Visão No. 29

21 1 0
                                    

Estou do lado errado...
Minha margem é onde não chegou o progresso.
O lado em que a novidade 
Se detem nos juncais… 
Há tanto de velho e muito de águas escuras e estanques nas ourelas tristes de cá… 
Que a outra margem parece o futuro.

Daqui vejo arranha céus imensos,
Torres de espelho refletindo espelhos, 
Gritos no pregão da bolsa:
Compra! 
Venda! 

A multidão de massa orgânica enrolada em tessituras sintéticas,
escorrendo pelas ruas como rios de larvas e vermes… 
Compra! 
Venda!
Tudo tem seu preço, 
Todos tem seu preço! 

Mas aqui,
Na margem em que estou,
Não tenho nenhum valor…
Desde que não compro ou vendo, 
Não mercadejo,
Não obtenho nenhum sustento…

Minha inanição,  
E minha profunda cede 
Corroem tanto a carne como a alma… 
Porque são a falta em mim
Que vem de ser obrigado 
A contemplar aquel'outra margem todos os dias…
Enquanto o mundo acaba aqui,
E não num futuro intangivelmente presentificado para lograr-me,
Mas que me não pertence…

Sei ao certo
Que é nesse represamento inútil da vida,
Expropriado dos sentidos,
Mesmo dos mais improváveis, 
Que há de cessar meu existir!
 

VISÕES AO CREPÚSCULOOnde histórias criam vida. Descubra agora