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- Bea? – a voz da Angela surpreendeu-me ao entrar na varanda. A suavidade com que ela fala e o tom acolhedor que a sua voz tem, deixa-me sempre com o coração muito melhor só por a ouvir – estavas a dormir? – ela deu a volta ao sofá, sentando-se ao meu lado.

- Não – ajeitei-me no sofá, mantendo as costas direitas. É incrível como em duas semanas as costas, finalmente, voltaram ao normal. Só não me consigo mexer com a mesma velocidade com que o fazia, mas não me doer é uma enorme vantagem – perdeste o Lewis pelo caminho? – eles tinham saído para a corrida matinal há umas duas horas e é incrível como é que eles têm a motivação para o fazer, mesmo que hoje esteja a chover imenso.

- Ele foi já tomar um duche – virou ligeiramente o seu corpo para mim – eu falei com ele durante a corrida sobre o que nós falámos ontem – pela cara dela, dá para perceber que deve ter sido uma conversa interessante – ele prefere que tu estejas acompanhada estas semanas..., ele não quer mesmo que eu vá com ele.

- Claro que não quer – ontem tinha tido uma conversa muito honesta com a Angela. Prefiro, mesmo, que ele esteja acompanhado por ela nas últimas corridas do campeonato, do que ela aqui ficar a cuidar de mim – vou ter de ser eu a convence-lo, então.

- Se fores tu a falar com ele, talvez consigas.

- Obrigada, Angela – permanecemos as duas em silêncio e, quando percebi, estávamos as duas a ver a enorme chuva que caía. Ainda bem que a varanda nos permite estar cá fora, porque, apesar de estar a chover, não está frio nenhum e é bom poder aproveitar um pouco de ar puro – hoje vou despedir-me dos meus alunos – ela olhou-me – é sempre uma altura tão complicada de gerir – raramente me abro desta forma a falar sobre a minha profissão, mas hoje sinto que estou a precisar.

- Estiveste quanto tempo com eles? – e claro que ela é uma das melhores pessoas para o fazer.

- Quatro anos.

- Eles eram bem pequenos quando começaram a estar contigo – respirei fundo, sabendo que não estou preparada para o momento do adeus – e, acredita, que és das peças mais importantes na formação da personalidade deles. As crianças seguem o exemplo e, por norma, é sempre o dos adultos. Eles vão ser melhores pessoas por te terem tido como educadora e não preciso de provas, porque basta seres a pessoa que és – às vezes consigo acreditar que estou a fazer algo certo na vida. Por estas surpresas, pela forma como as pessoas me veem e como eu raramente me vejo.

- Obrigada – estiquei-me na direção dela, percebendo que a surpreendi com o meu abraço.

- O que é que se está aqui a passar? – começámos a rir-nos assim que ouvimos a voz do Lewis, acabando por me afastar dela.

- Já cá faltava o ciumento – comentei, olhando para a porta que dava acesso à varanda e onde ele estava encostado.

- Eu vou até ao meu apartamento – a Angela levantou-se, indo na direção do Lewis para sair de casa – não te esqueças que temos treino da parte da tarde.

O Lewis deu-lhe passagem para ela sair, vindo na minha direção e ocupando o lugar da Angela.

- Estás a precisar de abraços hoje?

- Queria estar em Londres para me despedir deles... - e o Lewis ofereceu-se para me levar num jato privado e estar comigo nesse momento, mas não nos podíamos dar ao luxo de rebentar esta bolha tão protegida onde estamos a viver.

- Tenho a certeza que eles também iam gostar disso – encostou-se, também, no sofá, com a sua cabeça inclinada para trás sobre a almofada de encosto – mas, assim que acabes o teu tempo de invalidez – acabei por me rir pela forma como ele se refere à minha baixa médica – podes ir ter com eles e fazer toda uma outra despedida.

Always, BeOnde histórias criam vida. Descubra agora