Capítulo 1. Vou estar aqui

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O fim da temporada está se aproximando mais uma vez, muitos casais se formaram e casamentos foram realizados às pressas na nossa majestosa ilha de Gruffin. Mas para a felicidade das solteiras da ilha, o nosso novo duque, Anthony Campbell, terminará a temporada solteiro, dando mais uma chance para as mamães casamenteiras treinarem as filhas para fisga-lo nas próximas temporadas.

Esta autora deve dizer também que se surpreende por algumas damas terminarem esta temporada de 1824 solteiras, como é o caso de Emma Campbell - que debutou neste ano e foi a dama mais falada, e elogiada, nesta coluna - e Britany Schorth.

Se 1825 reservar tantos acontecimentos como os de 1824, esta autora terá muito o que relatar a todas as leitoras dessa humilde coluna.

TABLOIDE DE GRUFFIN, por LADY EMYLINE.

Tinha um mês que Liam havia falecido, Anthony passou todo o tempo enfiado na embaixada ou no escritório de casa, tentando compreender e resolver os problemas que tinha. Por sorte o pai sempre fora muito organizado e bom no trabalho, deixou apenas questões cotidianas para trás. Anthony se enterrou em trabalho e álcool para não pensar no pai - em sua morte, para ser mais exato - e sempre que se dirigia para a mesa de mogno no meio do escritório, olhava para baixo até estar de costas para a grande pintura dos pais na parede à suas costas, ele ainda não se sentia pronto para encarar o rosto do pai, vivo e jovem naquela pintura do dia de seu casamento. O brilho que Anthony sempre tivera no olhar havia desaparecido no dia em que o pai o deixou, e Anthony duvidava que fosse voltar tão facilmente, não se sentia pronto para ir a bailes e fingir estar feliz enquanto o homem que ele mais amou no mundo estava morto há apenas algumas semanas.

Já era fim de tarde e o expediente na embaixada estava finalizado, todos saíam pela pequena porta do local, Anthony pegou sua maleta e desceu a escada enquanto se despedia de alguns dos colegas de trabalho, caminhou pela rua e cruzou-a, rumando a porta da frente de casa.

Sem nenhum pingo de entusiasmo, ele deixou que Leopold, o mordomo, tirasse seu casaco e o pendurasse no vestíbulo, então entrou para o corredor da casa.

- Anthony, já chegou? - Kate indagou, caminhando em direção ao filho, olhando preocupada para ele. - Não foi ao clube hoje?

Todas as quartas-feiras após o horário de expediente, Anthony e Joe iam juntos para o clube, que ficava a uma quadra da embaixada e da casa da família. Mas Kate sabia que ele não iria naquele dia, nas últimas três semanas ele também não fora, desde que o pai falecera.

- Não, mamãe. Tenho coisas do trabalho para fazer. – Deu um olhar sem emoção para a mãe e forçou um sorriso, mas não saiu como ele esperava.

Kate conhecia o filho muito bem e sabia que ele não tinha trabalho para fazer, sabia disso pois conhecia também o marido com quem passou seus últimos vinte e cinco anos, ele nunca deixara um assunto não resolvido para trás e nunca trouxe tanto trabalho para casa, como Anthony fazia agora. Mas ela compreendia que Anthony precisava de mais tempo para o luto, que essa era a forma dele de passar um tempo sozinho e pensar.

- Certo, vou pedir que algum criado leve um chá e biscoitos para você, acabaram de sair do forno. - Kate disse, observando o filho rumar para o escritório. - Vou estar aqui, se precisar de algo.

Ele assentiu para a mãe e passou pela porta do escritório, fechando-a assim que entrou. Abaixou o olhar e caminhou até a sua mesa.

Anthony crescera vendo o pai trabalhar naquele escritório. Sempre gostou de estar ali com ele e ver o pai trabalhar, Liam dizia que estava treinando o filho para quando herdasse o título e as responsabilidades do pai. Mas a verdade era que Anthony nunca havia se dado conta de que, para herdar isso, para fazer aquilo para o qual nasceu, teria que perder uma das pessoas que mais amava no mundo.

Um mês havia se passado. Um mês sem o pai. Tudo que ele ia fazer, a voz do pai ecoava em sua mente com algum dos conselhos ou broncas que o pai já lhe dera, aquelas broncas que soavam como uma simples conversa entre amigos, total oposto das broncas da mãe. Os dois eram completamente diferentes um do outro, Anthony tinha certeza disso, mas era incrível ver o amor dos dois, e doía nele ter que olhar para a mãe e vê-la com os vestidos pretos do luto. Se pudesse, daria sua vida pela do pai, só para ver a mãe feliz novamente, brigando com o marido e lhe dando olhares severos.

***

Ele estava sentado em sua cadeira, fitando uns papéis que segurava, mas sem realmente prestar atenção neles, quando uma criada bateu à porta, ele disse para que entrasse e observou enquanto a jovem caminhava até a pequena mesa próxima da janela e colocava a bandeja ali. Uma moça de altura média, pele muito clara e, mesmo com o lenço que cobria a cabeça dela, ele pode ver que os cabelos eram de um loiro claro, quase um marfim. Seus olhos eram grandes e cor de mel. Ela exalava inocência e graciosidade por onde passava, o que fez com que Anthony se sentisse ainda mais tentado a conhecer mais sobre a moça por trás daquele uniforme. 

- O senhor quer que eu sirva? - ela perguntou, observando-o por um instante, fazendo com que ele piscasse e voltasse para a realidade. A dama tinha uma voz suave e calma, como se estivesse contando uma história para uma criança dormir.

- Por favor! - ele disse, curvando levemente os lábios. Fitou a criada enquanto ela servia o chá com uma graciosidade surpreendente, e quando ela estendeu o pires com a xícara, ele indagou: - Desculpe a intromissão, mas é que nunca a vi pela casa, é nova por aqui?

A moça olhou para ele, receosa, e hesitou por um momento, mas acabou dizendo:

- Eu trabalho aqui já faz alguns anos, mas sou camareira no andar de baixo.

- Não entendo muito disso, mas acredito que camareiras não servem chás. - Anthony observou, levantando uma sobrancelha.

Anthony não sabia o porquê, mas sentia que precisava saber mais sobre aquela dama à sua frente.

- Não servimos mesmo. - Ela desvia o olhar, corando levemente. - Eu estava sem fazer nada e quis ajudar os criados da cozinha, eles estão bem atarefados hoje.

- Ah, sim. - Ele disse logo após tomar um pequeno gole do chá e pegou um dos biscoitos no prato que foi colocado sobre sua mesa.

A moça fez uma pequena reverência e se virou para sair do cômodo, mas antes de chegar à porta, ela se virou ao ouvir a voz de Anthony.

- Espere! – pediu ele. - Eu não perguntei seu nome.

- Como? - ela piscou, confusa.

- Aposto que já sabe disso, mas, eu sou o Anthony. - Ele diz. - E você, é...?

- Ah, sim. Meu nome é Sophie.

- Foi um prazer, Sophie! - Anthony a lançou um sorriso de lado, aquele que nunca falhava com uma dama que ele estava interessado. Ela apenas acenou com a cabeça e abriu um sorriso tímido antes de sair.

- Tenha um boa noite, senhor.

Quando a porta bateu, Anthony permaneceu fitando-a, não sabia explicar o que aconteceu. Ele nunca se interessou pelas criadas da casa, mas aquela dama era diferente das outras, algo nela chamou sua atenção, com certeza ela possuía uma beleza única. Seus cabelos loiros e sua pele clara formavam uma perfeita sincronia com os olhos cor de mel, mas não é só isso, ela tinha algo mais, pensou ele enquanto fitava a porta fechada.

Após acabar com o prato de biscoitos e sua xícara de chá, ele se levantou e caminhou até a mesinha próxima da janela e pegou um dos copos dispostos ali, colocou um pouco de licor e se sentou de novo na cadeira, mas permaneceu girando o líquido no copo enquanto tomava alguns goles, com a mente voando de um pensamento ao outro. Mas seus pensamentos volta e meia retornavam ao momento em que a criada entrara no escritório.

Sophie. Ele sentia que precisava descobrir mais sobre ela. Pela primeira vez na sua vida, ele se sentiu tentado a conhecer uma dama e não apenas ter uma noite com ela. Se Sophie fosse uma nobre, ele lhe faria uma visita para um chá e lhe cortejaria para conhece-la melhor, mas Sophie era apenas uma criada, como ele faria para conhece-la, então? 

Um amor nada nobreOnde histórias criam vida. Descubra agora