Capítulo Vinte e Três

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Acho que essa foi a noite que eu mais dormi, não tive sonho ou pesadelo, apenas deitei na cama e apaguei. Me sentei na cama e bocejei vendo a luz do sol entrando pelo quarto.

Me levanto, entro no banheiro que tem no quarto e tomo um banho. Troco o curativo do meu braço e coloco uma roupa, calças marrons, uma blusa cor creme de manga larga e sapatilhas, prendo meu cabelo em um rabo de cavalo baixo e saio do quarto.

Desci as escadas escutando vozes, fui para a cozinha e vejo Mikael e mais um garoto, o garoto para de rir quando olha na minha direção e arregala os olhos.

- O que ela está fazendo aqui?- o garoto se levantou.

- Connie, relaxa...

- Não, ela é a assassina do Erwin, ela pode nos sabotar e...

- Connie, ela é a garota que eu te falei.- Connie olhou para Mikael, sua boca abriu em choque.

- Você e ela...

- Espero que tenha falado coisas boas sobre mim.- digo me sentando na cadeira ao lado de Mikael e partindo um pedaço de pão, ele me serviu uma xícara de café.

- A maior parte.- Mikael disse e Connie se sentou ainda em choque.- Kath, esse é o Connie, um velho amigo e o garoto que atrapalhou o nosso treinamento naquele dia, lembra?

- Eu sabia que você não estava sozinho naquela sala.

- Kathryn.- estendi a mão e o garoto pegou na mesma meio inseguro. Ele tinha aparentemente a minha idade, os cabelos eram cheios e ruivos, os olhos avelã e a pele branca, não usava a farda do exército.

- Tem certeza que ela é confiável?

- Eu trai o Erwin na frente dele, aposto que ele quer minha cabeça em uma bandeja agora.- mordo o pedaço do pão.

- Como está a situação?

- Todos estão escondidos, mesmo usando nossos poderes, ainda não temos uma quantidade grande de armas e suspeito que o rei está tramando algo.

- Como assim?- Mikael colocou a xícara de café na mesa.

- Nosso espião no palácio diz ter escutado uma conversa, sobre um possível ataque aos galpões onde algumas pessoas estão escondidas, mas não sabemos se é verdade.

- Como não sabem se é verdade?

- O espião tem um caráter duvidoso, não sei se ele está conosco ou o rei, não vazamos nenhuma informação nossa para ele com esse medo.

- Para quando seria esse ataque?- pergunto.

- Amanhã, talvez.

- Cuidaremos disso.

- Sobre as armas, eu posso ver se um amigo meu pode fabricar algumas. Se ele aceitar.- digo, agora que havia me tocado que Jean provavelmente estaria com raiva de mim.- Amanhã vou procurá-lo.- os dois assentiram.

- E a muralha?

- Em pé ainda, mais uma explosão e ela cai.

- Vamos deixar essa explosão para outra hora.- Mikael terminou de tomar o café de sua xícara.

- Por que você se virou contra o seu rei?- Connie disse olhando para mim.

- Porque eu não era livre, ele fez a minha vida um inferno, amaldiçoou minha família a morte e eu vivia com a faca no pescoço se fizesse algo errado. Está na hora dessa faça se virar para o pescoço dele.- peguei uma maçã e mordi a mesma.

- Vocês dois combinam mesmo, não sei quem é pior. Ah, antes que eu esqueça.- Connie tirou do bolso um pedaço de papel dobrado, ele abriu e deu para Mikael, o garoto olhou e riu.

- É sério?- olhei para o papel e era um desenho do rosto de Mikael, em cima estava escrito em tinta vermelha " Vivo ou morto" e embaixo uma grande quantia de recompensa e o símbolo real.

- Ainda não achei o meu, talvez esteja em alguma taverna. Há caçadores de recompensas procurando você e provavelmente algum em Araven procurando você.- apontou para mim.

- O rei é tolo.- Mikael jogou a folha na sua frente.- Meu nariz não é assim.

- É, também erram um pouco no seu queixo.- Connie disse comparando o desenho, acabei rindo.

Connie voltou para Casina e eu passei o dia explorando a casa, achei alguns livros cheios de poeira, alguns de romance e outros de histórias e lendas sobre o nosso mundo.

Durante a noite, uma chuva forte atingiu a casa, conseguia escutar os trovões e os pingos batendo nas janelas.

Fecho a porta do meu quarto depois de ter trocado de roupa para um vestido de manga longa por causa do vento frio que circulava dentro da casa. Desci as escadas indo para a sala e Mikael estava lá.

As botas estavam jogadas no chão, na lareira queimava o fogo, ele girava um anel na mão mas parou quando percebeu que eu estava lá, ele cobriu a mão esquerda com a direita por cima.

- Pensei que você já tinha ido deitar.- falei, ele havia dito que iria deitar depois do jantar.

- Resolvi acender a lareira.

Me aproximei, as costas de Mikael estavam apoiadas no braço do sofá, me sentei no espaço entre suas pernas e apoiei minhas costas no seu peito. Os braços dele me envolveram, meus cabelos estavam soltos.

O calor do fogo me aquecia do vento, as velas balançavam mas não apagavam. Olhei para as mãos de Mikael e percebi o anel, já tinha reparado que ele usava esse anel, mas nunca tinha visto em detalhe.

- Que anel é esse?- digo, o anel estava no seu dedo indicador da mão esquerda, era prata e no meio preto com alguns detalhes em prata.

- É um anel de família, minha vó passou para o meu pai e quando o meu pai morreu eu peguei para mim. Não sei se ele planejava dar ele para mim.

- Então tem valor sentimental?

- Pode dizer que sim.- sua mão esquerda segurou a minha.

- Eu não tenho nada da minha família, nada da minha mãe, apenas memórias.- o sorriso de minha mãe veio na minha cabeça e eu sorri fraco.- Eu escutei que as pessoas com magia em Casina vivem bastante tempo, quantos anos você tem?- disse trocando de assunto.

- Não quero responder.- ficamos em silêncio, apenas o barulho da madeira da lareira estalando.- Cento e vinte e cinco, é pegar ou largar.

Me levantei me sentando no sofá e o olhei.

- Isso é bem mais que a expectativa de vida.

- Antes de você ser a assassina de Erwin, eu já era general.

- Então eu beijei um homem velho?- fiz uma careta.- Quando que os cabelos brancos vão crescer?

Mikael me puxou me abraçando, acabei rindo e gemi de dor por ele ter encostado no meu braço ferido.

- Posso ter essa idade mas não tenho nada de velho.

- Ah é mesmo?- escutei a sua risada e sorri.

- Kathryn.- olhei para Mikael.- Acho que você está sendo a melhor coisa que aconteceu comigo nesses últimos tempos.

- Não exagere.

- Não estou exagerando, apenas falando a verdade. Talvez eu esteja gostando de você.

- Também acho...que estou gostando de você.- sorri e ele me beijou ainda envolvida nos seus braços.

A muralha entre reinosOnde histórias criam vida. Descubra agora