iria agüentar?
Ele também me olhava discretamente, com aparente dúvida e apreensão. Embora eu quisesse conversar, tinha medo de ouvir algo que me machucasse novamente.
O almoço chegou, eu recebi o carrinho na porta e dispus perto da cama. —Ponha o seu e come aqui comigo. — Propus e apontei para a cama, tentando deixá-lo mais a vontade.
Comemos silenciosamente, sem nunca desgrudarmos os olhos do desenho animado na TV. Nem que ficássemos calados a tarde toda, eu queria que ele continuasse lá, nutrindo meu masoquismo.
Após almoçar, organizei o resto de comida e fui escovar os dentes. —Tem escovas de dente descartáveis aqui, você quer? — Ofereci solícita.
—Quero. Eu não trouxe minha mochila. — Justificou sem jeito. — Obrigado. — Sorriu educado. O muro de distância que nos separava era quase palpável.
Deixei-o no banheiro, sentei na cama com as costas apoiadas na cabeceira e, devido à noite mal dormida e à manhã de compras e passeios, o cansaço me tomava.
—May, eu já vou. — Avisou sem certeza, ao me encontrar relaxada sobre as almofadas. —Fica mais um pouco. Depois você vai. — Pedi carinhosa. —Você tem que estudar?
—Também... É que eu vou deixar você descansar. E eu também estou cansado. — Explicou hesitante.—Fica aqui. Eu prometo não tocar em você. — Escondi minhas mãos nas costas, fazendo uma cara cômica inocente, depois sorri e bati duas vezes na cama.
Ele sorriu tímido, indeciso.
—Fecha as persianas e abaixa a TV, ou melhor, desliga, senão, eu não paro de assistir. — Pedi manhosamente.
—Tudo bem. — Assentiu e foi fechar as persianas.
Eu deitei encolhida em um canto da cama super king, assim deixaria um bom espaço pra ele. Ele se deitou sobre as almofadas no outro canto e ficou olhando para o teto.
—Já comprou sua passagem? — Perguntou baixo.
—Sim. Eu tinha comprado pra hoje duas da tarde, mas fui lá e troquei a passagem para amanhã, às quatro. Acredita que os vôos de amanhã estavam todos cheios e quase que eu não consigo?! — Balancei a cabeça admirada.
—Por que adiou? — Parecia querer manter um diálogo.
—Por que resolvi sair hoje à noite e aproveitar o passeio mais um pouquinho. — Respondi sem hesitar.
Se antes ele pensava que eu queria só aproveitar, agora que ia ter certeza. Uma mulher saindo sozinha na cidade grande na cabeça moralista dele devia ser um absurdo. Mas eu não ia mentir, se ele perguntasse. Não tinha nada a esconder. Vou pra casa do Ivan sim. Vai que seja legal!
Uma pausa longa de silêncio se fez, antes que ele interrompesse. —May, realmente eu preciso ir. — Informou e se levantou.
Será que ele se irritou porque eu disse que iria sair? Seria muita pretensão pensar isso.
—Por favor, não vá. Fique como meu amigo... Poncho não deixaria uma amiga aqui sozinha. Ainda mais eu. — Sorri persuasiva.
Impotente ante a chantagem emocional, ele sorriu e deitou de lado na cama, de frente pra mim. Foi fácil e estranha sua redenção... Em silêncio, eu olhava-o sem encará-lo. Ele manteve um olhar terno em mim. Meu Wiliam relaxado e livre estava de volta, mesmo que estivesse cauteloso.Vagas lembranças dos olhos dele na noite passada ainda queriam invadir a minha mente, fazendo minha garganta cortar, enviando assim umidade aos meus olhos. Mas eu respirava fundo e olhava de novo para ele, me convencendo que aquele era o meu Wiliam. Ainda que sua presença fosse uma caridade forçada e que me conformar com isso abatesse meu amor próprio, ele estava ali, e eu estava feliz.
—May... Podemos conversar? — Ele perguntou receoso.
Pensei um pouco antes de responder. Com certeza ele falaria algo que me magoaria. Ainda que involuntariamente, me magoaria. Eu ainda não estava pronta para mexer em uma ferida. Eu só queria ficar perto dele.
—Eu prefiro não.
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Amor VS Poder
RomanceMay é uma das herdeiras de uma influente organização de notícias e publicidade do país. Musicista alto astral, apaixonada pelo pai e unida aos irmãos, vive num mundo em que luxo e riqueza são parte de quem ela é. Ao conhecer o filho humilde de uma...