A cada semana que se passava, Gwyn colecionava uma nova vitória. Passou a conseguir dormir sem dificuldades, o sono era tranquilo e os pesadelos não eram mais tão frequentes. Ainda enfrentava dias difíceis, mas tinha uma família ao seu lado que a respeitava e amava. Por isso, naquele dia, Gwyn tomou uma decisão: sairia da casa e andaria por Velaris. Desde a sua chegada, nunca havia descido até as ruas da cidade. Assistiu aquele céu inúmeras vezes, chorou e sorriu sob a luz da estrelas, mas ainda não havia desfrutado daquela beleza. Pensou em pedir a Nestha para acompanhá-la, mas desistiu assim que viu a amiga sair de fininho atrás de Cassian após o final do treino. Emire alegou no começo do dia que estava particularmente difícil na loja que mantinha próximo ao refúgio dos ventos. Por isso, e só por isso – pelo menos foi o que disse a si mesma – ela se aproximou de Azriel, tentando ser discreta, mas ele logo notou a sua presença.
– Oi. – Ela disse, envergonhada. Ele guardou uma das espadas na área adequada e se virou para ela, com o cenho franzido.
– Oi, Gwyn. – Respondeu.
– Você está guardando as espadas? – Perguntou. Era óbvio que ele estava guardando as espadas, ela podia ver. Azriel parecia confuso, mas assentiu. – Legal...
– Está tudo bem? – Toda a coragem de Gwyn parecia ter sido drenada do seu corpo, e ela estava com as mãos suando.
– Tudo! Claro que sim! Por que não estaria? Tudo ótimo! – Declarou rápido demais. Droga, ela era uma péssima mentirosa. Pôde notar na expressão de Azriel que ele havia identificado cada mentira que saiu da boca dela. – Ótima conversa. Obrigada, Az. Vou indo. – Tentou desconversar, virando de costas para ele.
– Gwyn... – Chamou Azriel. Ela respirou fundo e o encarou. – O que está acontecendo? – Seu tom era preocupado.
– Não é nada... não precisa se preocupar. – Azriel levantou as sobrancelhas em completa incredulidade.
– Achei que fôssemos amigos, Gwyn... – Golpe baixo. Ele sabia que aquilo iria atingi-lá.
– Nós somos! – Ela garantiu.
– Então... – Desafiou Azriel.
– Tudo bem! – Ela se deu por vencida. Sabia que não conseguiria tirar a ideia da cabeça, só estava adiando o inevitável. – Eu queria um favor. – Ele indicou para que ela continuasse. – Eu gostaria de andar por Velaris. – Admitiu por fim. Ele arregalou os olhos, surpreso. – E gostaria da sua companhia. – Ela concluiu com a voz tão baixa que pensou não ser audível. Azriel permaneceu em silêncio por alguns segundos, e Gwyn levantou os olhos para encara-lo.
– Deixe-me ver se entendi. Você quer que eu seja o seu guia turístico por Velaris. – Gwyn sorriu. Ele estava parcialmente certo, mas não era só isso que Gwyn queria dele.
– Sim e não! Sim, quero que você seja meu "guia turístico" – Ela imitou aspas no ar. – Mas principalmente, quero um amigo ao meu lado... – Ela não tirou os olhos de Azriel, mesmo quando sentiu seu rosto ficar quente. Ele sorriu discretamente. – Claro que se você não puder, não tem problema, eu...
– Gwyn, eu estarei com você. – Havia uma intensidade no olhar de Azriel que fez Gwyn sorrir ainda mais. Ela assentiu, sentindo uma estranha satisfação no peito.
– Certo... Preciso iniciar meu turno na biblioteca. Mas...
– Estarei aqui quando estiver pronta. – Ela sorriu e começou a se distanciar, percebendo que restaram apenas eles dois. Ao se aproximar do arco que dava acesso às escadas, se virou para encara-lo. Azriel retribuiu o olhar com um sorriso encorajador.Azriel ficou completamente surpreso com o pedido de Gwyn. De todas as pessoas, entre Nestha, Emire e Cassin, ela havia escolhido ele para acompanhá-la. Era final da tarde quando suas sombras o avisaram da presença de Gwyn. Ele se virou e viu que ela usava os trajes de sacerdotisa com um casaco fino por cima.
– Estou pronta. – Ela declarou antes que ele pudesse perguntar.
– Se você quiser voltar, me avise. Certo? – Ela assentiu. – A escolha é sua, descemos os degraus ou voamos? – Perguntou Azriel.
– Descer os degraus? Eu não sei se você sabe, encantador de sombras, mas essa vitória é completamente da Nestha. Eu nunca conseguiria descer todos esses degraus. – Ela riu.
– Eu discordo de você. Acho que conseguiria. – Respondeu dando de ombros. Gwyn vinha se mostrando tão extraordinária, e teimosa que não havia nada que Azriel duvidasse que ela pudesse fazer. Ela sorriu em agradecimento e olhou fixamente para o céu, parecendo apreensiva.
– Então nossa única opção é voar? No dia da cerimônia de Nestha nós conseguimos atravessar.
– Rhys sabia que você não gostaria de voar, então alterou momentaneamente as defesas das casas para que eu pudesse atravessar com vocês. – Esclareceu. Ela parecia entender. – Prometo não ir rápido demais. Não será um vôo longo. – Garantiu Azriel.
– Confio em você, encantador de sombras. Vamos lá. – Ele sorriu, em uma tentativa de encoraja-la. Mas na verdade, estava encorajando a si mesmo. Nunca havia tocado Gwyn dessa forma e não sabia como ela poderia reagir ao ter o seu corpo junto ao dele. Azriel olhou rapidamente para as suas mãos cheia de cicatrizes, e sentiu o peito apertar.
– Posso? – Perguntou. Ela assentiu. Muito devagar ele colocou a mão na cintura de Gwyn e passou o outro braço por baixo de seus joelhos. Esperou que Gwyn ficasse rígida ao sentir o seu toque, mas ela pareceu relaxar. Seus olhos se encontraram enquanto ela estava em seus braços e Azriel pode sentir uma de suas sombras passarem pelo cabelo de Gwyn. Ele decolou, tentando ser delicado. Sentiu Gwyn enterrar o rosto momentaneamente em seu peito e a sua respiração falhou. Ela levantou o rosto e poucos segundos depois eles pousaram em uma das ruas de Velaris.O mínimo toque das mãos de Azriel no corpo de Gwyn, foi capaz de aniquilar todas as dúvidas da sua mente. Como ele havia prometido, o vôo foi rápido, mas Gwyn esteve ciente da respiração e do toque de Azriel a cada segundo. Ele a colocou no chão devagar, e pela primeira vez na vida ela quis ser tocada novamente. O pensamento causou um espanto em si mesma, e ela tentou expulsa-lo ao olhar em volta. Era tudo tão belo e vibrante que todo o seu corpo reagiu a beleza da cidade. Ou pelo menos, foi o que ela tentou dizer a si mesma. Sua reação corporal foi inteiramente causada pela cidade, tinha que ser.
– Uau. – Ela declarou, sem saber para onde olhar primeiro. Azriel estava bem ao seu lado, e ela sentiu que ele observava cada movimento seu.
– Você está bem? – Perguntou. Ela assentiu, ainda absorvendo.
– Só estou... sem palavras. Eu olhei por tanto tempo pelas janelas da Casa. Nunca pensei que conseguiria estar aqui. – Sentiu uma lágrima escorrer pelo seu rosto. – É tão belo. – Uma das sombras de Azriel a tocou, em uma tentativa de limpar a lágrima que havia escorrido.
– Me desculpe. – Azriel se apressou em dizer, e imediatamente a sombra retornou até ele.
– Tudo bem! – Ela sorriu, e colocou a mão no próprio rosto, onde a sombra a tocou.
– Vamos? – Ele sinalizou o caminho, e ela o seguiu.
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Corte de Segredos E Beleza
FanfictionGwyn e Azriel são duas almas feridas e incapazes de enxergar o valor de suas vidas. A partir de uma jornada de cura e amizade, eles irão encontrar um no outro o necessário para vencer os traumas do passado. Gwyn enfrenta os seus traumas pessoais e...