Capítulo 38

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Pelo incrível que poderia ser, o voo até Madrid não era o que mais me assustava naquele momento.

Embora estremecesse todas as vezes que me lembrava da sensação que era estar em um avião durante uma decolagem, o que realmente estava fazendo minhas pernas tremerem era a ideia de ficar em um salão com praticamente toda a nobreza do mundo inteiro. Mesmo que vários países enviassem seus representantes de relações exteriores para esse tipo de evento, os comissários costumavam ter um ar tão superior e arrogante que poderiam parecer até mais impiedosos que os reis e rainhas de certos países.

Eu estava mergulhada nesses pensamentos quando uma voz masculina soou pelos autofalantes do salão do aeroporto, anunciando que deveríamos nos dirigir à área de embarque.

— Você está bem? — Henri perguntou. — Parece tensa.

Eu apenas assenti ao me levantar, limpando o suor de minhas mãos nas pernas da calça. O tempo desde a saída de Arcachon, a chegada em Bordeaux e a espera no aeroporto não estavam me ajudando.

Então, acompanhando os outros passageiros, seguimos os funcionários do aeroporto que nos guiaram até nosso avião, enquanto eu tentava ocupar minha mente com a lembrança da despedida de Anne. Ela havia sido tão cuidadosa e preocupada que chegara a me lembrar de minha mãe. Havia me pedido para ligar quando chegasse lá e que se Henri permitisse que alguma coisa acontecesse comigo ela mesma lhe mostraria as consequências.

— Anne, o papel de cuidar é meu. É você quem está sob minha responsabilidade, não ao contrário! — Dei-lhe um beijo de despedida, ainda rindo. — Agora não se preocupe, eu retornarei viva.

Ela apenas me encarou de sobrancelhas arqueadas, em um aviso silencioso: "Não me subestime, Clara Rachel."

— Clara? — Henri me chamou.

— Sim? — respondi, me virando para ele depois de conferir novamente se meu cinto estava realmente preso. Pela terceira vez.

— Você está tensa. — Não foi uma pergunta, isso era notável de longe.

A voz da aeromoça soou no autofalante do avião, dessa vez avisando que a decolagem estava prestes a ser iniciada e explicando como deveríamos nos comportar em caso de emergências. Conferi outra vez meu cinto, apenas por segurança, e olhei outra vez para Henri que ainda mantinha os olhos em mim.

— Eu tenho pânico de decolagens e pousos — expliquei, enquanto sentia o avião começar a se movimentar e minha boca secar instintivamente. — Tenho aerofobia.

Ele sorriu o suficiente para que eu vesse os dentes perfeitamente alinhados e brancos.

O quê? — murmurei, arqueando uma sobrancelha.

Henri não respondeu. Simplesmente procurou minha mão e a segurou sobre os braços de nossas poltronas.

— Talvez isso possa ajudar — sussurrou, apertando um pouco mais minha mão. — Se ficar com medo é só apertar.

Me virei para a frente novamente, tentando aliviar a agonia que eu já havia sentido tantas vezes naqueles últimos meses mas nunca se tornava normal. Fechei os olhos e respirei fundo.

— Ok, isso não está resolvendo — Henri falou e eu me virei para ele outra vez, aliviando o aperto em sua mão que até então não havia percebido estar tão forte. — Olhe nos meus olhos. E não desvie enquanto não estivermos totalmente estabilizados no ar, está bem?

Eu já estava atordoada demais para questionar, então apenas o obedeci e fixei os olhos em suas íris verdes que pareciam captar cada detalhe do meu rosto. Quando senti o movimento do avião sair do chão e meu corpo ficou completamente imóvel eu tentei me concentrar unicamente nos movimentos de seus olhos fixos em mim, então quando sentia o pânico ameaçar voltar, de alguma maneira Henri percebia e apertava um pouco mais minha mão.

Do Outro Lado do AtlânticoOnde histórias criam vida. Descubra agora