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Levei alguns segundos eternos para captar cada palavra que saiu da boca da minha mãe, porém, quando tudo começou a fazer sentido dentro da minha cabeça, fui sentindo cada músculo do meu corpo se retesar, bem como meu estômago começar a doer, negando-se a digerir aquela maçã que parecia azeda agora.

─ Como assim? – Grunhi.

Mamãe tamborilou os dedos na mesa, ganhando tempo ou pensando em um modo de falar seja lá o que fosse.

Eu estava começando a ficar nervosa.

─ Karol, você sabe que nessa cidade nada se esconde... Bela Rosa é um ovo. Todo mundo aqui sabe da vida de todo mundo, é impossível não saber. – Explicou. – E antes de ir para o Bonaventura – ela se negava a falar a palavra 'sanatório' – você foi internada na emergência por causa dos ferimentos... – Afastei meu olhar do dela. – Bem, a médica que te atendeu é da igreja e comentou sobre...

─ Sobre eu ter tentado cometer suicídio. – Terminei aquela dolorosa frase pra ela com amargor.

Mamãe assentiu com pesar.

─ Desculpe querida, mas não conseguimos frear as fofocas... As pessoas podem ser cruéis.

Levantei da mesa e fui até a pia, abri a lixeira e joguei o resto da maçã dentro, depois me virei para mamãe.

─ Tudo bem. – Sorria. Sorria. Sorria. – Eu posso lidar com isso. Eu posso, mamãe. Vai ficar tudo bem. Eu prometo.

─ Filha, você não tem que prometer nada, a culpa não é sua...

Umedeci os lábios e enfiei as mãos nos bolsos traseiros da calça, tentando domar os tremores.

─ Mamãe, por favor, apenas confie. Vai ficar tudo bem. Eu estou bem.

Acredite. Apenas acredite.

Depois de alguns eternos segundos, ela pareceu relaxar um pouco.

─ Fico muito mais tranquila em saber que você melhorou, sabia? Não sabe como eu fico feliz.

Caminhei até ela e fiquei de cócoras na sua frente, pousando minhas mãos úmidas de suor em seus joelhos.

─ Eu estou ótima, mamãe. Eu estou perfeitamente melhor agora... – Garanti. – Será que podemos ir agora? Não quero chegar atrasada.

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Sai do carro da minha mãe e garanti pelo menos umas três vezes que ligaria caso precisasse – ela até me emprestou o celular dela e falou que eu podia ligar para o do meu pai – mas eu não ia ligar pra ninguém.

Eu daria conta.

Tudo para não ter que voltar para aquele maldito lugar...

Parada na calçada do colégio, revisitei memórias que pareciam distantes, mas que não eram, porque há poucos meses atrás, quando tudo ainda era sólido e bom, eu vivi momentos únicos ali, com as pessoas que me amavam, festas, brincadeiras...

Tudo tão bom, mas com o gosto tão azedo agora.

O Colégio era uma construção antiga, assim como qualquer outro prédio da cidade, porém havia passado por uma restauração há dois anos e as cores mais vivas e o jardim bem cuidado, davam um ar menos velho para aquele lugar tão conhecido e que já tinha sido testemunha de tantos momentos na vida de todos da cidade.

Atravessei o portão de correr da entrada e fui seguindo pela rampa estreita que cortava o jardim ao meio, praticamente dividindo o pátio em dois; e enquanto fazia isso, olhei ao redor, munindo meus cinco sentidos das sensações tão presentes.

A Bela Rosa {Vol. 1}Onde histórias criam vida. Descubra agora