Capítulo 39

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As duas criadas da noite anterior haviam voltado para o meu quarto quando saí do banheiro, enrolada no robe.

Não sabia exatamente, mas tinha quase certeza de que Henri estava por trás daquilo e as enviara para me ajudar.

Henri...

Durante o banho eu havia repassado pelo ao menos três vezes nossa conversa e a cada vez que fazia isso, mais confuso tudo ficava. Então simplesmente me proibi de pensar novamente no assunto. Me obriguei a esquecer aquilo tudo e focar apenas no que eu encararia em alguns minutos: o salão de uma matriz secular onde qualquer pessoa presente poderia levantar um único dedo e a existência do indivíduo cujo fora apontado seria apagada completamente em questão de segundos.

Apenas uma noite, repetia a mim mesma.

Independentemente do que Henri tivesse a me dizer, eu poderia esperar mais um dia. E não podia deixá-lo na mão.

Não naquele dia.

Então saí da banheira convicta de que esqueceria tudo aquilo, mas enquanto as duas jovens mulheres que, com certa dificuldade por não falarmos a mesma língua, descobri se chamarem Olívia e Rayka, me preparavam — a mais alta, Rayka, me maquiava e Olívia pintava minhas unhas de um branco tão delicado — Henri foi a única coisa que preencheu minha mente por todo o tempo.

Vinte minutos se passaram, quarenta, uma hora. Então, por sinais, pediram para que eu me levantasse da poltrona que estava e me levaram para o meio do quarto, onde me ajudaram com o vestido negro que havia entregado a elas mais cedo e retornara impecavelmente bem passado e cheirando a lavandas, minutos antes. Em seguida, me calçaram com os saltos que Edith me presenteara, mais altos que qualquer um da minha mãe que eu já havia ousado experimentar quando criança, então mais uma última arrumada em meus cabelos e finalmente me permitiram ir até o grande espelho ao lado da porta do banheiro.

E o que vi, não era eu.

Elas haviam me transformado em uma personificação da realeza.

Embora meu vestido fosse simples e sem nenhum detalhe, seu tecido justo que moldava meu corpo estava esplêndido e, como Anne havia me dito meses antes, parecia ter sido feito especialmente para mim.

Rayka havia alongado meus cílios e pintado meus olhos de negros que lentamente se tornavam cinzas e então a cor desaparecia se misturando na tonalidade da minha pele; eles pareciam chamativos enquanto meus lábios permaneciam claros com o batom nude que havia usado. E Olívia... Quando ela havia terminado minhas unhas, se concentrou em meus cabelos e os transformou em ondas pretas de ônix que escorriam pelos meus ombros e se finalizavam às costas. Ela havia dado uma certa leveza para eles e definido suas ondulações, que a muito tempo não recebiam a atenção que mereciam.

Observei meu reflexo no espelho, sem ter a certeza de que os pulmões trabalhavam como deveriam. Eu não era mais a mesma garota que havia atravessado o oceano apenas em busca de estudos para poder ajudar a família e um futuro melhor.

Eu havia me transformado... A vida havia me transformado.

Havia me forçado a amadurecer, por que é sempre assim que as coisas desenrolam. A gente nunca acha que está pronto, mas então as coisas acontecem sem aviso prévio e sua única opção é amadurecer para conseguir suportar o peso de tudo.

Eu havia mudado e me transformado em uma mulher. Talvez cedo demais, mas capaz de decidir por mim mesma minhas atitudes. Sem perceber, eu tinha me transformado no que tanto admirava. Havia me tornado forte, até mais do que um dia imaginara possível.

Do Outro Lado do AtlânticoOnde histórias criam vida. Descubra agora