Surpresas agricodes

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Logo o médico começou a nos inteirar e eu começo a desejar ter ficado às escuras. A situação é grave, pior do que eu poderia imaginar. A histeria da Dinah aumenta mais e mais a cada palavra que o médico vai deixando pairar no ar.

- Bom, Eu sou o Dr. Simon e vou acompanhar a paciente Camila. Vou deixar vocês interados do que esta acontecendo com ela. Camila sofreu lesões que ocasionaram uma hemorragia interna que já está quase totalmente sob controle - o Dr. Simon diz, num tom profissional. - Além disso, ela está muito machucada, cheia de arranhões e hematomas, devido à batida e por ela ter caído no asfalto. É provável que ela tenha batido a cabeça, nós estamos cuidando disso também - ai meu deus, só mais e mais noticias ruins, parece que o relatório não acaba nunca. - Nós demos a ela alguns sedativos, deixando-a em coma induzido, devido à hemorragia e o desconforto que ela pode causar, mas é temporário, só por agora - coma? A situação realmente é tudo aquilo que eu não queria pensar.

Respiro fundo. Não consigo nem olhar para a Dinah, porque sei que ela está totalmente arrasada. Eu mesma estou. Não queria ter que ouvir todas essas coisas sobre a Camila. É pior do que aquela noite. E eu achava que aquela seria a pior noite da minha vida, para sempre. E não foi. Eis aqui a pior noite da minha vida: horas de espera, angústia, notícias e mais notícias ruins sobre o quadro da Camila. E eu achando que nem me importava mais com ela.

Mas me importo, penso, e muito. Essa situação - deplorável - da Camz chega a doer até no meu pedaço mais revoltado com ela. E, por mais inacreditável que seja, é uma dor sincera, avassaladora.

- Doutor Simon, por favor, faça de tudo para que fique tudo bem - me parece horrível e inaceitável a ideia de perder-la, embora ela não seja minha.

- Estamos fazendo, Lauren - Estou tão atordoada que nem me lembro de ter dito meu nome ao Doutor. Aceno para o ele e ele tem que sair para cuidar dos pacientes e da Camz.

- Dinah - chamo, assim que volto a ter consciência de que ela está comigo.

- Oi? - parece voltar de algum transe.

- Vai ficar tudo bem - tento convencer nós dois.

- Tem que ficar - choraminga.

- E vai - reafirmo e a chamo para sentarmos, já que não podemos fazer nada.

O tempo vai se arrastando muito lentamente. Pessoas entram e saem várias vezes. A Dinah não diz muita coisa, está abatida e triste, e às vezes chora silenciosamente, sem chamar atenção.

Às vezes pergunto se ela precisa de algo, mas a resposta sempre é não. Levanto, compro um café, mas volto logo, não quero estar ausente se houver alguma notícia.

Lá pelas três ou quatro o médico reaparece.

- O efeito do sedativo da Camila já diminuiu, agora ela está apenas dormindo normalmente. Preciso que um de vocês fique com ela no quarto, a qualquer momento ela acordará - informa.

- Quem não for acompanhá-la pode vê-la? - Dinah fala pela primeira vez em um período de tempo longo.

- Não poderia, mas vou deixar, porém bem rápido.

- Tudo bem - sua voz parece um fio prestes a arrebentar.

O médico se vira e vamos atrás dele. Andamos por entre os corredores e vemos mais e mais pessoas doentes, em tratamento. Realmente não é um bom lugar para se estar.

A ansiedade e o medo começam a crescer em mim. Fico imaginando como ela deve estar, mas afasto todas as imagens que minha mente começa a criar. Torço para que a descrição do médico tenha sido exagerada, que ela não esteja coberta de arranhões e hematomas - mesmo sabendo que ele não mentiria.

Menos de cinco minutos depois nós paramos em frente a um dos apartamentos individuais. Eu e a Dinah nos olhamos, ambos com medo de ser o primeiro a vê-la e de ver a reação do outro. E é outra situação horrível. O Dr. Simon diz que precisa ir e ensina como chamá-lo quando ela acordar.

A Dinah põe a mão sobre o trinco da porta e entra. Fico esperando inquieta. Quero saber como ela está, vê-la, ouvi-la.

Menos de dois minutos depois, a Dinah sai de dentro do quarto totalmente abatida e chorando desesperadamente.

- Eu... Eu não consigo ficar lá dentro, Laur - diz em meio às lágrimas.

- Calma - eu que preciso de calma agora! - Já já tudo volta pra seu devido lugar.

As lágrimas da Dinah ensopam minha camiseta e pouco depois ela diz que precisa de um café forte. Sai a procura do café e me deixa ali, com medo de ver a situação da baixinha.

Tomo coragem e abro a porta lentamente. De longe parece tudo bem, como se ela estivesse deitada ao meu lado na cama e eu a estivesse admirando. Ando lentamente em sua direção e percebo que não está nada bem. Ela realmente está arranhada e com manchas arroxeadas delineando os arranhões ou marcando outros pontos de sua pele. Está inchada devido aos machucados, creio eu. Respira levemente, como se para ela estivesse tudo bem. E não está.

Engulo em seco, sentindo meus olhos querendo desviar da imagem que se projeta a minha frente. Eu nunca quis te ver assim, digo mentalmente. Fico ao lado da cama e passo os dedos levemente por sua bochecha, e vejo que há uma marca roxa em volta de um de seus olhos - estranho. Sinto uma espécie de culpa, como se eu tivesse provocado aquilo - mesmo sabendo que não provoquei.

Me dói até a alma vê-la assim. Puxo a poltrona, sento rente a cama e seguro sua mão esquerda com as minhas e encosto minha cabeça na beira do colchão.

- Ô, Camz, que coisa horrível - murmuro. - Vai ficar tudo bem - e essa frase se torna um mantra para mim.

O quarto é estéril, só agora vejo. Tudo branco, nenhuma decoração. Os cabelos cor de chocolate da Camila contrastam com o colchão e o lençol. E nada mais tem uma cor que não seja num tom pastel e morto demais.

Eu devia ter te protegido dessa vida e disso que te aconteceu, me culpo inutilmente. Eu devia ter atendido você ou respondido suas mensagens. Devia - um nó se forma na minha garganta, como se a culpa subisse e se alojasse ali.

Estou ocupada me culpando quando sinto a mão da pequena se mexer entre as minhas.

Bittersweet Discoveries (Camren)Onde histórias criam vida. Descubra agora