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Entrei em casa ainda desorientada e com a garganta ardendo tanto que só conseguia pensar em como precisava de água, principalmente porque ainda estava tossindo.

Tudo culpa dele.

─ Filha, finalmente... – Meu pai vinha descendo as escadas, mas não parei para esperá-lo. Deixei a mochila no chão e fui para a cozinha. ─ Sua mãe ficou na loja, mas eu e a Lica vamos te levar para sua consulta hoje.

Abri a geladeira e peguei a minha garrafinha de água e fechei.

Eu estava lembrada da consulta com o psiquiatra, Doutor Miguel, mas definitivamente não queria ir.

─ Pai, será que podemos remarcar? Estou cansada.

Abri a garrafa e bebi um longo gole.

Que dor na garganta!

─ Filha, não acho que seja bom perder uma consulta, além do mais, prometemos aos médicos do Bonaventura que você iria seguir com o tratamento certinho e...

Enquanto a água descia lavando tudo dentro de mim, me virei e fui até a pia lavar as mãos.

Desde a briga de mais cedo, olhar para o meu pai me causava angústia e raiva.

─ Quinta-feira eu vou. – Falei ainda de costas. ─ Hoje eu não quero. Realmente tenho muitos deveres para fazer, e também estou tomando os remédios certinhos. Então, não se preocupe comigo.

Desliguei a torneira e peguei minha garrafinha de novo, virei-me e dei de cara com meu pai, ele estava com as mãos pousadas na cintura e me olhava com um misto de culpa e pena.

─ Eu amo você, minha filha. – Falou e fiquei levemente paralisada. ─ Não se esqueça disso, por favor.

Então ele se curvou na minha direção, segurou meu rosto e deu um beijo casto na minha testa como sempre fazia quando eu era criança, depois saiu da cozinha e desapareceu no corredor sem olhar para trás.

Segurei minha garrafinha com força entre as mãos congeladas e soltei um longo suspiro de saudade.

Sentia falta do papai do passado.

─ Dá para ver que ele te ama muito.

Me sobressaltei com as palavras de Ruggero e quase que instantaneamente, virei a cara para o outro lado.

Eu não conseguia esquecer da pergunta inconveniente dele.

─ Que saco! – Sai pisando com força e fui subindo as escadas com a raiva latejando por todos os lados.

Eu não estava com raiva do Ruggero ou dos meus pais, mas sim de mim, porque eu podia ter resolvido tudo de manhã com uma boa conversa.

O dia havia sido totalmente fora da curva e o dia seguinte não seria muito diferente.

Entrei no meu quarto, fui direto até a minha penteadeira, abri a primeira gaveta e peguei os comprimidos.
Eu tinha que me desfazer de alguns deles, caso meus pais resolvessem fuçar minhas coisas, porque se eles fizessem isso, descobririam que eu não tomei nenhum – quer dizer, quase nenhum, desde que voltei no sanatório.

Fui até o banheiro e despejei alguns comprimidos na privada, depois deixei que a descarga fizesse o resto do trabalho.

Muito melhor assim.

─ Você sabe que isso é errado, não sabe?

Revirei os olhos.

─ Ruggero, por favor, será que pode ficar de bico fechado? Agradecida. – Abri um largo sorriso falso e passei por ele ao sair do banheiro.

A Bela Rosa {Vol. 1}Onde histórias criam vida. Descubra agora