Sorte ou Destino? II

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Acordei com um barulho de algo caindo no chão.

Victoria estava vestida em uma outra roupa e em uma das mãos carregava um par de sapatinhas de balé. Assim que notou que eu tinha acordado ela logo tratou de esconder como se fosse motivo de vergonha.

- Se sente melhor? - podia parecer uma pergunta idiota dada as circunstâncias. Mas eu realmente queria saber como ela estava se sentindo depois de tudo.

- Você não tem família? Mulher, filhos essas coisas? - balancei a cabeça negando e ignorei o fato de que odiava quando me respondiam com outra pergunta. - Tenho que ir na delegacia!

Ela não parecia feliz em ter que fazer aquilo, claramente. Victoria estava diferente da noite anterior, os ombros estavam mais erguidos e apesar dos machucados no rosto a expressão dela estava bem melhor, parecia mais disposta e altiva. Talvez a sede por justiça a tivesse deixado assim. E era tudo que eu mais queria também, nem que tivesse que passar mais de um mês naquela cidade.

- Faz faculdade do quê? - ela estava dobrando o papel da alta quando olhou para mim disposta à responder.

- Artes cênicas. - analisou minha expressão por alguns instantes e continuou. - O balé é só um hobby.

Não tinha sido uma frase muito crível, mas não a questionei. Abri a porta do carro para que ela entrasse e a mesma ficou olhando para mim antes de entrar. Não era todas as mulheres que gostavam quando abríamos a porta do carro.

- Queria agradecer novamente por estar me ajudando. Não sei o que faria se não fosse sua ajuda. - fiz uma expressão qualquer e torci para que ela tivesse interpretado como uma resposta.

Eu queria perguntar mais sobre ela, estava curioso sobre muitas coisas, mas aquele não era o momento.

Parei o carro em frente à delegacia quando percebemos uma pequena movimentação na frente, os dois criminosos da noite anterior estavam do lado de fora. Notei que estavam, novamente, sendo algemados e encaminhados para dentro da delegacia. De longe vi meu meio irmão Jake com uma bengala que nem por Deus tornaria a presença dele menos intimidadora. Tinha que admitir que ele era a cara do meu pai.
Desci do carro e esperei alguns minutos para que ela criasse coragem. Victoria tomou uma respiração profunda e abriu a porta do carro, tirando o cabelo do rosto deu o primeiro passo. Comecei a segui-la.
- Jamal! - Jake estendeu a mão para que eu cumprimentasse, eu nem tinha sequer dito nada.

- Jake... - fiz uma pausa dramática. - Estou com a Victoria, vocês...

- Nos falamos por telefone ontem, é um prazer conhece-la e sinto muito pelo que passou. Prometo que esses caras pagarão, e bem caro. - eu nunca tinha visto ele ser simpático com absolutamente ninguém. Mas pela comoção que o caso da Victoria causava, talvez aquela fosse a razão.
- Por que eles estavam aqui fora? - ela perguntou. A voz era firme e muito bonita. - Vão ser transferidos para um presídio?

- O juiz concedeu um habeas corpus e minha equipe conseguiu derrubar. - a expressão no rosto dela mudou para uma completa confusão. Custei acreditar que eles iriam simplesmente sair, como se nada tivesse acontecido.

- Ah, meu Deus... por que branco e rico tem tanto privilégio? - era obviamente uma pergunta retórica, ficamos em silêncio porque não havia muito o que podíamos dizer. Era doloroso e não correríamos o risco de piorar a situação dizendo alguma bobagem.

Victoria entrou na sala para prestar depoimento. Dava para notar o quão horrível estava sendo ter que reviver tudo aquilo e eu quis abraça-la por vários minutos, até que a dor desaparecesse do corpo dela.

Müller - Contos de AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora