XXIX - Vida em perigo

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Eu estava congelando, meus pés não respondiam mais aos movimentos que eu tentava a todo custo impor ao meu cérebro. Os comandos estavam comprometidos, a dor que sentia com o congelar, me deixava paralisado, sem poder pensar em outra coisa que não fosse a agonia do não sentir meus pés, precisava bloquear isso, para poder sobreviver, tudo era muito úmido, a noite era tenebrosa, nada se movia apenas meu pensamento que circulava na mesma sintonia da dor. Parei, e sentei-me num grande tronco, eu deduzia ser um carvalho caído. Passei a mão por debaixo dele e pude sentir folhas, estavam moles, e percebi que estavam úmidas, não tinha certeza, pois minhas mãos geladas, já não tinha tanto tato.

Tirei minhas botas, meias, e fui colocando debaixo dos pés, e em seguida coloquei as meias e depois calcei as botas. Parecia que começava uma proteção nos pés, então deitei, no lugar de onde tinha retirado as folhas, e fiquei ali. Não me dei conta do tempo que fiquei ali, pois meu relógio não estava em meu bolso, claro que o homem tinha retirado, justamente para que eu não tivesse ,e que perdesse a noção do tempo. O sol entrava pela fresta das árvores, procurei um canto e me encolhi, colocando meus pés na maior parte dessa festa. Meu estômago me lembrava que eu estava com fome, revistei as folhas, e ali encontrei minhocas, e larvas no tronco morto. Comi com nojo, mas como, precisava ficar forte. Quando senti que meus pés estavam normais na temperatura, comecei a caminhar, não sai da floresta, mas tentei ficar na beira, pois se eu ouvisse os trotes de cavalo poderia sair e pedir ajuda, teria que ter cuidado para não dar de cara com meu raptor.

Estava quase desistindo quando vi uma carruagem dourada vindo em direção ao local em que eu estava, poderia pedir ajuda. Sai do mato e fiz sinal, a carruagem parou.

-Senhor pode me dar uma carona, meu cavalo me derrubou...A janela abre e uma voz diz:

-Traga ela, deixá-la entrar. Não podia acreditar, aquela voz, eu conhecia aquela voz... Senti as mãos do cocheiro me segurando, tentei soltar, mas ele dava o dobro do meu tamanho, me rendi.

-Como vai meu amor! Olhei para ela, estava mais linda que nunca ou era o perigo que lhe deixava bela? Mas percebi que diante daquilo, não senti amor, mas sim uma incontrolável vontade de voar em cima dela, e esquecendo que era uma mulher. Era uma mulher, mas como tantos homens inescrupulosos me faziam esquecer por alguns segundos a vontade que sentia de degola-la.

-Como vai Dorothea?

-Posso ver que conseguiu fugir...tens 7 vidas...mas dessa você não escapará. Pude sentir que ela se comprazia com meu medo, ela parecia um animal selvagem que sentia seu medo.

-Por quê, quer o meu fim? ela me olhou nos fundos dos meus olhos e sorriu.

-Ainda não sabes? Preciso mesmo lhe dizer? Me senti um imbecil diante dela, mas o que fiquei aliviado foi ver que o amor que sentia por ela foi feitiço, e que havia acabado, logo, eu podia acabar com ela, era isso que estava me dando força. Abri a pequena janela, respirei fundo, minha mente queria arquitetar algo, com raciocínio lógico, sentei-me ao seu lado, ela de imediato recuou para o canto.

-Calma meu amor, não tenha medo, sou teu refém esqueceu? Ela me prendeu ao seu olhar.

-Não dê uma de idiota, posso te matar aqui nesse momento. Eu sorri entre lábios.

-Eu sei disso, fique tranquila, prometo ficar aqui quieto. Mas minha mente voava, estava parado mas já sabia o que faria, percebi uma curva à frente, avistava pela pequena janela da carruagem que o cocheiro chicoteava os cavalos, a mando da patroa, tinha pressa. E quando ela fez a curva eu sai de dentro caindo na beira da estrada e entrando o mais rápido na floresta, ali estava eu novamente para mais uma noite congelante. Entrei e me escondi, de fora ela falava...

-Senhor Conde Von, podes fugir, mas chegará a hora em que nos encontraremos. Eu vi quando seguiram viagem, então fiquei ali na beira novamente, tentaria novamente. mas não foi uma carruagem que passou, era uma carroça carregada de bodes e cabras, pedia carona, e me deitei num canto onde tinha os alimentos para eles. O senhor me disse:

-Estou indo para o mercado, pretendo chegar cedo, pois ainda preciso arrumar a exposição das vendas. Posso levá-lo, mas tome cuidado porque aqui tem muito assalto. Perdi minha esposa um dia, há muito tempo atrás, íamos para cidade quando alguns homens nos pegaram, ela reagiu e eles a mataram, eu consegui fugir depois disso. Agora eu ando armado, mas a floresta ainda é o caminho mais seguro para se salvar.

-O senhor falou que isso sempre aconteceu, que faz muito tempo, seria possível que fosse um grupo que faz isso, por todos esses anos?

-Os meus vizinhos falam que são sim um grupo, e que até sabe onde vivem, lá do outro lado desta montanha ali, apontando para que estava bem à frente do lado direito da estrada. Me passou algo bem rápido na cabeça. Nesse momento passava do lado contrário outra carroça que parou para conversar com meu condutor.

-Boa tarde senhor Arthur, como vai? Está indo para a cidade?

-Sim estou, como está a estrada mais a frente?

-Encontrei apenas uma carruagem que vinha no mesmo sentido que o senhor, e aí atrás como está o movimento?

-Não encontrei nada, pode ir em paz. Nesse momento pensei rápido e disse:

-Desculpe-me ,mas o senhor pode me dar uma carona, para o vilarejo, conhece alguma pousada? O homem me olhou de cima para baixo e falou:

- Posso sim, no vilarejo tem uma pousada da minha família, pode ficar lá.

-Então obrigado senhor pelo trajeto que fizemos juntos, mas preciso voltar...

-Boa sorte para vocês, fiquem atentos...

-E o senhor também, segue na paz. E assim as carroças em sentido contrário seguem aos seus destinos.

-Meu nome é Conde Von. Agradeço desde já pela carona.

-Faço com prazer, por aqui temos que ser solidários, nestas bandas anda muito perigo rondando.

-Me fale mais sobre esses perigos.

-Então, tem por volta de uns oito anos que começou, já mataram muitas pessoas boas da região, eles querem tudo que for de valor, mas como muitos reagem acabam matando.

-Os senhores sabem que são, onde vivem?

-Sim, sabemos, mas não nos atrevemos a fazer justiça, temos nossa família.

-Entendo. Vou ficar alguns dias. Preciso arejar minha cabeça, sofri uma perda e agora quero me encontrar novamente.

-Sei como é, por aqui vai encontrar essa paz que procura. Na verdade, não queria paz, queria é encontrar quem tirava a paz das pessoas e quem sabe descobrir quem me sequestrou e se Dorothea veio dali, quem sabe não fazia parte junto com ela? E talvez, com um golpe de sorte, matar dois coelhos com uma cajadada só...quem sabe...

Senhor Exu Pinga FogoOnde histórias criam vida. Descubra agora