#4. K

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Eu olho para trás, como se ela estivesse falando com alguém atrás de mim.

-Onde você estava? – Ela repete a pergunta, trincando os dentes.

Porra. Ela está muito brava. Mas isso não lhe dá o direito de falar assim comigo.

-Desculpe. Eu não li o jornal da manhã, mas o que aconteceu com o mundo para você achar que eu te devo satisfação?

Ela ri com ironia, e a gargalhada arrepia a minha espinha.

-Você está brincando, não é?

Quando eu olho em dúvida ela balança a cabeça, como se não pudesse acreditar.

-O que? – Eu pergunto, impaciente.

-Você é inacreditável. – Ela diz, juntando as coisas da bebê do sofá. - Sério. Eu pensava que você tinha algum motivo profundo para ser um babaca. Sei lá, seus pais não te amaram o suficiente na infância, alguma mulher te magoou, falta de transar... Eu ficava pensando nas justificativas: você não dava bom dia? Era porque estava com pressa. Gritava com todo mundo? Claro, você tinha que levar uma empresa sozinho, muita pressão.

Ela para com algumas toalhas na mão, não se preocupa em esconder o quanto está puta comigo.

-Até mesmo quando você era um cretino comigo, eu relevava. Pensava que você queria me ensinar alguma coisa. Mas agora, eu fiquei sentada cuidando da sua filha por mais de sete horas e pensando em alguma justificativa, para você nem ao menos atender a droga do seu telefone. E nenhuma foi suficiente. Então, sim. Você me deve satisfação. E deve satisfação para sua filha.

-Agora é você que deve estar brincando comigo. Eu não sei onde eu estava com a cabeça quando eu te contratei.

Eu digo indo até o aparador e sirvo uma dose de uísque. Hande ainda está parada no mesmo lugar, me olhando com a respiração rápida.

-Você pode não ter entendido com essa sua cabecinha que vive na lua, mas eu sou presidente de uma das maiores empresas do país. Eu não posso me dar ao luxo de ficar em casa e deixar as pessoas precisando de mim.

-Eu precisava de você. Sua filha precisava de você. – Ela diz, elevando o tom de voz. -Poderia ser o dono do mundo, mas tem outras prioridades nos próximos anos. E eu tenho pena de você, por não perceber isso e eu e minha cabecinha que vive na lua precisarmos te avisar.

-O que você está fazendo aqui ainda, afinal? Se eu sou tão babaca, insensível... e o que mais você me chamou? Ah, cretino. Por que você não foi embora?

Ela fica calada por um momento.

-Você pode sair agora, Srta Erçel.

Ela me olha por uns 10 segundos, e então se vira, pegando a bebê e saindo da sala.

-Ela é minha filha. - Digo cansado.

-Ah, é? Você quer segurá-la? Ou ao menos chamá-la pelo nome?

Isso me faz parar. Eu realmente não fiz nenhuma das duas coisas.

Hande aproveita o momento e quando vira de costas diz:

-Foi o que pensei.

-☆-


Ligo a televisão e começo a assistir uma série. Apesar de ser uma das minhas preferidas, minha atenção não fica presa o suficiente.

A última coisa que Hande falou ainda está martelando em minha mente. Tudo bem, eu não havia segurado a bebê ainda, muito pequena e frágil... Eu não saberia nem ao menos como pega-la no colo, mas...

Someone to youOnde histórias criam vida. Descubra agora