Felipe Ribeiro
— Vai com Deus, mãe. — disse com os olhos marejados — Te amo, você é minha rainha. — o choro veio incontrolável.
— Tá bom, Felipe. — Johny me guiou pra longe do túmulo, mesmo contra a minha vontade — Fica assim não, ela tá melhor agora.
— Minha vida acabou, Johny. — disse chorando — Que que eu vou fazer sem ela, cara? — solucei.
— Cê vai morar comigo a partir de hoje. Depois eu te dou um barraco, mas agora cê é minha responsabilidade, menor, fica assim não. — disse me abraçando de lado.
Abri meus olhos vagarosamente, me deparando com um quarto de paredes lilases, teto branco e uma janela de vidro com uma rachadura, que tinha como paisagem um muro de chapisco, mesmo sem ver o céu, dava pra perceber que estava anoitecendo pela pouca luminosidade. Me sentei com dificuldades na cama e meu lençol caiu, fazendo eu perceber que o ar-condicionado estava ligado. Eu conhecia aquele lugar parcialmente, algumas coisas haviam mudado, mas eu tinha certeza que eu já estivera lá.
Minha cabeça latejava insistentemente, mexi minhas pernas e ao sentir uma dor suportável em uma delas, me lembrei que havia sido baleado e que eu havia me escondido na casa da Denise, só aí me dei conta que aquele quarto era o da Amanda. Estava um pouco modificado, mas minimamente. Coloquei meus pés nos chão e me levantei com dificuldade, ficando em pé de frente pro espelho que havia no armário dela e percebendo que...— Que porra é essa? — disse com a voz sonolenta — Tá de sacanagem, parceiro. — disse me olhando.
Eu estava de vestido. A porta do quarto abriu e a Amanda entrou com o celular na mão, digitando. Ela nem havia me percebido acordado e em pé. Só percebeu quando olhou pra cama e não me achou.
— Que porra é essa, Amanda? — disse sonolento, a olhando.
Ela ajeitou a postura e acendeu a luz do quarto, indo até a porta do mesmo e dizendo em bom tom:
— Mãe, o Felipe acordou.
— Tô indo, calma aí! — disse gritando.
Ela voltou a atenção pra mim e suspirou, a mesma estava de cabelo preso, com um short de pijama e um topper, era incrível o jeito que ela conseguia mexer comigo mesmo estando vestida da forma mais simples.
— Tá se sentindo bem? — disse se aproximando.
— Por que eu tô de vestido? — meus olhos ainda se adaptavam a luz do quarto.
Ela sorriu sem mostrar os dentes e a mãe dela apareceu com um copo d'água e com duas caixas de medicamento na mão, a mesma me olhou sorrindo.
— Que bom que cê tá bem, meu filho. — disse com ternura — Senta — disse me empurrando levemente —, tá sentindo dor?
— Mais ou menos. — disse me sentando — Coé, tia, e a minha roupa? — disse a olhando com os olhos miúdos.
— Tá quase seca, eu tô secando no ferro. — disse gentilmente.
— Eu uso molhada mesmo, tem caô não, pega lá, Amanda. — disse a olhando.
Ela virou os olhos e negou com a cabeça, chegando mais perto com os braços cruzados.
— Até que cê ficou bem de vestido, sabia? — disse rindo.
Permaneci sério e piscando repetidas vezes, tentando amenizar o ardor que a luminosidade estava causando, enquanto ela ria da minha reação, não estava achando o mínimo de graça.
— Para, Amanda. Sabe que ele não gosta. — disse colocando duas pílulas na mão — Toma, pra passar a dor. — a Denise sorriu.
Tomei em silêncio e a devolvi o copo.
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Entre A Paz E O Caos
RomanceUma jovem de dezoito anos, negra, periférica, nascida e criada na favela da Rocinha, localizada na Zona Sul do município do Rio de Janeiro. Com um pai ausente, foi criada sozinha pela sua mãe. Seu maior sonho é ingressar em uma faculdade e sair de o...