Capitulo 3

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AMÁLIA

No final do dia, após muita procura, finalmente encontrei um lugar para ficar. Era uma pequena pensão. A dona era uma linda senhorinha, ela me acolheu muito bem.

Ela disse que eu poderia ficar, contudo, só por uma noite, porque o quarto que ela me cedeu já tinha hóspedes, mas que, por algum motivo, um deles avisou que não voltaria essa noite.

Só tive que agradecer a Deus por isso. Graças a saída dessa pessoa, tenho onde ao menos passar a noite. 

Já era noite e estava me arrumando para ir jantar, quando uma menina entrou no quarto. Ela me olhou de cima a baixo, enquanto mascava chiclete. Fico sem saber o que falar, mas nem preciso se dar o trabalho, porque ela logo fala:

— Quem é você? E o que faz aqui? — Ela arqueia as sobrancelhas. Mas ela não parece estar brava, apenas curiosa.

—  Ahn… Me chamo Amália. —  Estendo a minha mão e ela a aperta.

—  Sou Elisa. —  Ela sorri e solta minha mão, indo se sentar na cama, enquanto tirava seus brincos. —  E então, Amália, você vai ficar aqui? 

—  Só por hoje. A Sra. Camélia disse que esse quarto era o único livre, mas só por hoje.

—  É verdade. O Taylor teve que viajar para casa dos seus pais de última hora.

— Ele é o outro hóspede? — Ela afirma. — Agradeça a ele por mim quando voltar. —  Falo e Elisa me olha, confusa.

— Tá bom! — Ela se levanta. — Me espera para descermos juntas? — Afirmo com a cabeça e ela vai ao banheiro, enquanto eu me sento na cama. 

Elisa era jovem, talvez a mesma idade que a minha. Ela era cheia de tatuagens e piercings e o cabelo, tingido de rosa nas pontas. Mas ela tinha um sorriso doce. 

— Você é nova na cidade? — Ouço o grito de Elisa do banheiro.

— Ah, na verdade, não. Eu venho de um orfanato. — Ela abre a porta do banheiro, rápido, assustando-me.

— Você é órfã? — Assenti. — E você não tem para onde ir?

— Não. Eu pretendo arrumar um emprego. —  Fico de pé, andando pelo quarto. — Mas... Eu não tenho para onde voltar.

— Nossa, que chato. Mas… — Ela vem sorrindo, pulando até mim. — Eu conheço um lugar que está precisando de uma pessoa.

— Sério? — Empolgo-me. — Será que eu consigo essa vaga? 

—  Eu penso que sim. Não é um emprego tão bom, mas de início já vai ajudar você.

—  E onde é? 

—  Amanhã, eu te levo lá, tudo bem? 

— Obrigada. — Vou até ela e a abraço. 

— Uou. — Ela me afasta. — Não gosto de demonstração de afeto. Não de estranho. 

— Oh, desculpe.

— Vamos jantar, estou faminta.

[...]

Desperto-me com sons de choro no meio da noite. Olho para o lado, vendo Elisa encolhida na cama, abraçando suas pernas, com a cabeça entre elas. Percebi que ela tentava conter o choro e os soluços, talvez para que eu não os ouvisse. Devagar, eu tiro a coberta de cima de mim e saio da cama. Vou até a cama dela, sentando-me devagar ao seu lado. Ela levanta a cabeça ao perceber que eu estava ali. Logo depois, ela a abaixa novamente, chorando ainda mais.

— Ei? O que houve? — Ela não respondeu. — Você quer conversar? — Ela nega com a cabeça. —  Tudo bem, então. — Aproximo-me mais dela e a abraço, enquanto ela ainda se mantinha encolhida.

— O que está fazendo? — Ela pergunta, soluçando.

—  Um abraço.

—  Eu já disse que…

—  Shh... Você não vai morrer só por que está me abraçando. — Interrompo-a.

Ela fica me olhando por um tempo. Logo depois, se ajeita em meus braços, respirando fundo, e deita a cabeça em meu ombro. Ficamos desse jeito por um tempo em silêncio. Pensei que ela estava até dormindo, mas a sua voz rouca corta o silêncio.

—  Tenho crises de ansiedade durante a madrugada. — Ela fala baixinho.

—  Vai ficar tudo bem. Tenha paciência, Elisa. Você é mais forte que isso.

—  Eu sei, mas é tão difícil. Desde que ela se foi, eu nunca mais fui a mesma, tive que viver sozinha muito cedo. Eu me perdi no meio do caminho. Eu… Eu… Não sei se sou forte.

— Você é sim. Não sei o que aconteceu com você, mas se aguentou até aqui, pode aguentar um pouco mais. Você não está sozinha. Tenha paciência, Elisa. Espere e verá que tudo irá passar. —  Elisa não responde, mas eu sinto ela apertar mais os braços em minha cintura. — Quando as madrugadas de crises vierem, pense que elas irão passar e que outro dia virá. Sempre teremos dias de tempestade, mas no outro dia, o sol surgirá como uma luz no fim do túnel escuro para iluminar o caminho. Jesus Cristo disse que no mundo teríamos aflições e que não seria fácil, mas que não passaríamos sozinhos. Ele está conosco. —  Ela se afasta e me olha.

—  Você parece uma velhinha falando. — Ela ri e eu sopro uma risada. — Obrigada. Nos conhecemos há poucas horas e você já está presenciando um momento de fraqueza meu. —  Ela estala a língua. —  Desculpa. —  Neguei com a cabeça.

—  Você está melhor? —  Ela afirma. —  Vamos dormir.

Volto para minha cama, mas antes, deixo um beijo na testa dela e ela me encara por um tempo, depois sorri fraco. Elisa parecia ser durona por fora, mas por dentro, era uma gatinha apenas precisando de carinho. 

— Você é religiosa? — Depois de um tempo em silêncio, ela me pergunta. Eu estava de costas para sua cama, então me viro para seu lado para assim respondê-la.

—  Sou. — Falo simples. —  Sou católica. A minha tia, que cuidava de mim no orfanato, me educou na fé.

—  Eu costumava frequentar a igreja junto com minha mãe, mas depois que ela morreu, eu deixei de ir.

—  Você tem vontade de voltar? 

— Tenho. Mas eu… Acho que não posso.

—  Por que não? 

— Olhe para mim, Amália. Deus me aceitaria em sua casa novamente? E tudo que eu já fiz? 

— Deus é pai, Elisa. Deus é misericordioso e, acima de tudo, justo. Se você se arrepender dos erros cometidos no passado e olhar para frente de uma forma diferente, ele não vai olhar para sua aparência e sim, seu coração. Deus olha os puros de alma. Ele te ama muito. Se você voltar, tenho certeza que Ele ficará muito feliz.

Ela fica em silêncio. Pela luz que entra pela janela, posso ver seus olhos brilhantes.

—  Podemos ir juntas? —  Ela pergunta.

—  Claro!


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