Capítulo 13

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Muitos poderiam me achar louca por gostar da ideia de uma quase estranha que me odiava de todas as maneiras fosse passar uma semana sob o mesmo teto que eu. No entanto, eu não conseguia achar ruim. Anne tinha personalidade forte e eu sabia que ela não facilitaria as coisas, mas mesmo assim, eu não conseguia me importar.

Voltei para casa saltitante e tão mergulhada nos pensamentos que nem percebi como o vento era frio e como a neve dificultava meus passos. Passei na lanchonete que frequentava e comi um lanche para não precisar fazer janta apenas para mim mais uma vez, rezando para que minha mãe não tivesse enviado nenhum espião para seguir cada passo meu, pois se ela descobrisse que eu andava substituindo uma janta por apenas um sanduíche, atravessaria o Atlântico, nem que fosse a nado, e iria pessoalmente me corrigir.

Subi até meu apartamento e decidi ligar para Philip, já que ele andava me cobrando atenção. Eu achei que a chamada iria cair, quando seu rosto surgiu na tela do computador.

— Oi! — exclamei, acenando, enquanto ele limpava algo em seu rosto com a manga da camisa. — Está tudo bem por aí?

Philip assentiu.

— Claro. — Ele passou a mão pelos cabelos e desviou o olhar da câmera, encarando alguma outra coisa. — E por aí? Tudo tranquilo?

Ri, o deixando confuso.

— Qual a graça?

— Sua pergunta. Está tudo bem sim, mas eu jamais poderia dizer tranquilo... É que amanhã uma adolescente vem aqui para o meu apartamento. Ela vai ficar aqui durante uma semana.

Philip me encarava, pasmo.

— Por que raios uma garota vai para o seu apartamento?!

— Ela é órfã. Precisa de lugar para ficar por esse tempo — expliquei.

— Você quer adotar essa garota?! — O sangue sumiu do rosto dele.

Neguei com a cabeça.

— Não. Pelo ao menos não por enquanto. Por que isso agora, Philip?

Seus olhos, lentamente, se transformaram em algo duro, inflexível, e eu me questionei o que estaria acontecendo com ele.

— Como assim "pelo ao menos não por enquanto", Clara?! — Sua voz afiada cortou o silêncio do meu apartamento outra vez. — Nós nem sequer estamos um perto do outro e você já quer uma criança!

— Ela não é uma criança! Ela tem quatorze anos! — respondi no mesmo tom de voz que ele falava comigo, ficando de pé em frente ao computador. — E não, se é isso o que te incomoda, eu não vou adotar ela, droga!

Eu ainda vi seus olhos mudarem de tonalidade, antes de fechar o notebook com força, encerrando a ligação.

Bufei frustrada, caindo sobre o sofá outra vez.

Eu só queria conversar com Philip, com meu namorado, e compartilhar o que estava acontecendo comigo, contar para ele tudo o que eu estava passando, as novas experiências e falar sobre minha rotina, e em troca, meu único pedido era que ele me ouvisse.

*****

Abri os olhos, grogue de sono, e tateei o criado mudo em busca do celular. Pela primeira vez em dias, eu tinha acordado antes do despertador me tirar dos meus sonhos.

O sol ainda nem havia nascido. A neve caía livremente do outro lado da janela embaçada, apenas aumentando o espesso tapete branco que havia se acumulado durante a noite nas ruas, e o vento continuava arrebatador, balançando os galhos nus das árvores.

Do Outro Lado do AtlânticoOnde histórias criam vida. Descubra agora