A Mais Forte (What If...?/AU) [CONCLUÍDO]

TRÊS

Meu aparelho vibra e vou servir outra pessoa. Evangeline ainda não se mexeu, como se estivesse esperando algum sinal para começar a agir. Parece que o destino está me pregando uma peça, pois estou sempre servindo pessoas que estão sentadas perto de parapeitos, em um camarote mega privilegiado ou próxima a algum televisor que foca diretamente na magnetron no centro da arena. Um aviso. Você não é tudo isso.

Minhas bochechas esquentam com esses pensamentos. Não que eu me importe. Eu não me importo. Estou longe de me importar. Não tem por que disso. Sou apenas uma criada que faz pouco caso da família real, como os outros.

Antes de eu voltar para a fila, Evangeline finalmente se move. Ou as peças de sua jaqueta fazem isso por ela. Os metais flutuam como se estivessem sendo suspensos por uma corda invisível. São pontudos, clamam por causar feridas profundas. Num piscar de olhos, as peças de metal são lançadas para longe iguais as balas dos soldados do Exército, perfurando as paredes de concreto e pó. Percebi que uma delas atingiu e atravessou até o escudo elétrico.

As palmas animadas ressoam de diversos camarotes ao redor. Mas eu tenho um breve conhecimento sobre Evangeline. Eu sei que ela não parou por aí. Ainda nem começou.

Como o esperado, rangidos e tremores vêm do subterrâneo do Jardim Espiral. Temo pelo pior. Evangeline não vai parar até conseguir conquistar o coração de todos com a sua performace, principalmente o do príncipe Cal. Num único puxão, os canos mais profundos vem à tona. Parecem cobras de metal escuro, se enrolando e se contorcendo no ar. Escondem Evangeline dentre os seus braços de metal, uma cúpula de sucata enferrujada e úmida. Posso vê-la rir.

De repente, os canos caem no chão num barulho estrondoso. Mas Evangeline ainda não terminou. Está claro nos seus olhos. Ela olha para cima de boca aberta, obcecada por vencer essa batalha. Com um sorriso estranhamente sádico, Evangeline estende a mão para os camarotes superiores. No mesmo instante, sinto a estrutura tremer sob meus pés. O tremor cresce mais e mais, transformando a admiração dos convidados em puro pavor. Mas ela não para.

Criados correm dos parapeitos e mesas para se protegerem da ameaça. Se escondem nas escadarias mais baixas, longe do camarote. Tento fazer o mesmo, porém algo me puxa de volta. Atinjo violentamente as costas no parapeito de pedra, o que me causa falta de ar. Olho de relance para trás e percebo que Evangeline, com os seus poderes mega afiados, está sorvendo nosso camarote na direção do escudo elétrico, bem no interior da arena, como se estivesse usando uma corda. E eu estou prestes a ser sua primeira vítima, o primeiro exemplo de sua força.

Mas, como ela, eu não pararei tão fácil.

Com os braços, empurro o meu corpo e torno a correr o mais rápido que posso. Alguns criados estão em pânico, imóveis de tanto medo. Sou obrigada a ajudá-los, senão eles também vão virar churrasco. Desvio de mesas e cadeiras tombadas, talheres e pratos quebrados que estão espalhados ao redor. Levo um tempo para convencer uma garota a se mexer. Mas ela, enfim, se move mais rápido do que o esperado, sendo guiada pelo cardume de uniformes vermelhos.

A saída está logo à minha frente. O camarote se inclina mais uma vez e quase vou junto. Boto força em minhas pernas para andar até a saída. Entretando, uma criada em especial desvia minha atenção. Mare, assim como eu, tenta se libertar do peso que seu corpo faz sobre o parapeito. Penso em seguir novamente para as portas, mas o bom senso fala mais alto.

- Ei! - Grito para chamar sua atenção. Ela o faz na hora. O medo é sólido para a novata. Está lá embaixo, é roxo e transforma as pessoas em carne queimada.

- Por favor, me ajuda! - Mare estende o braço, tentando agarrar algo invisível. Sem medo de cair, avanço e, ao invés de pegar na sua mão, a puxo com tudo. Ela cai atrás de mim na mesma hora em que Evangeline faz um movimento com a mão. O camarote se inclina abruptamente, me jogando para fora. Me seguro a tempo no parapeito apenas uma mão.