Capítulo 39 - O falso servo

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O corpo e a mente são uma unidade. Nada acontece na mente sem que reflita no corpo. Assim como nada acontece no corpo sem que a mente perceba. Hu Long, ao retornar de mãos vazias da batalha contra o clã SiRou, foi imediatamente para seu quarto com o irmão mais velho e desabou no chão.

As lágrimas sempre foram entendidas como se fossem as últimas palavras do coração que perdeu a voz de gritar. O jovem guerreiro não era como sua amiga. Não conseguia ser forte o bastante para sorrir enquanto lágrimas eram derramadas e, mesmo chorando, a dor que sentia no peito neste momento não ia embora.

Hong Shaoran, antes de ir para o lado do mais novo, foi ao salão principal reportar o que havia acontecido para seu pai, que imediatamente o cortou e falou sobre a súbita perda de Hong Tao. Na hora que o líder contou a seu filho sobre seu falecimento, o jovem não ousou deixar sequer uma lágrima escorrer em seu rosto, como se ainda ouvisse sua mãe dizendo que chorar o tornaria fraco.

Hong Shaoran nunca soube ajudar os outros enquanto choravam porque ele mesmo não sabia o que fazer quando entrava em colapso. Então, agora, já ao lado de seu irmão, ajoelhou-se junto dele e o abraçou, pois suas palavras estavam todas naquele ato, deixando por fim finalmente as lágrimas que tanto prendia em seus olhos fluírem como as águas de uma cachoeira.

Rápidas e contínuas.

No mesmo ano, Hong Lan não estava mais de luto por sua falecida esposa, que morrera de causas naturais. Ele começou a observar os estragos que ocorreram na mente de seus guerreiros pela batalha travada meses atrás. O mais ferido evidentemente era Hu Long. O jovem com apenas seus 16 anos viu sua grande companheira ser pega pelo inimigo e não pôde fazer nada a respeito pela sua condição.

Esse peso em sua mente o matava a cada dia que passava. Sua alimentação foi reduzida, seu corpo começou a emagrecer e suas pernas mal conseguiam correr direito. Hong Lan estava extremamente preocupado. Mas não pelo fato de ser a criança que adotou anos atrás, e sim por ser um grande guerreiro que, caso perdesse, seria uma derrota por completo para ele.

Sendo assim, numa noite de outono, o líder do clã Hong se encontrou com o líder do clã Fai. Ambos conversaram durante a noite inteira e no final das contas decidiram tomar uma decisão que, aos olhares de Fai Xin, só iria ter boas consequências para ele. Porém, essa ação tomada por Hong Lan tinha muito mais interesses escondidos.

Hong Lan decidiu afastar Hu Long do clã por alguns anos e o tornou servo do clã Fai. Muitos no começo não compreenderam o porquê do grande líder Hong vender um dos seus melhores guerreiros de batalha para o líder Fai, que estava a cada dia destruindo tudo o que governava. Entretanto, o verdadeiro plano, explicado tanto para Hu Long quanto para os outros administradores do clã, foi que já haviam perdido a assassina profissional, Li Ming-Yue, e precisavam de um novo peão de guerra. Ao ver que o filho de Fai Xin estava sofrendo muito nas mãos do pai, decidiram tentar capturar o jovem e torná-lo um servo do clã Hong. Hu Long seria o espião infiltrado como "servo" no clã Fai. O intuito desse ato era fazer com que Fai Chen interagisse com o servo e tivesse uma segurança maior.

O plano seria perfeito.

Se Hu Long não tivesse agido da maneira errada.

Assim que pisou pela primeira vez no clã Fai, Fai Xin deu ordens a ele para cuidar de sua filha e não de seu filho. Hu Long revirou os olhos quando escutou tal ordem, mas, para não levantar suspeitas, concordou e foi em direção ao quarto da jovem dama, Fai Shuang. Bateu gentilmente na porta e disse com um tom educado que quase não era escutado sair de sua boca:

"Jovem Dama Fai, este servo irá se responsabilizar por tudo que pedir."

A porta do quarto se abriu e o servo pôde ver a jovem dama, que quase nem era mencionada do clã Fai. Ela era muito parecida com seu irmão mais velho, Fai Chen. Seus cabelos eram escuros, lembrando o céu sem estrelas; sua pele era pálida e em seu rosto, a única coisa que fazia sua beleza juvenil ser maculada era a cicatriz perto de seu olho esquerdo, que parecia ter sido feita com uma faca de porte pequeno.

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