Acordei com a cabeça latejando, e a luz novamente atrapalhou minha visão, sentei-me e esfreguei os olhos. Tentei me levantar, mas minha perna ainda estava presa pela aquela maldita corrente.
— Já acordou? — Olhei para cima, e o Sombra da Noite me encarava.
Não sabia quanto tempo tinha se passado. Estava com ódio à flor da pele, eu queria matá-lo. Olhei para frente encontrando o corpo de Jason ainda pendurado, sem camisa e agora com vários tubos saindo de seu peito, seu sangue estava sendo coletado mais rápido. Sua cabeça baixa e o corpo mole me fazia crer que ele estava quase morrendo. Sua pele pálida e o sangue enchendo os sacos sem parar. Os capangas trabalhavam em sincronia colocando as doses em pequenos frascos numa estante metálica.
— Ele está morrendo! — Eu gritei e comecei a chorar.
— Também achei que duraria mais! — O Sombra da Noite disse com desdém, e caiu na gargalhada.
Ele era um sádico maníaco, não era mais meu tio, o homem com quem eu cresci. Como ele mesmo disse era o próprio diabo, e agora eu começava acreditar nele. Às vezes queremos tanto que a verdade seja mentira que acreditamos na melhor opção que vem nas nossas mentes. Eu queria tanto que Tio Rob não fosse um monstro demoníaco que acabei acreditando no que eu queria.
O peito de Jason já se movia lentamente. Ele estava morrendo e me deixando.
"Estava me deixando para sempre".
— Me deixe me despedir dele. Por favor? Só quero me despedir. — Implorei tentando usar meu tom calmo para tentar compeli-lo, talvez o homem que um dia me viu crescer ainda estivesse ali.
Ele me olhou por um momento e sorriu, não o sorriso de tio que ele normalmente dava, estava mais para um sorriso que gostava de ver o sofrimento alheio. Então assentiu com a cabeça e fez sinal para um capanga vir me soltar.
— Vou te deixar, somente porque Jason já está praticamente morto, e porque mesmo sem saber, você me ajudou com isso. Mas se você tentar escapar ou fazer qualquer coisa, ele te matará. — Ele apontou para um capanga que segurava uma arma apontada para mim.
Concordei quase sem respirar.
Assim que meu tornozelo foi liberado, ergui meu vestido e corri em direção ao corpo de Jason, me juntando a ele e segurei seu rosto entre minhas mãos. Eu queria tirá-lo dali. Tirar esses tubos que estavam sugando sua vida, que estavam tirando-o de mim. Mas o que eu faria? Sou apenas uma idiota fraca e inútil.
Tirei seu cabelo do seu rosto e ele levemente abriu os olhos, fazendo o máximo de força que conseguia. Respirei aliviada por ele ainda estar vivo. Mas por quanto tempo aguentaria?
— Euu te amoo. — Ele disse num diminuto sussurro.
Quase não escutei suas palavras, mas pude ler seus lábios. Comecei a chorar sem conter toda a tristeza que invadia meu peito. Toda a dor de perdê-lo para sempre.
— Desculpa não dizer que te amava quando eu já sabia que amava. — Eu disse em meio aos soluços e beijei seus lábios delicadamente.
Ele me olhou e com o resto de força que ainda tinha, sorriu para mim, me fazendo querer que somente uma vez na vida eu fosse capaz de salvá-lo. De não ser fraca e inútil, de poder fazer algo para recompensá-lo por tudo que ele fez por mim.
Então percebi que um único instante pode mudar tudo.
Muda o momento. Muda a situação. Muda sua vida. Muda suas atitudes.
Naquele mísero instante, insignificante, tudo mudou. Minha vida passou por mim, como num trailer de um filme e na maioria das cenas, Jason estava comigo.
O que senti naquele minuto, não tinha explicação. A dor atravessou meu peito, como se uma faca tivesse sido enfiada nas minhas entranhas, rasgando meu coração, quebrando cada osso e explodindo meu cérebro. O sangue retumbando em minhas veias com a adrenalina que começava a ser bombeada para cada célula do meu corpo.
Ardendo.
Aquilo era quase impossível de acreditar, algo que nunca imaginei acontecendo, mas eu sabia exatamente o que fazer.
Enchi-me de coragem e deixei que toda a raiva que eu sentia, me desse força. Pelo menos uma vez na vida, eu faria algo útil, nem que para isso, eu tivesse que morrer.
Pulei para longe de Jason, acertando um chute nas partes baixas do capanga a minha direita que segurava a arma apontada para mim, ele caiu se contorcendo e eu corri em direção à prateleira metálica. Peguei uma seringa com o sangue de Jason, contaminado pelo soro Prodigium.
Uma única dose, era o que eu precisava. Uma única dose, mudaria tudo.
Antes que o outro capanga me alcançasse, sem pensar duas vezes, injetei o soro em mim, bem no meio do meu peito. Direto no coração.
Jason usando seu resto de vitalidade, gritou sem saber qual era meu plano. Sem entender que agora poderíamos ter uma chance.
— Meu amor! Não meu amor! NÃOOO!
Ele não sabia que o soro que tinha transformado ele numa fera, havia sido criado a partir do meu sangue. Ele achava que o soro Prodigium me mataria, como matou tantos em que o soro não era compatível. Eu torcia para que sendo assim, o soro se misturasse ao meu organismo me transformando no que Jason era. Dando-me a força que eu precisava para salvá-lo.
— O que você fez? — O Sobra da Noite gritou alto, fazendo meu cérebro zunir.
Meu coração começou a acelerar batendo tão alto que podia escutá-lo retumbar nos meus ouvidos.
Raiva começou a correr por minhas veias, tomando conta de mim. Minhas veias pareciam que iriam explodir junto com meu cérebro. Coloquei a mão na cabeça e gritei sem conseguir me conter.
— HAAAAAA! — O eco se expandiu pela sala, parecendo fazer tudo vibrar.
Aquilo estava tomando conta de mim, se aderindo ao meu corpo e se tornando uma parte minha, mas não podia me deixar levar. Eu tinha um propósito. A vida de Jason era tudo que importava para mim nesse momento. Tentei me controlar e me concentrar o máximo que podia. Deixei meu corpo absorver cada gota da droga, me transformando no pior que eu poderia ser.
Olhei para frente vendo uma mosca pairando no ar, suas assas batendo lentamente, eu poderia até pegá-la se quisesse. Escutei ao longe um pingo de água cair no chão, fazendo um eco na minha cabeça em cada pingo que caia. Quase me ensurdecendo. O cheiro metálico de sangue invadindo minhas narinas.
Senti tudo ferver dentro de mim como se meu corpo estivesse entrando em ebulição. A droga estava se misturando com meu organismo, se unindo a cada célula, juntando-se e me fazendo forte.
Dando-me esperança.
Então de repente tudo parou. O zunido se alastrou afinando, sumindo como se estivesse longe. Todos pareciam estátuas, podia ver o rosto de cada um. O do Sombra da Noite espantado, o de Jason confuso e agoniado e os dos capangas apavorados. Como se a cena tivesse dado pause em frente aos meus olhos.
Ergui minha cabeça fixando meu olhar no Sombra da Noite que me encarava fixamente também. Minha respiração acelerou numa velocidade surreal e eu podia ouvir meu coração batendo num som alto e forte demais.
Tum Tum Tum Tum
Cerrei os punhos ao lado do meu corpo. Agora estava pronta para atacar.
Dessa vez, eu iria proteger.
Dessa vez, eu seria o monstro.
Continua...
VOCÊ ESTÁ LENDO
A Protegida (Segundo livro da trilogia Salva-me)
RomanceAngel está desolada. Jason desapareceu de sua vida a deixando apenas com lembranças, e a incerteza de que tudo o que viveram talvez tenha sido apenas um sonho. Angel decide tentar voltar a viver mesmo que as memórias ainda a machuquem. No entanto qu...