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HORAS ANTES

     De cabeça baixa novamente sentado no canto da parede Miguel esperava o momento que o guarda fosse recolher o prato.
    Apertou o pedaço de ferro escondido na mão fechada em punho ao ouvir o ruído da chave girando na fechadura da grade.
     — Se continuar assim não estará vivo quando sombra voltar.
     — Pode crer que irei. — murmurou
Esperou o guarda agachar para pegar o prato e então o apunhalou no pescoço o perfurando.
     Agonizando com a dor e sangramento o guarda caiu no chão.
     Miguel levantou. Verificou se não havia mais guardas vigiando a entrada. Mancando da perna esquerda com as roupas sujas do sangue que espirrara do guarda, andou até a porta de ferro protegendo a saída.
     Pela pequena janelinha na porta viu que outro homem guardava a entrada. Escondeu-se atrás da parede e deu duas batidas na porta.
     Fechou o punho e segurou a respiração desregulada. O guarda foi acertado com um soco na cara ao abrir a porta, caindo desacordado.
     Miguel pegou o fuzil caído do lado do corpo do capanga. Correu manco a procura da saída do cativeiro.
     Disparava nos capangas que entravam no seu caminho.
     Abriu uma porta enferrujada que dava acesso a um lugar deserto, rodeado de árvores.
     Seu joelho doía sem pausa. Aflito com a dor rangia os dentes, enrugando a testa.
     Puxou a perna a arrastando para acelerar os passos.
     A visão não era ampla na escuridão.
     Desviava dos galhos a sua frente e olhava para trás averiguando se estava sendo perseguido.
     Suado, sem fôlego, parou de correr, exausto. Encostado numa árvore esperava recuperar-se.
     Não podendo correr o risco de ser capturado novamente voltou correr até chegar ao asfalto.
     Sujo, suado, faminto e sedento Miguel percorria na beira da estrada na esperança de poder se salvar.
     A visão aos poucos ficava embaçada e o mundo parecia girar. Tentando limpar a visão Miguel sacudia a cabeça, mas sem muito resultado.
     As pernas de repente enfraqueceram drasticamente dificultando a caminhada. Os pés ardiam e a fraqueza o impossibilitava de continuar.
     Desidratado, tudo ficou preto e seu corpo já não aguentava mais, mas não podia desistir ali.
     Faróis se aproximava, Miguel não parou nem sequer olhou para trás. Era perceptível que o veículo reduzia a velocidade ao se aproximar de Miguel, para seu desespero.
     Uma mulher bateu a porta ao sair do carro.
     — Ei! Está tudo bem? — perguntou ela indo até Miguel
     Miguel não respondeu a ignorando.
     — Cara. Você precisa ir para o hospital. Posso levá-lo.
     — Não — respondeu sem a olhar
     A moça correu até Miguel o parando, segurando-o pelo braço.
     Miguel encarou-a.
     — Não vou lhe fazer nenhum mal. Só  quero ajudá-lo.
     — Não preciso de ajuda.
     — Não é o que está parecendo.
     Miguel ficou em silêncio.
     — Vem. Vou te levar para o hospital mais próximo.
     A caminho do hospital Miguel ficou calado evitando olhar para a moça.
     — O que aconteceu? Por que está assim? — perguntou ela atenta a Miguel e a estrada
     Não respondeu.
     — Não é de conversar?
     Miguel a olhou.
     — Não tem medo de sair oferecendo caronas para estranhos?
     Por um momento Miguel foi encarado pelo o rosto inexpressivo.
     — Sei que vivemos num mundo ruim, mas não posso me tornar igual o mundo.
     — Primeiro vem a sua segurança.
     — Primeiro vem o bem. Se eu tiver de morrer por tentar ajudar alguém é porque é pra ser.
     Miguel virou o rosto para a janela do carro.
     Bateu a porta ao sair do carro. Sem olhar para trás andou para a entrada do hospital.
     Os olhos ardiam com a claridade das luzes brancas. Miguel olhava para todas as direções esperando que alguém o ajudasse.
     Virando o corredor a esquerda avistou um senhor junto a uma criança. Pensou em pedir ajuda, mas ao chegar perto sentiu o clima pesado.
     Passando diante aos dois não pôde deixar de reparar no garoto que o olhava fixamente. Os cabelos lisos e escuros, a pele branca com sardas destacada pelo os olhos verdes. A imagem de Valentina se fez presente em suas lembranças. O coração cada vez mais acelerado.
     Continuou andando, desviando o olhar do menino.

AGORA

      Sentado, esperando a vez de ser atendido Miguel recordava-se do adolescente — O olhar assombrado, a face rubra com traços tensos, nos lábios duros o pavor. — O que aquele homem era dele? Avô?
     Se perguntava constantemente.
     — Onde você está, Maxswel? — cochichou consigo mesmo enquanto encarava o chão.

VIDA BANDIDA A última bala Parte 3Onde histórias criam vida. Descubra agora