Capítulo 20

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Capítulo com gatilho

Coloquei a última bolachinha na boca e encarei o pacote vazio na minha mão.

— Senhores passageiros, por favor desliguem os aparelhos celulares, tablets e notebooks. — A voz da aeromoça soou nos autofalantes do avião. — Estamos iniciando o processo de pouso e precisamos da colaboração de todos.

Exceto pelas três decolagens e dois pousos que tive que enfrentar em um único dia por causa das escaladas em Lisboa e Toronto, a viagem havia sido tranquila. Mas me lembrar que eu teria que enfrentar mais um pouso nos próximos minutos, me fazia suar frio. A aerofobia provocava em mim o pânico de decolagens, pousos e qualquer outra coisa que me deixasse fora do controle da minha própria estabilidade. Ver o chão se distanciar dos meus pés num voo era como acionar em meu cérebro uma alavanca de pensamentos aterrorizantes.

Sem precisar me preocupar com o aviso da aeromoça, eu optei por me concentrar em inspirar e expirar, seguindo um cronômetro mental, na tentativa de controlar minha respiração que pela sexta vez em menos de vinte e quatro horas, ameaçava se desestabilizar.

— Atenção passageiros, o avião irá pousar — disse novamente a aeromoça. — Por favor confiram se seus cintos de segurança estão travados corretamente e não saiam de seus assentos até uma segunda ordem.

Conferi pela quinta vez a situação do meu cinto e fechei os olhos, agarrando com força os braços da poltrona enquanto sentia o coração acelerar. Eu permaneci imóvel por segundos, mal conseguindo respirar, e quando senti as rodas do avião encontrarem o chão, o pânico novamente me ameaçou deixar à mercê. Todas as vezes era a mesma coisa.

— Pouso realizado com êxito. Obrigada pela colaboração.

Abri um olho, depois o outro.

O avião lentamente estava diminuindo a velocidade. Olhei na janela e vi a pista de decolagem, o chão, a terra... tão próximos de mim.

— Graças à Deus... obrigada, Pai.

Soltei a respiração e lentamente retirei minhas mãos do couro da poltrona enquanto uma garota sentada do outro lado do corredor me encarava com desdém, como se eu fosse louca. Lancei um olhar para ela de "o que foi?" ou "está olhando o quê?", então ela revirou os olhos e concentrou sua atenção em outro lugar.

Quando finalmente fomos liberados para descer, segui os outros passageiros e retirei minha mala da esteira. No horário local, pouco se passava das dezenove e trinta da noite e ao ver a sequência de mensagens de Max que vinham sendo enviadas desde mais de meia hora antes, tive que optar por elas antes de ligar para minha mãe avisando que havia chegado bem.

Apertei numa das notificações do aplicativo e esperei que meu celular me direcionasse para lá. Abri a aba de Max e encontrei várias mensagens, mas a única que de fato era algo importante, e não apenas especulações perguntando se estava bem ou algo do tipo, foi a seguinte:

Tia Jane disse que viria para a casa de praia dela aqui em Vancouver, passar o feriado de Páscoa, mas não poderia ir até a fazenda pois voltaria para Toronto logo e acabaria perdendo o voo de volta. Então mesmo sendo de última hora, por causa da tia Jane e de algumas outras coisas que aconteceram, mamãe e eu viemos para a cidade passar a Páscoa aqui também, então você nem vai chegar a ir na fazenda. Estamos te esperando na casa dela. Fique bem.

Digitei um "Ok." e enviei, enquanto arrastava minha mala pelo salão lotado, em busca da saída. Já do lado de fora do aeroporto, procurei na lista de contatos do celular o número da minha mãe e coloquei chamar, na esperança de ouvir sua voz. No entanto, a ligação foi encaminhada para a caixa postal. Como outras diversas vezes naquela semana.

Do Outro Lado do AtlânticoOnde histórias criam vida. Descubra agora