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     Sentado na poltrona de frente à cama Miguel contava as histórias da família para Max e Alyssa que escutavam atentos, deitados e enrolados no cobertor.
     Estavam tão submersos nas aventuras que mal pestanejavam.
     —... E então a galinha correu para o mato.
     — Mas a tia Fátima não gostava dos bichos? — perguntou Alyssa ansiosa por mais
     — Sim, ela adorava. — sorriu com doçura — Não havia pessoa que gostasse tanto de animais como ela. — Os olhos de Miguel sorriam com as lembranças de ternura da avó
     — Seria bom se ela estivesse aqui com a gente. — falou Max
     Por mais doloroso fosse não tê-la presente a faísca de alegria em Miguel não cessava.
     — É... seria.
     Ter diante seus olhos o fruto do intenso amor com Valentina preenchia grande parte do vazio restando quase nada.
     Era impossível olhar para Maxswel e não recordar de Valentina. Até mesmo na fala havia traços dela. Embora ficasse sufocado na própria felicidade em ter um ser com a mesma identidade. Que pudesse olhar e vê-lo como reflexo.
     — Estou muito ansioso para ver a mamãe.
     — Em breve você a verá.
     — Também não vejo a hora de conhecer meus pais. Você mostrou a foto que achou na casa para seu pai, Max?
     — Qual foto? — uniu as sobrancelhas
     — De um casal. São bem jovens. Provavelmente alguém que passou por lá e deixou cair.
     Retirou a foto do bolso da calça e a entregou para Miguel.
     Inclinou-se para frente e pegou a fotografia.
     O brilho no olhar ressaltou.
     — Sua mãe é realmente muito linda! — disse com admiração
     — Essa mulher é ela?
     — Sim. Aqui somos nós quando éramos jovens.
     — Acho que não mudaram tanto. Só ficaram um pouco mais velhos.
     Miguel sorriu.
     — Valentina pode ter cem anos, ela nunca deixará de ser a mulher mais bela que já conheci.
     — Realmente a ama, não é tio Miguel? — perguntou Alyssa
     — Mais que a mim mesmo. — respondeu com o olhar ainda caído sobre a imagem
     — Sabe, pai... — Miguel olhou para Max — mesmo tudo acontecendo com tanta rapidez, mesmo não havendo tempo para similar tudo, eu o amo muito. Sempre esperei pelo momento em que te conheceria... E sabia que seria o dia mais feliz da minha vida.
     Lágrimas enchiam os olhos de Miguel.
     Max levantou e abraçou Miguel fortemente. Com dificuldade Alyssa se pôs de pé para participar do abraço triplo.
     Miguel fechou os olhos deixando escapar as lágrimas de alegria."
     "Sentados no chão, Gustavo encarava Pedro sentado do outro lado. Separado do grupo.
     — Não acredito que estamos "metidos" novamente em encrencas. — disse Lobo de olhos fechados e cabeça apoiada na parede de madeira
     Guilherme achou entre os homens um senhor idoso que o chamara atenção. Levantou e foi até o mesmo.
     O senhor evitava o olhar diretamente.
     Demonstrando não querer o machucar, Guilherme se aproximou calmamente. Sentou no chão do lado do velhinho.
     — Podemos conversar?
     O senhor assentiu segundos depois.
     — Há quanto tempo está aqui?
     — Dois meses.
     Os olhos de Guilherme se estreitaram.
     — Como te capturaram?
     — Estava dormindo na rua.
     As respostas eram rápidas e curtas.
     Guilherme encarou o chão. Encolheu os joelhos contra o peito. Olhou para o teto.
     — Nunca pensou em fugir?
     — Não tem como fugir. O fazendeiro mataria qualquer um que passasse por aquela porta a fora. — Guilherme o mirou — Apesar que só estaria antecedendo o esperado. Indo ou ficando a única certeza que possuímos é a morte. Se não morrermos de fome, sede ou doença, morreremos nos experimentos.
     — Experimentos?
     — Toda semana levam um de nós para fazer testes medicinais.
     Os pelos no corpo de Guilherme se arrepiaram. Automaticamente fitou os corpos descartados em pilhas.
     — Embora, ainda tenho esperança que iremos sair daqui.
     — Disso pode ter certeza.
     Guilherme levantou. Em algumas passadas estava diante a grande porta. Furioso chutou repetidas vezes a madeira resistente.
     — Seus miseráveis! Vou acabar com cada um de vocês!
     — Guilherme! — Gustavo conteve sua fúria
     — Não podemos ficar aqui, pai.
     — Não vamos ficar. Mas tenha calma que vamos conseguir.
     Guilherme encarou a tranquilidade no semblante de Gustavo.
     — O que está acontecendo? Desde quando age assim? — franziu o cenho
     — Não adiante nos desesperar...
     — Não fale com tanta tranquilidade porque isso me estressa. Sei que não é assim. Te conheço perfeitamente para saber que por dentro está se corroendo, louco para derrubar tudo isso e arrancar a cabeça de cada um daqueles desgraçados!
     Gustavo ficou calado.
     — Eu também estou cansado, pai. Mas não podemos desistir e optar por esperar que tudo se resolva naturalmente. — a voz estava leve — Está vendo esses homens? — Gustavo virou o rosto para olhá-los — Todos farão parte de experimentos. Essa é a tarefa diária que o rapaz falou. Olhe para Felipe e Marcos — Gustavo os mirou — Quer mesmo vê-los sendo cobaias das insanas atrocidades daqueles homens?
     Gustavo fechou a mão em punho.
     — Admiro muito que esteja querendo lutar contra seus instintos e tentando se tornar alguém melhor... mas infelizmente foi sua insana sede de vingança e de sangue que nos manteve vivos até hoje. — foi encarado — Não deixe que façam mal a seus filhos, irmão e amigos. Pense em tudo que passamos pra chegarmos até aqui. Pense na minha mãe, nossas esposas e filhos. — falava quase em súplicas
     Gustavo sentia esperança de que pudesse lutar contra seus instintos, mas seus instintos ainda falavam mais alto.
     Não adianta lutar contra quem se é. Não adianta tentar derrotar sua própria essência. Ir contra a natureza é derrotar a si mesmo. Nenhuma das batalhas travadas era grande o bastante comparada a que travava contra seu próprio eu. Enfrentar-se e permanecer de pé a cada dia minimizava o inimigo.
     "O sorriso largo de Luísa solto ao vento.
     "Todos sentados na sala, bebendo e gargalhando em harmonia.
     "Guilherme, Felipe e Marcos quando crianças, dando seus primeiros passos.
     "A promessa que fizera para Guilherme no seu primeiro dia de vida, 'Não deixarei que nada te aconteça. Será o mundo contra você e eu contra o mundo'. Disse Gustavo segurando nos braços Guilherme recém-nascido, frente a vidraça no hospital."
     Se recuperando dos lampejos, de punhos cerrados, trincou os dentes. O olhar tornou-se gélido e endurecido.
     Guilherme o fitava esperando alguma reação.
     Por mais cansado Gustavo estivesse, desistir não fazia parte de seus atos.
     — Preparem-se. Iremos embora e levaremos todos esses homens com a gente."

VIDA BANDIDA A última bala Parte 3Onde histórias criam vida. Descubra agora