Ela parece uma estátua de tão surpresa que fica. Por essa ela com certeza não esperava. Muito menos eu.
- Lauren - diz num sussurro quase inaudível.
Não sei definir o que sinto. Raiva, frustração, tristeza, desapontamento, abandono, vazio. É devastador. Isso só prova o quanto envolvida eu estava - estou - nessa situação. O quanto eu não deveria estar.
- Eu não acredito nisso - é tudo que consigo dizer, ainda em estado de choque.
- Lauren, e-eu posso explicar - sua voz tremula, gagueja, não tem força. Aquilo me cortaria o coração, mas ele já está destruído.
- Não. Não pode - começo a liberar parte da raiva.
- Por favor, Lauren - ela começa a se desmanchar em lágrimas. Não consigo me condoer com isso. Acho que nunca mais vou conseguir me sentir solidária com ela.
- Você vai me explicar o quê, Camila? Que você fode com qualquer um ou qualquer uma que pague por isso? - não espero que ela responda. Não consigo. Nem sei como estou falando. - Ou será que você quer me explicar como é todo o processo? Ou como você escolhe as roupas, músicas e movimentos? Talvez você queira me dizer qual é a sensação que sente ao subir em cima daquela porcaria de palco e ver todos aqueles homens e mulheres te comendo com os olhos como se você fosse um oásis no deserto? Ein? Será isso?
- Não... não é isso, Lauren - tenta. Não há nada que ela possa fazer agora. Nada que possa conte tudo que estou sentindo.
- Nada que você me fale vai mudar o que eu vi ou o que você faz. Nada que você quiser falar vai mudar o que você está fazendo comigo agora. Nada. Nada vai tirar isso da minha cabeça - meu tom ainda continua, ironicamente, baixo e controlado.
De repente, me vem um desespero, como se aquilo fosse um filme de terror real. Não consigo acreditar. Quero acordar. Alguém me sacuda e me chame. Isso é demais pra minha cabeça. Nem mesmo eu posso lidar com isso.
- Laur... Por favor... - não sei por que ela tanto pede por favor, está começando a me irritar. A situação toda, desde o começo, está começando a me irritar.
- Por favor o quê? Quer que eu beije seus pés? Quer o quê? Que eu fique feliz por você ser experiente? Quer que eu saia por aí pulando por que você realmente é diferente da maioria? Vamos, me diga o que você quer - começo a aumentar o tom de voz.
- Não - murmura e desliza pela parede até chegar ao chão. Chora tanto que não sei como ela consegue respirar, isso me irrita. Me irrita muito. Tudo que ela faz me irrita. Cada respiração. Cada movimento. Cada pensamento que ela tiver ali dentro daquela cabeça.
- Não o quê? Diga alguma coisa - solto um riso totalmente descontrolado, regado a ódio e raiva. - Ou não diga, porque não vou acreditar. Porque na verdade você só é mais uma vagabunda que se vende sem nenhum escrúpulo por aí. Só mais uma puta que já passou as mãos pelo dinheiro de qualquer imbecil que te compra como se você fosse um pedaço de carne - essa linha de pensamento me atormenta. - Você é só mais um puta! - grito, a indignação me roendo de dentro pra fora.
- Lauren... e-eu... - me olha como se aquilo fosse surtir algum efeito. - eu sei que vo-você não merece isso. Desculpa - sua respiração é trêmula, como se o choro dela nunca fosse parar, mas eu acho pouco. Muito pouco. - Eu soube que você era diferente desde o começo, Lauren. Desculpa, por favor. E-eu te amei desde a primeira vez que e...- interrompo, isso é demais.
- Você o quê? Ah, pelo amor de deus! NÃO VENHA ME DIZER ESSE TIPO DE COISA! PESSOAS COMO VOCÊ NÃO SENTEM ISSO. NÃO SEJA RIDÍCULA. DESDE QUANDO UMA MULHER QUE DÁ PRA TODOS E QUALQUER UM É CAPAZ DE SENTIR ALGUMA COISA COMO AMOR? - Perco o controle. Não é possível que ela chame isso de amor. Ela se encolhe totalmente, como se eu a estivesse agredindo, e em algum lugar do meu ser eu sinto vontade de fazer isso. Sorte minha que não sou assim. Ou não costumava ser.
Levanto e começo a andar de um lado para o outro. Por que ainda estou aqui? Ela significa muito pra mim, mesmo que nesse pouco tempo. Parece que alguém está me triturando por dentro lentamente. Fecho as mãos com tanta força que os nós dos meus dedos devem estar brancos. Começo a lembrar das últimas semanas, cada peça se encaixando numa peça antes oculta.
- Era por isso que você não podia se envolver, não é? Foi por isso eu fiquei a noite toda te esperando na frente do seu prédio? Por isso que você sempre desaparecia. Por isso eu ficava te procurando naquela porcaria daquele pub - suspiro, me sinto cansada e meus nervos vem à flor da pele. Perco o controle sobre meu tom de voz. - Enquanto eu estava lá te esperando como uma retardada, você estava aqui fodendo com qualquer um a noite toda, por dinheiro! - Esbravejo. - Como você conseguia dormir a noite sabendo que eu estava lá esperando um misero sinal seu? Você sequer devia lembrar! SUA PUTA DESPREZÍVEL! NÃO ACREDITO QUE CAÍ NA SUA! NUNCA MAIS APAREÇA NA MINHA FRENTE. NÃO OUSE ME LIGAR. NÃO OUSE PRONUNCIAR MEU NOME OUTRA VEZ. NÃO QUERO SABER QUE MERDA ACONTECE COM VOCÊ. NÃO QUERO OUVIR SEU NOME NUNCA MAIS!
A porta se abre num estrondo e entra um cara Gigante - Claro sua tapada, qualquer cara perto de você é gigante - Olha para Camila, como quem pergunta se está tudo bem e ela continua apenas se debulhando em lágrimas, desprezível como é. O cara avança sobre mim tentando me intimidar, mas estou com tanto ódio que vou pra cima dele também, pensando que posso bater nele, descontar minha raiva numa pessoa que me esmaga só com dois dedos. Mas na hora sequer ligo pra isso.
Minha visão está turva por causa da raiva. Não consigo articular nenhum pensamento, nenhuma palavra, nada. O cara continua avançando na minha direção e nós nos encontramos no meio do quarto. Tento desferir um soco na sua cara e ele segura meu braço girando-o dolorosamente. Mesmo assim não fico quieta. Por isso, levo um soco no estômago e fico sem ar. Caio no chão e faço menção de me levantar, mas quando o cara percebe minhas intenções me agarra pela jaqueta e me leva pra fora e me joga na rua descuidadamente.
A raiva me domina, mesmo no estado que me encontro. A dor não me deixa pensar. Vejo a Camila vindo em minha direção e uso todas as minhas forças pra me levantar e ir embora.
Olha só minha situação: uma professora apanhando por uma puta, sem o mínimo de dignidade - não só ela, como eu também, agora.
Ela fala qualquer coisa e tenta me segurar. Me desvencilho dela de qualquer jeito, sem ver se a machuquei ou não. Atravesso a rua a passos largos e com sorte por não ser atropelado. Entro no carro, giro a chave na ignição e piso fundo no acelerador. Ela diminui rapidamente no vidro do retrovisor. Ela desaparece. Para sempre.
Dirijo de modo imprudente. Recebo xingamentos, buzinadas, dedos do meio. Não me importo. Que vão todos para o inferno. Não quero saber dessa merda. Só quero deitar na minha cama e dormir um sono pesado e sem sonhos. Dormir por dias a fio. Mas é obvio que vou para o pub onde esse inferno todo começou. Pra quê mais digno?
Meu celular começa a tocar incessantemente, apenas o pego e jogo de encontro a algum canto do carro. Ele não para de tocar, mas o som se abafa por qualquer coisa que encontrou no caminho.
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Bittersweet Discoveries (Camren)
RandomEssa fic é uma adaptação, a original é de uma amiga minha, mas como amigos são lindos ela me deixou adaptar... Enfim, Sem mais delongas né. Tem dia mais preguiçoso que segunda-feira? E uma segunda-feira cheia de lembranças de um passado que você de...