Dezenove

467 44 8
                                    

Estou atrasado, de novo.

A aula de hoje é uma revisão para a primeira prova, e eu estou atrasado porque perdeu a noção do tempo enquanto relia seu discurso para o evento da campanha de que vai participar na puta que pariu do Nebraska no próximo fim de semana.

É quinta-feira, eu estou saindo direto do
trabalho para o anfiteatro, a prova é na próxima terça, e eu vou ser reprovado porque estou perdendo a revisão.

A aula é Questões Éticas em Relações Internacionais.

Eu realmente deveria parar de pegar
matérias tão terrivelmente relevantes à minha vida

Assisto à revisão fazendo anotações distraídas e confusas e volto para a Residência.

Estou puto da vida, para ser sincero.

Puto com tudo: um mau humor generalizado e sem direção que me carrega escada acima rumo aos Quartos Leste e Oeste.

Jogo a mochila no chão perto da porta do quarto e descalça os sapatos no corredor,
observando-os caírem tortos sobre o tapete feio e antigo.

— Boa tarde pra você também,Docinho— diz a voz de Ondreaz, Quando ergo os olhos, ele
está no quarto dele do outro lado do corredor, sentada em uma poltrona marrom— Você está
com uma cara de merda.

— Valeu, cuzão

Reconheço a pilha de revistas no colo dele com seu apanhado semanal de tabloides, e eu
acabo de decidir que não quero saber quando ele atira uma na minha direção

— People nova pra você — ele diz. — Você está na página quinze. Ah, seu melhor amigo está
na trinta e um.

Eu tranquilamente aponto o dedo do meio para ele pelo ombro e entro no quarto,me jogando
no sofá perto da porta junto com a revista.

Já que está com ele,é melhor ler de uma vez.

A página quinze é uma foto minha que a equipe de imprensa tirou duas semanas atrás, um belo retrato meu ajudando o museu Smithsonian em uma exposição sobre a campanha presidencial histórica de minha mãe.

Explica ahistória por trás da plaquinha CLAREMONT PARA O CONGRESSO
2004, e tem um texto breve na lateral sobre como sou dedicado ao legado da família, blá-bláblá.

Viro para a página trinta e um e quase solto um palavrão.
A manchete:

QUEM É A MORENA MISTERIOSA DO PRÍNCIPE NICK?

Três fotos: a primeira,Nick.em uma cafeteria em Londres, sorrindo enquanto toma café com uma menina de cabelo castanho escuro genericamente bonita;

A segunda,Nick, um pouco desfocado, de mãos dadas com ela saindo do café

A terceira,Nick quase escondido por um arbusto, beijando o canto da boca dela.

— Que porra é essa?

Tem um artigo curto acompanhando as fotos que dá o nome da menina,Madison qualquer coisa,uma cantora e eu estava universalmente puto antes, mas agora está especificamente puto, todo meu mau humor afunilado ao ponto da página em que os lábios de Nick tocam a pele de alguém que não é a minha

Quem aquele filho da puta do Nick pensa que é?

Como ele se acha no direito de ser tão frio e
egoísta pra cacete a ponto de passar meses virando amigo dele, deixá-lo mostrar todas as minhas fraquezas estranhas e medonhas, dar um beijo,fazer com que eu questionasse tudo,me ignorar por semanas, sair com outra pessoa e botar na imprensa?

Todos que já tiveram um assessor de
imprensa sabem que histórias só vão parar na People se você quer que o mundo saiba.

Jogo a revista no chão e levanta de um salto.

Aquele filho da puta do Nick.

Nunca deveria ter confiado naquele merdinha mimado.
Deveria ter escutado seus instintos.

inspiro, expiro

A questão é que.
A questão.
É.

Apesar de seu ímpeto de raiva inicial, eu não sei se acreditomesmo que Nick faria uma coisa dessas.

Se eu pegar o Nick que viu em uma revista
adolescente quando tinha doze anos, o Nick que foi frio comigo na Olimpíada, o Nick que foi se revelando devagar para ele ao longo de meses, e o Nick que me beijou atrás da Casa Branca, e os somar, não é a esse resultado que chega.

Eu tenho um cérebro tático.

Um cérebro político.

Funciona rápido, e funciona em muitas,
muitas direções ao mesmo tempo.

E, agora, eu estou resolvendo um quebra-cabeça.

Nem sempre é bom em pensar: E se eu fosse ele? Como seria minha vida? O que eu precisaria fazer?

Em vez disso, está pensando: Como essas peças se encaixam?

Penso no que Addi disse: “Por que você acha que elas são sempre fotografadas?”.

Penso na postura defensiva de Nick, a maneira como ele se porta com uma distância
cautelosa do mundo ao seu redor, a tensão no canto da boca dele.

Então penso: Se houvesse um príncipe, e ele fosse gay, e beijasse um homem, e talvez tivesse significado algo para ele, esse
príncipe poderia ter que criar certa distração.

Em uma grande virada instável,eu não estou apenas com raiva agora.Também estou triste.

Volto até perto da porta, destravo o celular e abro o aplicativo de mensagens.

Eu não sei qual impulso seguir nem como transformar isso em palavras que eu consiga dizer a alguém e fazer alguma coisa, qualquer coisa, acontecer.

Vagamente, abaixo de tudo, passa pela cabeça dele: essa com certeza é uma reação nada
heterossexual para se ter ao ver meu amigo ou inimigo beijar outra pessoa em uma revista

______________
Oii gente

Espero que tenham gostado desse capítulo

Me perdoem pelos erros
Até o próximo

Att: A autora

Na realezaOnde histórias criam vida. Descubra agora