Um Epílogo pós Epílogo

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Lucky Charm é o meu bebé e sempre vai ser. Por mais que tente, nunca consigo ficar muito longe desta história e acabo sempre por ir fazer mais alterações ou a pensar em mais momentos que, apesar de não estarem escritos, vivem dentro da minha mente e nesta história. Foi assim que acabei a escrever este epílogo pós epílogo que vos deixo aqui para lerem.

A verdade é que quando o escrevi foi por mero capricho. Não sabia onde é que estava a ir com as minhas palavras ou o porquê de subitamente esta realidade sobre a vida da Yasmin e do Richard se abater sobre mim - mas sabia que o tinha de escrever. O que aqui vos deixo não é do ponto de vista de nenhum dos nossos idiotas, é quase como um último pensamento meu sobre toda esta história e, para ser muito honesta, é um pensamento que eu adoro com todo o meu ser; é um texto que nunca me farto de ler e que leio sempre antes de ir editar LC. Não é o meu melhor texto, mas sinto que é o mais real até hoje.

Não me vou alongar mais. Vou deixar-vos ler por vocês mesmo e tirar as vossas próprias conclusões. E a todo e qualquer um que volte aqui só para ler mais este pedaço da história dos nossos idiotas ou que chegue até aqui: obrigada. Do fundo do meu coração, obrigada.

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de palavras: 1106

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A Yasmin e o Richard não vivem felizes para sempre. Porquê? Porque não há um "feliz para sempre" simplesmente porque encontras alguém que te faz sentir de todas as cores do arco-íris. Há problemas, há discussões, há a rotina do dia-a-dia e há ações egoístas que todos nós tomamos porque somos humanos.

Eles não ficam juntos para sempre. Na realidade, divorciam-se quando a Linda e o Philippe já têm as suas vidas próprias, fora da sua casa de infância. É aí que eles entendem o quanto as coisas mudaram e o quão diferente a pessoa que dorme ao seu lado é daquela rapariga introvertida e respondona ou daquele player com um sorriso charmoso e um olhar sedutor que conheceram na universidade há tantos anos atrás.

A Yasmin e o Richard sempre tiveram os seus problemas. Eles nunca, nunca, foram perfeitos e a vida com duas crianças pode ser exaustiva e levar as pessoas a se esquecerem de tomar conta do outro. Foi assim com eles. Eles esqueceram-se de como viver como um casal, substituídos por pais. Então, pouco tempo depois de o Philippe se mudar para um apartamento com a namorada, o casal de idiotas chegou à conclusão de que simplesmente não funcionavam mais. Anos e anos de negligência tinham assassinado a faísca que havia entre eles e ambos sentiam que, por mais que se amassem, aquela vida a dois já não era saudável.

A Yasmin despediu-se do emprego e voltou para Portugal. Foi a primeira vez em mais de uma década que voltou a entrar na casa onde tinha crescido. Deixou-se ficar por lá uns tempos, mas sentia-se a sufocar no passado enquanto vivia debaixo daquele teto, então optou por se fazer à estrada e relembrar-se das suas raízes como tinha feito há tantos anos atrás com a Becas. Parecia o correto a fazer depois de ter visto o amor da sua vida chorar à sua frente enquanto chegavam à conclusão de que se tinham esquecido de como amar o outro.

O Richard continuou exatamente no mesmo sítio, preso na rotina das décadas anteriores. Dar aulas, ensinar, corrigir... Sentia-se sempre meio zonzo quando o dia se aproximava do fim, quase como se tivesse andado num carrossel mais tempo do que devia, mas adiava sempre voltar a casa, sabendo que ia voltar para um quarto vazio. Para uma vida vazia.

Passaram-se anos. Claro que se viam. O casamento da Linda exigia isso mesmo e no dia em que o Philippe anunciou que tinha engravidado a namorada sem querer fez questão de ter lá ambos os pais quando tomou responsabilidade pelos seus atos e jurou cuidar daquela criança o melhor que conseguia. Meses mais tarde descobriram que não era uma criança, mas crianças. A Yasmin chorou de felicidade enquanto abraçava o seu filho mais novo.

Assim, o tempo foi passando. O Richard e a Yasmin foram envelhecendo, vivendo a vida com uma perspetiva completamente diferente da que tinham nos anos em que cuidavam dos filhos juntos. Viviam agora uma época de redescoberta interior e exterior, pois nenhum deles recusou a oportunidade de amar, ou pelo menos de gostar de outro, quando esta apareceu.

A Yasmin e o Richard não tiveram um "felizes para sempre". Discutiram por antigos rancores no batizado dos seus primeiros netos e um ano depois, quando veio a seguinte, ainda não conseguiam ter uma conversa propriamente dita. A verdade era que com todos os acontecimentos com a Linda e o Philippe se andavam a ver cada vez mais, a falar cada vez mais, a conhecer-se de novo, e isso trazia sentimentos antigos que ambos pensavam estar enterrados. Era estranho voltar a sentir aquele nervoso miúdo na barriga só porque o outro dava aquela gargalhada maravilhosa que trazia tantas memórias da sua vida a dois.

Claro, como todos nós sabemos, nada é fácil com o idiota e a Stingy. Nunca nada foi. São teimosos, casmurros, obstinados e, resumindo numa única palavra, parvos. A relação deles sempre funcionou por puros atos de parvoíce então quando um encontro obrigatório por causa de um aniversário ou um casamento se tornou num encontro casual para ir beber um café e falar sobre como iriam ensinar português e italiano e mais umas quantas línguas às novas aquisições da família e, mais tarde, simplesmente porque sim, não é de espantar que a reconciliação tenha ainda demorado.

A Yasmin e o Richard nunca tiveram o "viveram felizes para sempre". Não morreram juntos, como os pais dela. Aliás, quando um ataque de coração inesperado levou a Yasmin eles não se falavam – uma discussão tola porque o Richard tinha deixado a tampa da sanita para cima e a Yasmin, durante a noite e já sem a força de antes, caiu lá para dentro e teve de o acordar aos gritos para ele a ajudar a sair dali. Uma das últimas frases que ela lhe dissera tinha sido "Ajuda-me a tirar daqui o rabo, seu idiota! E para de rir!". Durante muito tempo, enquanto o luto ainda lhe toldava o coração, o Richard rogava pragas ao mundo por não lhe ter dito que a amava durante quase uma semana antes de ela ir. Apenas anos depois, já quando ele mesmo estava próximo da sua hora, conseguiu relembrar essa situação com um sorriso nos lábios. Afinal de contas que melhor final poderia pedir?

A Stingy e o idiota estiveram sempre muito longe da perfeição, e nem sequer o eram um para o outro. Não encaixavam que nem peças de um puzzle, nem eram tão naturais que pareciam feitos à medida do outro, mas amavam-se com tudo o que tinham. Talvez por isso discutissem tanto e tivessem tantos problemas, deixando as emoções levar a sua avante a maior parte do tempo. No final, tudo o que alguém algum dia poderá dizer sobre eles é que sempre tentaram. Fizeram sempre tudo e mais para ficarem juntos, porque, podiam não ser perfeitos um para o outro, mas estavam dispostos a ser. Não há almas gémeas e se houverem não é saudável pensar que algum dia vamos encontrar a nossa. Mas podemos encontrar aquela pessoa que está disposta a mudar nas pequenas coisas por nós, que nos faz rir, que nos ama, que cuida de nós e pela qual nós queremos fazer tudo isto de volta.

Yasmin, Richard, vocês não acabaram nos braços um do outro a dizer que se amavam, mas durante a vossa vida tomaram decisões que o disseram por vocês e toda a vossa imperfeição enquanto casal apenas inspirou não só as pessoas à vossa volta, mas também os vossos filhos e netos que, mais tarde, procuraram o mesmo para as suas vidas: amor verdadeiro e incondicional.







*07/07/20*

Lucky CharmOnde histórias criam vida. Descubra agora