Capítulo 25

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Sentia o mundo girar ao meu redor. Era como se eu conseguisse ver o chão se quebrar sob meus pés, e logo em seguida ser sugada pela fenda aberta na terra. Tudo tão de repente que eu não tive tempo nem mesmo de esboçar alguma reação.

Por que leucemia? Por que logo com ela? Anne era só uma garota que já havia sofrido demais pela sua idade!

— Senhorita, Clara? — A doutora se levantou atrás da mesa.

Com as costas da mão, limpei uma lágrima que havia escorrido pela minha bochecha.

— O que a senhora propõe? — murmurei, levantando os olhos para ela.

Ela suspirou antes de se sentar novamente.

— Como já disse a doença está em um estágio ainda considerado intermediário... Não está mais no início, mas felizmente, ainda há partes do corpo de Anne que não foram atingidas. Porém, temos que agir rápido. Se não houver tratamento, em alguns dias a doença pode entrar no estágio grave. — Laurent juntou as mãos a frente do rosto e pareceu pensar por alguns instantes, com os olhos fechados. — Eu sugiro tentarmos a quimioterapia. Injeções de três em três dias e remédios de uso diário. Esperaremos o resultado e se acaso não der certo, teremos que ir em busca do transplante de medula óssea. Normalmente apenas com a quimioterapia o corpo do paciente já costuma responder ao tratamento e contra-atacar o câncer, mas em todo caso devemos estar prontos para se eventualmente isso não ocorrer, e assim, recorrermos imediatamente ao transplante, que devo ressaltar, deve ser o último caso.

— E teria como a gente ter percebido isso antes? Os sintomas da Leucemia? Uma maneira de termos a descoberto antes?

— Existem sintomas muito comuns como dores de cabeça, pontadas fortes, sangramentos, sensibilidade e manchas avermelhadas na pele... Porém, eles podem facilmente passar despercebidos por se tratar também de sintomas de doenças mais simples.

Encarei o chão. O medo, o arrependimento e raiva tomando conta de mim. Eu havia presenciado todos aqueles sintomas, mas estava cega. Não havia conseguido perceber que algo estava errado, que Anne não estava bem.

— Clara?

Levantei os olhos e encarei a doutora outra vez.

— Eu posso vê-la? Eu queria poder contar para ela... por favor.

Doutora Laurent assentiu.

— Claro, sem problemas — respondeu se levantando, então deu a volta na mesa e caminhou até a porta, a abrindo para mim. — Só que Anne ainda pode estar sob efeito da anestesia local que aplicamos para fazer a coleta da medula, então ela só pode ficar deitada, não a permita se levantar, tudo bem?

Assenti, atravessando a porta.

— Suba até o nono andar, entre no primeiro corredor a esquerda e depois a direita, Anne está na segunda porta a direita, possivelmente na companhia de algum enfermeiro, mas pode entrar sem problema nenhum.

Com um breve aceno de cabeça a agradeci e caminhei até o elevador, apertei no botão que correspondia ao nono andar e esperei as portas se fecharem. Quando elas se abriram novamente, fiz todo o percurso que a doutora havia dito e encontrei o quarto que ela falara.

Levantei a mão para bater na porta, mas hesitei. Escorei as costas na parede branca e soltei um longo suspiro. Não seria fácil a encarar. Ver seus olhos brilhando e saber que dentro dela, células indesejadas e imaturas estavam se formando e a destruindo pouco a pouco.

Me esforcei em controlar a respiração, desapoiei-me da parede e depois de três batidas rápidas na porta, a abri e entrei no quarto branco, sendo recebida por um sorriso cansado de Anne.

Do Outro Lado do AtlânticoOnde histórias criam vida. Descubra agora